Folha de S. Paulo
Teto de endidividamento federal seria de 80%
do PIB e pode ser votado na semana que vem
Limite impediria BC de fazer política de
juros e exigiria cortes inviáveis na despesa
O Senado está
para votar um projeto que, aprovado, pode dar cabo da política monetária
do Banco Central,
da capacidade do BC de regular a taxa básica de juros,
a Selic.
De um dia para o outro. A resolução pode também criar crises tais como vemos
nos Estados Unidos quando a dívida do governo federal daquele país atinge um
certo limite, mas ainda piores.
Pois é o que propôs o senador Renan Calheiros (MDB-AL) em projeto de resolução do Senado, emendado pelo relator Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). "Projeto de resolução" trata de "matéria da competência privativa do Senado", como determina a Constituição para limites de endividamento. Aprovou, acabou.
Na presente versão do texto, a dívida bruta
do governo central não poderia ultrapassar o equivalente a 80% do PIB. Trata-se
aqui da dívida geral dos governos descontadas as dívidas de estados e
municípios: perto de 74% do PIB.
Ou, então, a dívida não poderia ultrapassar
6,5 vezes a receita corrente líquida do governo federal. Dada uma receita
líquida de 12%, a dívida não poderia ultrapassar o equivalente ora a 78% do
PIB.
Se ultrapassado o limite da dívida, o
ministro da Fazenda teria de prestar contas. Muito além disso, o governo
federal estaria sujeito às restrições dos artigos 31 e 9 da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF).
Diz o artigo 31 da LRF que, se a dívida
passar do limite, o governo deve levá-la de volta ao determinado pela lei em
três quadrimestres, com um corte inicial necessário de 25% no primeiro
quadrimestre depois do estouro. Para resumir uma história enrolada, para que isso
fosse possível seria necessário fazer cortes homéricos de despesas, tanto as
primárias como aquelas com juros.
No entanto, o artigo 9 da LRF diz que
"não serão objeto de limitação as despesas que constituam obrigações
constitucionais e legais do ente, inclusive aquelas destinadas ao pagamento do
serviço da dívida, e as ressalvadas pela lei de diretrizes orçamentárias".
Não é possível, é como tirar a meia sem tirar
o sapato, não há meios legais de cortar despesas obrigatórias, o grosso da
despesa. Congresso e governo nem ao menos diminuem o ritmo de crescimento de
despesas que estouram qualquer tentativa de teto de gastos (não de dívida),
como o teto de Michel Temer ou o de Luiz Inácio Lula da
Silva, o "arcabouço fiscal".
Fica pior. Estourado o teto da dívida, o
governo "...estará proibido de realizar operação de crédito interna ou
externa, inclusive por antecipação de receita, ressalvado o refinanciamento do
principal atualizado da dívida mobiliária [isto é, pagar dívida com dívida
nova, "rolar"]".
A fim de manter a taxa Selic na meta definida
nas reuniões do Copom,
o BC precisa tirar ou colocar fundos no mercado de dinheiros entre bancos. Para
tanto, grosso modo compra e vende títulos públicos (faz dívida). Atingido o
teto da dívida, dá-se cabo dos meios convencionais de fazer política monetária.
Falando francamente, caso seja aprovada essa resolução, as finanças do país
iriam logo para o vinagre.
Fernando Haddad disse, de modo gentil, que
não dá pé. "A regra que está sendo proposta... penso que não vai trazer os
melhores resultados. Isso pode ser objeto de um seminário com economistas.
Sugeri a ele [Calheiros] que fizéssemos um seminário com economistas de várias
escolas para dizer a opinião a respeito disso".
De tão disparatada, parece coisa que não vai
para a frente. Convém não bobear, porém.
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