domingo, 28 de dezembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Partidos são porta para infiltração do crime na política

Por O Globo

Caso TH Joias expôs contaminação profunda das instituições. Legendas têm papel vital para combatê-la

Ao comparecer à CPI do Crime Organizado, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, relatou ter apelado aos presidentes de partidos para fazer uma “triagem” que evite, nas eleições do ano que vem, candidaturas ligadas a organizações criminosas. É sem dúvida uma iniciativa correta, mas é triste que o Brasil tenha chegado a ponto de isso ser necessário. O avanço alarmante da criminalidade já há algum tempo dá sinais de infiltração na economia formal e nas instituições da República. A porta de entrada na vida pública são os partidos, e é por meio deles que a contaminação avança pela política. Detê-la é urgente.

Não existe exemplo mais eloquente disso do que a chegada à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) de Thiego Raimundo dos Santos Silva, conhecido como TH Jóias. Eleito como suplente, ocupou uma cadeira na Casa até ser preso sob a acusação de vínculo com o Comando Vermelho (CV). Já seria um escândalo a simples existência de um deputado estadual suspeito de tráfico de armas, drogas e de atuar em favor de uma facção criminosa. Mas a história não ficou apenas nisso.

A investigação revelou indícios de que o próprio presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar, avisara TH sobre a iminência da operação, de modo que ele pudesse se livrar de evidências comprometedoras e fugir. Uma câmera de rua gravou cenas de um pequeno caminhão estacionando e sendo carregado à noite em frente à casa de TH Jóias. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou também a prisão de Bacellar, mas o plenário da Alerj — a cujo crivo a decisão foi submetida — o libertou. Moraes manteve Bacellar fora da Presidência e sob o monitoramento de tornozeleira eletrônica, e ele se licenciou do mandato. Mas, novamente, a história não ficou apenas nisso.

Os investigadores descobriram evidências sugerindo que o desembargador federal Macário Ramos Júdice Neto, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), estava com Bacellar quando ele avisou TH sobre a operação policial que o prenderia. Macário era o relator do caso no TRF-2 e havia assinado o mandado de prisão. Ele já ficara afastado da magistratura por 18 anos, sob a acusação de venda de sentenças. Moraes mandou prendê-lo, e ele foi afastado do cargo. Quem pode garantir que a história ficará nisso?

Por isso é premente a tarefa dos partidos de filtrar seus candidatos, levando em conta prontuário policial e histórico penal dos postulantes. Desde 2010, a Lei da Ficha Limpa barra a candidatura de condenados em segunda instância em processos penais ou mesmo administrativos. Mas o Congresso afrouxou as regras de inelegibilidade e, apesar de vetos pontuais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve a essência das mudanças. Em 2024, nas eleições para prefeito e vereador, a Ficha Limpa barrou 1.968 candidaturas. Infelizmente, ela deixará de ter a mesma eficácia daqui para frente, abrindo brechas de que criminosos tentarão se aproveitar.

O crescimento em tamanho e sofisticação do crime organizado tem superado a capacidade da legislação de conter sua infiltração nas instituições — a começar pelo próprio aparelho de segurança pública. É imperioso que se ampliem as barreiras. Os partidos políticos têm papel vital nessa missão.

Adoção do impedimento automático promete melhorar qualidade do futebol

Por O Globo

Toda tecnologia é bem-vinda, mas nenhuma resolve os problemas crônicos que afligem a arbitragem

Foi oportuna a decisão da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) de usar na Série A do Campeonato Brasileiro e na Copa do Brasil, a partir de 2026, a tecnologia conhecida como impedimento semiautomático (ou Saot, na sigla em inglês). Ela promete trazer mais precisão, rapidez e transparência aos lances em que há dúvida se o jogador está adiantado. Por meio da combinação de imagens de câmeras, geometria e leis da física, o sistema é capaz de detectar automaticamente o ponto no corpo do atleta mais próximo da linha de fundo.

Hoje, os longos minutos de espera — e suspense — enquanto as linhas são traçadas costumam causar indignação. Na dúvida, jogadores seguram a comemoração, e locutores esportivos ficam sem saber se gritam ou esperam o fim da checagem. A narração do gol minutos depois de a bola entrar corta o clima.

Apresentado mundialmente na Copa de 2022, no Catar, o impedimento semiautomático já é adotado em competições da Premier League (Inglaterra) e La Liga (Espanha), entre outras. A implantação do novo sistema exigirá adaptações nos estádios que recebem partidas da Série A. Cada local deverá ser equipado com 24 câmeras com cobertura total do campo. O contrato fechado pela CBF com uma empresa britânica prevê também sistema de rastreamento de jogadores, árbitro e bola.

A tecnologia é sempre bem-vinda para auxiliar o esporte e dirimir dúvidas. Usado de forma rotineira no Brasileirão desde 2019, o VAR representou um avanço, apesar de não ter posto fim à polêmica. A despeito das reclamações — relacionadas mais ao uso que à tecnologia em si —, é difícil imaginar o futebol sem o árbitro de vídeo. Ou alguém tem dúvida de que o histórico gol de mão marcado por Diego Maradona na Copa do Mundo de 1986 hoje seria anulado?

Mas tecnologia, por melhor que seja, não apita jogo. E aí entra um problema que nem VAR nem Saot podem resolver: a arbitragem nos campeonatos nacionais tem se mostrado sofrível. É certo que a CBF realiza cursos de aperfeiçoamento para os árbitros, mas claramente eles não têm resolvido. Punições e afastamentos também não. O que se viu em 2025 foi preocupante. Não se salvaram nem árbitros do quadro da Fifa, considerados os mais bem preparados. Torcedores de todos os times têm pelo menos um lance grotesco para relatar.

Para além dos avanços tecnológicos, a CBF precisa melhorar a qualidade da arbitragem, de modo a evitar o festival de erros grosseiros nos gramados. Em campeonatos cada vez mais equilibrados, uma falha da arbitragem pode selar o destino de um clube e consagrar vitórias ou rebaixamentos injustos.

PIB interrompe neste 2025 série de surpresas positivas

Por Folha de S. Paulo

Economia desacelerou como previsto, com impacto de juros altos decorrentes da inflação e do gasto público

O quadro mais amplo é de endividamento público crescente, níveis baixos de investimento e juros proibitivos para famílias e empresas

A economia brasileira deve crescer pouco acima dos 2% neste 2025, segundo a mediana das estimativas de mercado pesquisadas semanalmente pelo Banco Central. Para o Ministério da Fazenda, o avanço do Produto Interno Bruto será de 2,2%; para o próprio BC, de 2,3%.

Desse modo, as cifras ficam próximas entre si e também das expectativas de analistas coletadas no início do ano, de 2,01%. Interrompe-se, portanto, a série de surpresas positivas com PIB observada de 2022 a 2024, depois de superado o pior da pandemia.

Erros nas previsões para a atividade não são incomuns. Costumam ocorrer imprevistos relevantes, econômicos, políticos ou de outra natureza, como eventos climáticos. Os modelos de projeção são imperfeitos. Ainda que não fossem precários, as relações entre variáveis no passado não dão conta de inovações e mudanças estruturais.

Mais importante é se valer das estimativas para entender influências nelas desconsideradas.

Como tem observado Bráulio Borges, colunista desta Folha, o aumento do gasto público vinha sendo subestimado, não apenas o do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como os de estados e municípios. A alta da despesa animou de início uma economia deprimida desde 2015, com grande ociosidade de trabalho e capital.

Os efeitos colaterais do expansionismo orçamentário ficaram visíveis em 2024, com sinais de superaquecimento e inflação. O descrédito da política fiscal, crescente ao longo do ano passado e evidenciado também na taxa de câmbio, contribuiu para a alta dos preços e dos juros.

Há indícios de que mudanças no mundo do trabalho evitaram inflação ainda maior, mesmo com taxas de desemprego baixas. A reforma da CLT de 2017 flexibilizou contratos e diminuiu custos de contratação; houve mudanças tecnológicas, a influenciar a oferta de mão de obra.

Já o avanço do mercado de capitais e da concorrência bancária facilitaram o crédito, o que parece ter contido o efeito das taxas de juros elevadíssimas, fazendo com que atividade econômica arrefecesse mais lentamente.

O fator exógeno mais importante do ano foi a desvalorização mundial do dólar, resultante das trapalhadas de Donald Trump, que contribuiu para conter a inflação doméstica. O sucesso da agropecuária, a moderação dos preços mundiais dos alimentos e do petróleo, além de exportações chinesas de bens industriais baratos, foram outros atenuantes da carestia.

O gasto público total, embora nas alturas, cresceu menos. Como resultado, o pouso da economia é suave. No curto prazo, há convergência lenta do IPCA para a meta, sem choque no PIB.

O quadro mais amplo, porém, é de endividamento público crescente e níveis baixos de investimento, despesa governamental alta e ineficiente combinada a juros proibitivos para famílias e empresas. Por óbvio, não é receita de crescimento duradouro.

Mais um verão de praias sujas

Por Folha de S. Paulo

Número de balneários que são próprios para banho é o menor desde 2016, o que afeta saúde pública e turismo

De 820 praias, só 253 foram consideradas boas; é preciso avançar em parcerias público-privadas para melhorar sistema esgoto e drenagem

Verão e festas de fim de ano são sinônimos de praia no Brasil. Infelizmente, a qualidade das águas nos cerca de 7.400 km de sua faixa litorânea continua baixa, colocando em risco a saúde da população e prejudicando o turismo.

Segundo levantamento realizado pela Folha, das 820 praias avaliadas em 2025, só 253 (30,2%) foram consideradas próprias para banho —o menor número da série história iniciada em 2016, desconsiderando 2020, devido à pandemia. As em situação regular somaram 288, enquanto 143 estavam ruins, e 136, péssimas.

O cenário deste ano não foi tão diferente do verificado em 2024 (255, 295, 136 e 134, respectivamente), mas foi pior do que o de 2016, quando 370 praias eram boas, ante 84 ruins e 119 péssimas.

As praias são classificadas a partir da medição da densidade de bactérias fecais durante cinco semanas seguidas, critério estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

O problema tem relação com o precário sistema de saneamento e pode ser agravado com aumento do volume de chuvas em curtos períodos de tempo —evento meteorológico que tem se tornado mais comum devido a mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global.

Além do esgoto despejado em rios e no próprio mar, cidades brasileiras carecem de estruturas de drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (DMAPU).

Como as superfícies dos centros urbanos são em grande parte impermeáveis, o escoamento da água da chuva arrasta tudo o que houver pelo caminho, como fezes de animais e lixo, e pode se infiltrar na rede de esgoto, criando sobrecarga que extravasa para rios, canais e até as praias.

O que a DMAPU faz é coletar a água (em bueiros, por exemplo), transportá-la de modo controlado por meio de galerias e canais, reduzir velocidade da vazão com reservatórios e áreas de retenção e melhorar a qualidade antes de ela chegar a rios e ao mar.

Diagnóstico do Ministério das Cidades divulgado em 2023 mostrou que 19,2% de 4.833 municípios não tinham nenhum tipo de sistema de drenagem.

É preciso aumentar a permeabilidade do solo nas grandes cidades com expansão de áreas veres e conter a ocupação desordenada de zonas litorâneas. Principalmente, deve-se avançar em parcerias público-privadas, facilitadas pelo marco legal do saneamento, para melhorar a infraestrutura tanto de coleta e tratamento de esgoto quanto de DMAPU.

Sem isso, a beleza do litoral brasileira continuará contrastando com a sujeira de suas águas.

Mais centro, menos Centrão

Por O Estado de S. Paulo

Democracias maduras dependem de um centro político responsável, capaz de assegurar previsibilidade e estabilidade, não de um conglomerado fisiológico que troca projeto por sobrevivência

Eis uma agenda imprescindível para o Brasil: recuperar a força perdida de um centro político democrático, moderado e estável. Esteio do eleitor que tradicionalmente privilegia a moderação e o equilíbrio pragmático de ideias, valores e expectativas, coube ao centro servir de fiador da governabilidade, moderador de impulsos autoritários e barreira contra aventuras populistas periódicas que contaminam nossa tradição política.

Foi com o centro democrático que se preservou a convicção de que o Brasil precisava – e precisa – de previsibilidade, responsabilidade fiscal e respeito às regras, virtudes decisivas para navegar crises econômicas e transições políticas sensíveis. Essa tendência é corroborada por diversas pesquisas internacionais, que identificam no eleitorado de centro a aversão a riscos institucionais e uma maior sensibilidade à responsabilidade na formulação de políticas públicas. Os partidos centristas atuam como amortecedores contra polarizações destrutivas.

No caso brasileiro, durante a Nova República, especialmente depois da Constituição de 1988, siglas posicionadas no centro desempenharam papel decisivo na construção da governabilidade. O PMDB (e depois o MDB) foi o principal arquiteto das coalizões presidenciais, estabilizando governos de diferentes matizes ideológicas – de José Sarney a Fernando Henrique Cardoso, de Luiz Inácio Lula da Silva a Michel Temer – e servindo como salvaguarda institucional nos momentos mais críticos.

O centro tradicional, no entanto, foi aos poucos cedendo espaço a algo muito distinto no Brasil: o chamado Centrão, um agrupamento cuja unidade não está em projetos nacionais, mas na habilidade de extrair vantagens imediatas do governo de ocasião. Como este jornal já sublinhou nesta página, o Centrão não é bom nem ruim; apenas é o que o presidente, o governo ou as principais forças políticas de ocasião querem que seja.

Tradicionalmente, o termo carrega uma conotação pejorativa, indicando o grupo de congressistas ideologicamente invertebrados, em especial os deputados do “baixo clero”, que se organizam para se aproximar do governo de turno e angariar vantagens, verbas e cargos para seus redutos paroquiais. Em outras palavras, a encarnação do clientelismo, do corporativismo e do patrimonialismo. Por outro lado, por necessidade ou conveniência, foi o Centrão o fiador das principais reformas e políticas públicas da Nova República, seja em políticas sociais (como o Bolsa Família), sanitárias (SUS), ambientais (Código Florestal) ou educacionais (novo Fundeb).

O problema hoje é outro: o que antes era o ponto de equilíbrio virou um sistema de intermediação de interesses particularistas, blindado contra responsabilidades e avesso a compromissos de longo prazo. Quando a política vira balcão, decisões passam a obedecer a lógicas patrimonialistas. Quando coincide com o interesse público, é por acaso, não por projeto.

Falta ao Brasil uma força moderadora, capaz de combinar responsabilidade fiscal e sensibilidade social, de reconhecer as limitações do presidencialismo de coalizão sem transformá-lo em captura orçamentária, e de conter extremismos sem se submeter à lógica oligárquica. Falta ao País reconstruir esse espaço, como faltam lideranças que compreendam que governabilidade não é submissão, que negociar é democrático e que transformar negociação num fim em si mesmo é sua distorção. Isso exige, ainda, um Executivo capaz de pautar prioridades nacionais – um atributo igualmente faltante neste terceiro mandato de Lula – e um Congresso disposto a resgatar sua função republicana.

“Mais centro, menos Centrão” não é um capricho retórico, e sim uma necessidade estrutural para que a democracia brasileira volte a produzir estabilidade, projeto e horizonte. Sem um centro programático robusto, prosperam os extremos, o desequilíbrio institucional e a deterioração da política. O Brasil precisa, novamente, de um centro que seja centro – não de um Centrão que ocupe tudo.

O atraso do Brasil em matemática

Por O Estado de S. Paulo

Com avanços limitados e pouco tempo até o fim do mandato, o governo Lula não consegue enfrentar deficiência da aprendizagem em matemática, o que compromete o desenvolvimento do País

Quando, há três anos, o ex-governador e senador Camilo Santana (PT-CE) foi nomeado ministro da Educação, vindo de sua bem-sucedida experiência na gestão educacional cearense, abriu-se uma janela de esperança para que o Brasil, enfim, corrigisse um erro histórico: a negligência com o ensino básico. Afinal, o Ceará é referência nacional na alfabetização de crianças e na melhoria dos índices de aprendizagem. Agora, no último ano do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o MEC de Camilo e o governo petista podem ao menos se orgulhar de ter devolvido à pasta algum protagonismo técnico e institucional, como uma das poucas ilhas de qualidade em meio à mediocridade em geral da atual gestão. Sobretudo quando se compara aos anos de sombras vividos pelo ministério sob Jair Bolsonaro.

No entanto, boas intenções, diagnósticos corretos e retórica moderada não produzem milagres na educação. Menos ainda no último ano de governo, razão pela qual já se pode admitir que, apesar de iniciativas relevantes sob o comando de Camilo Santana, Lula encerrará seu terceiro mandato sem resolver uma equação fundamental para o desenvolvimento do País: a deficiência crônica nos níveis de aprendizagem de matemática.

O cenário era de terra arrasada em dezembro de 2022, fim do governo Bolsonaro, quando este jornal, com base nos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2021, alertava para a urgência de repensar o ensino de matemática no Brasil (ver o editorial O País reprovado em matemática, 19/12/2022). Levou quase três anos para que o atual governo lançasse o Compromisso Nacional Toda Matemática, iniciativa anunciada em outubro passado. Os números continuam alarmantes: só 5% dos concluintes do ensino médio nas escolas públicas atingem níveis adequados de aprendizagem. Levantamento do próprio MEC junto de 60 mil profissionais de educação revelou que a insegurança docente para ensinar matemática é um dos principais gargalos, agravado pela falta de formação adequada, escassez de materiais didáticos, sobrecarga de trabalho e lacunas acumuladas desde a educação infantil.

A boa novidade do programa é que, pela primeira vez, a matemática terá metas específicas de aprendizagem, que podem ser incorporadas ao novo Plano Nacional de Educação (PNE). A má notícia é que o atraso é grande e os resultados, inevitavelmente, levarão tempo. Há limites evidentes para o que pode ser alcançado até o fim de 2026. Parte das medidas – como a aprovação e implementação do novo PNE – depende do Congresso e tende a se arrastar em meio ao calendário eleitoral. Na educação, bons resultados exigem políticas consistentes, execução rigorosa, financiamento estável e continuidade, algo que historicamente tem faltado ao País.

Enquanto políticas estruturais ganham forma, a lacuna de aprendizagem persiste, penalizando milhões de estudantes que chegam ao ensino médio sem bases sólidas em matemática e língua portuguesa – condições mínimas para qualquer projeto de desenvolvimento. Não há como falar em desenvolvimento sustentável enquanto jovens deixam a escola sem saber calcular uma porcentagem ou interpretar um problema simples.

O atraso brasileiro em matemática não é mero recurso retórico: traduz-se em impactos diretos na economia e na soberania nacional. Países com desempenho robusto em matemática formam mais profissionais aptos a atuar em ciência, tecnologia e engenharia, áreas centrais da inovação. Os resultados do Pisa, em que o Brasil figura entre os piores colocados, evidenciam o descompasso entre nossa educação básica e as competências exigidas no século 21. Sem fluência em raciocínio lógico desde cedo, torna-se improvável avançar em leitura crítica e compreensão textual, gerando baixa produtividade, menor capacidade de inovação e perpetuação de desigualdades.

Antes tarde do que nunca, reza o clichê. Mas, entre atrasos e ambições modestas, o País segue ficando para trás. Que, ao menos, as diretrizes agora anunciadas se convertam em compromissos públicos estáveis, monitorados e com responsabilização clara por resultados. Só assim haverá chance de reduzir um atraso que hoje mais se assemelha a um “custo Brasil” educacional do que a um sistema capaz de preparar seus jovens para o futuro.

Médicos sem especialidade

Por O Estado de S. Paulo

A proporção de generalistas salta de 25% para 40%, o que alerta para a formação médica

A proporção de médicos sem uma especialidade no Estado de São Paulo passou de 25%, em 2000, para nada menos do que 40% neste ano. Os dados são da Demografia Médica do Estado de São Paulo, elaborada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em parceria com a Associação Paulista de Medicina (APM) e a Secretaria de Estado da Saúde. São quase 80 mil profissionais, na maior unidade da Federação em população, sem formação em áreas como cardiologia, ginecologia, oftalmologia, ortopedia ou pediatria.

A oferta de vagas em residência médica, que não se confunde com uma especialização lato sensu, não acompanhou o ritmo de crescimento do número de graduados em Medicina. Em 2015, eram 47 faculdades no Estado , com 4.832 vagas autorizadas , e hoje são 87, com 10.455. Enquanto isso, o número de estudantes em residência passou de 12.791 em 2018 – data mais remota disponível no levantamento – para 15.524 em 2025. Metade deles é de fora de São Paulo. São ao todo 197 mil médicos no Estado, um crescimento de 67% em dez anos.

É bastante, mas não o suficiente. Não à toa, o presidente da APM, Antonio José Gonçalves, manifestou preocupação com “a abertura indiscriminada de cursos de Medicina e o crescimento acelerado do número de médicos generalistas”, enquanto não há vagas em residências para todos os formandos. Essa distorção na formação contínua, por óbvio, elevou a presença dos generalistas no atendimento à população, tanto na rede pública quanto na privada, o que, a priori, não é negativo. Se egresso de uma graduação de qualidade, esse profissional poderá prestar um bom serviço na área clínica.

Mas, como bem apontou o professor da FMUSP e coordenador do estudo, Mário Scheffer, há lacunas que só podem ser supridas por um especialista. Por isso, segundo ele, o Estado precisa de mais anestesiologistas, psiquiatras e intensivistas. Mas não só: para Scheffer, seria muito melhor ter sempre à frente da atenção primária um médico da família e comunidade, um pediatra ou um ginecologista. Se essa situação é preocupante no Estado de São Paulo, que concentra as melhores instituições de ensino e de saúde do País, imagine no restante do Brasil.

Nos últimos anos, o governo federal tentou impor uma série de regras para a abertura de cursos de Medicina dentro dos editais do Mais Médicos, a fim de garantir o mínimo de qualidade, de modo a ajustar demandas sociais e de mercado. Houve uma explosão de ações judiciais de instituições pleiteando e conseguindo a abertura de vagas de graduação, sem atender a nenhum dos requisitos dos editais, como o abstrato Plano de Implantação de Residência Médica.

Esse fenômeno, portanto, tem causas bastante conhecidas pela classe médica, pelas autoridades sanitárias e pelos gestores federais das áreas de educação e saúde. Talvez tenha chegado a hora de o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Saúde elaborarem políticas públicas mais efetivas tanto em relação à abertura de vagas nas faculdades de Medicina quanto às vagas de residência médica. Até agora, esse trabalho de regulação falhou.

Regra de conduta fortalece o STF

Por Correio Braziliense

Esclarecer os limites éticos para os ministros é uma maneira de preservá-los. Aumentará a credibilidade da instituição que, a qualquer tempo, é essencial para o fortalecimento da democracia

Quando historiadores se debruçarem sobre o primeiro quarto de século 21 no Brasil, perceberão com clareza o papel fundamental exercido pelo Judiciário na defesa da democracia. Em um momento conturbado do país, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atuaram de modo firme contra as investidas de um grupo político, liderado pelo então presidente da República Jair Bolsonaro, disposto a ir às últimas consequências para colocar em xeque o processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito.

Nos meses seguintes — e particularmente após o fatídico 8 de Janeiro —, o STF aplicou penas rigorosas para os envolvidos na trama golpista, a partir da investigação da Polícia Federal e da acusação oferecida pela Procuradoria Geral da República (PGR). A diligência do Judiciário está presente até os dias de hoje, passados três anos daquele período conspirador na República. Ontem mesmo, o ministro do STF Alexandre de Moraes endureceu as medidas restritivas aos condenados golpistas, após uma tentativa de fuga frustrada do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal  (PRF) Silvinei Vasques.

Não resta dúvida, pois, que o Supremo Tribunal Federal prestou inestimável serviço à nação ao conter a sanha antidemocrática, além de seguir o estrito cumprimento da Constituição Federal. Esse reconhecimento institucional foi reiterado na última sexta-feira pela Organização dos Estados Americanos (OEA). O relatório sobre liberdade de expressão destaca o "papel fundamental" da Corte na contenção dos delitos antidemocráticos. Apesar de ressaltar o valor do STF na salvaguarda da democracia, o documento da OEA propõe uma revisão sobre as condições de liberdade de expressão no Brasil, a fim de evitar uma "concentração de poder" por parte do STF e a perpetuação de medidas que deveriam ser excepcionais.

Esse mesmo espírito de aprimoramento institucional motiva o presidente da Suprema Corte brasileira, ministro Edson Fachin, a elaborar um código de conduta para os integrantes do tribunal. A proposta recebeu amplo apoio de presidentes de tribunais Brasil afora, além da aprovação de juristas consagrados, como o ex-decano do STF e ministro aposentado Celso de Mello. "Trata-se de medida de Estado, moralmente necessária e institucionalmente urgente. Em democracias consolidadas, a confiança na Justiça exige não só juízes honestos, mas regras claras, que impeçam qualquer aparência de favorecimento, dependência ou proximidade indevida com interesses privados e governamentais", escreveu em artigo recente publicado na imprensa.

Precisamente por causa da responsabilidade de zelar pelos princípios constitucionais de publicidade, impessoalidade e moralidade, o Supremo Tribunal Federal precisa avançar na definição de normas que esclareçam os limites da conduta de seus integrantes. Ao dar esse passo, a instância máxima da Justiça conferirá mais legitimidade aos seus magistrados. Esclarecer os limites éticos para os ministros é uma maneira de preservá-los. Aumentará a credibilidade da instituição que, a qualquer tempo, é essencial para o fortalecimento da democracia.

O código de conduta do STF vem para reforçar recomendações já estabelecidas para integrantes do Judiciário — como o Código de Ética da Magistratura Nacional, instituído em 2008 pelo então presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Gilmar Mendes. Transparência é a essência da democracia. Sem ela, não há República.

O teste da Transnordestina

Por O Povo (CE)

Após um comboio carregado de milho ter percorrido 585 quilômetros entre Bela Vista (PI) e Iguatu (CE), iniciando a fase de testes operacionais, a Transnordestina teve R$ 700 milhões liberados para dar continuidade às obras da ferrovia. Outros R$ 5,6 bilhões em recursos também são oriundos do fundo para desenvolvimento da região (FDNE), gerido pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

A Transnordestina Logística (TLSA), concessionária responsável pela construção e operação da ferrovia, informou ao jornal que o início efetivo da operação será programado em conjunto com os governos federal e dos estados do Ceará e do Piauí.

Como registrou a reportagem, na edição desta terça-feira, a Transnordestina está com 100% de sua execução contratada, incluindo ordens de serviço assinadas para os lotes 9 de Baturité a Aracoiaba (46 km) e de Aracoiaba a Caucaia (51 km). Esses trechos no Ceará são considerados de maior complexidade e fundamentais para a conclusão da fase 1 do projeto.

A fase 1 refere-se à ligação da cidade de Eliseu Martins (PI) ao Porto do Pecém (CE), com extensão aproximada de 1.200 km. Concluir esse traçado é fundamental por ser considerado o de maior retorno, tanto em termos de logística, quanto ao aspecto econômico.

De fato, já é tempo de concluir a Transnordestina, uma obra que começou a ser pensada no século passado, como um projeto de integração do Nordeste. No entanto, foi iniciada somente em 2006, no primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevista para ser entregue em 2010.

A previsão original de entrega da obra era no ano de 2010. No entanto, o prazo foi revisto várias vezes, devido a interrupções, com a obra ficando parada por longos períodos devido à falta de recursos e até por disputas políticas para reivindicar protagonismo na obra.

A previsão é que a ferrovia transporte volumes de mercadorias estimados em dezenas de milhões de toneladas por ano, a um custo mais baixo do que o realizado por rodovias. Portanto, o preço dos produtos tenderá a cair, aumentando a competitividade internacional dos produtos brasileiros.

A nova promessa é que a inauguração acontecerá no fim do próximo ano. O que se espera é que não haja novos adiamentos; que a Transnordestina esteja em pleno funcionamento em 2026, incorporando-se à região como um importante instrumento para o desenvolvimento da região, contribuindo também para alavancar a economia do País.

 

 

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