segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

Não é a primeira vez que o Brasil se vê desafiado pelas encruzilhadas da História. Os eleitores escolherão caminhos de mudança, uns mais bem pavimentados, outros potencialmente acidentados. Manter as coisas como estão não é boa alternativa, como já está claro para a maioria.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente da República. A encruzilhada da mudança, O Estado de S. Paulo, 7 de setembro de 2014.

Campanhas refazem planos após delação

• Comitês adequam discursos depois de revelação dos depoimentos de Paulo Roberto Costa; Dilma diz que governo não foi acusado oficialmente, enquanto Aécio cobra manifestação da presidente; Marina fala em campanha difamatória por adversários

Campanhas presidenciais reavaliam estratégias após delação de ex-diretor

Vera Rosa, Rafael Moraes Moura, Ricardo Galhardo, Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

As principais campanhas à Presidência foram obrigadas a reavaliar suas estratégias após a revelação de parte do conteúdo dos depoimentos do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa, em delação premiada à Justiça. Neste domingo, 7, a menos de um mês do 1º turno, os candidatos voltaram a tratar do tema corrupção na estatal.

A lista de citados por Costa como beneficiários de um esquema de propina na Petrobrás apresentada pela revista Veja em sua edição do fim de semana causou apreensão no comitê da presidente Dilma Rousseff (PT) e desconforto no comando da campanha de Marina Silva (PSB).

A presidente Dilma Rousseff orientou neste domingo, 7, sua equipe a blindar o governo e sua campanha das denúncias de Costa. A ordem no Palácio do Planalto é sugerir “desespero” e interesses ocultos por trás das acusações, sem entrar no mérito de cada uma delas.

Entre os nomes citados, segundo a revista, está o do ex-governador de Pernambuco e ex-candidato do PSB à Presidência, Eduardo Campos, morto em um acidente aéreo no dia 13 de agosto. Marina, que assumiu a candidatura presidencial após a morte de Campos , afirmou que o vazamento de denúncias envolvendo o nome do ex-governador entre os suspeitos de desvios na estatal é parte de uma “estratégia leviana” de “uso de meios oficiais” para destruir os adversários na disputa eleitoral.

O PSDB, do candidato Aécio Neves, quer aproveitar o episódio para tentar reverter sua queda nas pesquisas. Enquanto o presidenciável tucano tenta colar a pecha de corrupção no governo Dilma, sua campanha vai tentar reativar a investigação no Congresso sobre a Petrobrás.

No acordo de delação firmado com procuradores da Operação Lava Jato, o ex-diretor da estatal citou também, conforme a revista, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros (PMDB-AL) e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN); o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e a atual governadora do Maranhão, Roseana Sarney; o ex-ministro da Cidades Mário Negromonte (PP-BA) e o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, além de outros parlamentares do PT e aliados.

‘Oficialmente’. Dilma disse neste domingo, 7, em entrevista, que a lista de nomes apresentada por Costa, “não lança suspeita nenhuma sobre o governo na medida em que ninguém do governo foi oficialmente acusado”.

A presidente indicou, porém, que poderá tomar “medidas mais fortes” imediatamente, caso as denúncias sejam comprovadas. “Eu gostaria muito de ter acesso a essas informações de forma oficial. Eu preciso dos dados que tenham alguma interferência no meu governo, porque, se não me derem, não tenho como tomar uma providência.”

Ao ser questionada se Lobão permanecerá no cargo após ser citado pelo ex-diretor da Petrobrás, Dilma não escondeu a contrariedade e disse que o ministro já deu explicações oficiais.

Em São Paulo, também em entrevista no comitê de sua campanha, Marina voltou a acusar o governo Dilma de “inviabilizar” a estatal e recorreu a um versículo daBíblia (João 8:32) para dizer que não teme o resultado das investigações. “Eu sou do lema de que diz: ‘conhecereis a verdade e ela vos libertará’”, afirmou a candidata do PSB.

Além da associação de Campos aos desvios na estatal, Marina reclamou de uma “campanha difamatória” promovida, segundo ela, pelos adversários. “A sociedade brasileira está assistindo um degradante espetáculo político inédito: PT e PSDB irmanados na determinação de nos destruir, não importam os meios”, acusou a candidata.

Em São Gonçalo, no Rio, Aécio Neves, cobrou manifestação mais firme de Dilma sobre a existência de um esquema de corrupção na Petrobrás, “Não dá para dizer que (Dilma) não sabia de nada. Esse é o resultado mais perverso da pior das marcas do governo do PT, o aparelhamento do Estado brasileiro”, disse o tucano.

O deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), coordenador jurídico da campanha de Aécio, vai apresentar esta semana dois requerimentos na CPI mista da Petrobrás. O primeiro pede que a Polícia Federal compartilhe as provas com a comissão. O segundo solicita que a comissão ouça imediatamente o ex-diretor da Petrobrás.

Campanha de Dilma muda após delação de corrupção bilionária

• Rossetto substitui Falcão para afastar a presidente da ala do PT ligada ao escândalo na Petrobras

Simone Iglesias – O Globo

BRASÍLIA - Em meio ao impacto negativo provocado pela delação de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras que acusou políticos petistas e da base aliada de envolvimento em um suposto esquema de desvio de recursos da estatal, a presidente Dilma Rousseff (PT) decidiu alterar o comando de sua campanha à reeleição. O ministro Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) assume a partir de hoje a coordenação geral da campanha. A função vinha sendo dividida entre o presidente do PT, Rui Falcão, e Giles Azevedo, que foi chefe de gabinete de Dilma.

A entrada de Rossetto dilui o poder de Falcão, que integra o campo majoritário do PT, do qual faz parte também o tesoureiro nacional do partido, João Vaccari Neto, também envolvido por Paulo Roberto Costa no suposto esquema de recebimento de propina da Petrobras. A entrada de Rossetto, além de mudar o comando político e estratégico da campanha, tenta demarcar melhor a distância de Dilma em relação a Vaccari.

A mudança não retira totalmente o poder de Falcão, porque, como presidente nacional do PT, ele tem a prerrogativa estatutária de integrar a coordenação de todas as campanhas. Mas seu poder agora será compartilhado com um petista de ala mais à esquerda do partido e mais próximo a Dilma. Rossetto não integra o campo majoritário do PT, ala à qual também pertence o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Quanto a Giles, apesar de ser um nome ligado à presidente, ele sempre teve uma atuação mais burocrática e menos política no governo e na campanha. As mudanças ocorrem num momento em que o ex-diretor da Petrobras denuncia o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, Vaccari e parlamentares da base governista de terem recebido propina de contratos da estatal.

Rossetto terá "autoridade" e "autonomia"
O crescimento de Marina Silva (PSB) e as denúncias envolvendo políticos da base aliada em meio a uma campanha que, há duas semanas, parecia consolidada em favor da reeleição levaram a presidente a destacar um auxiliar de sua extrema confiança e que parece ter mais habilidade para fazer um elo entre governo e campanha. Rossetto assume com "autoridade" e "autonomia" dados por Dilma para tomar decisões estratégicas a partir de agora.

A primeira delas será a de também manter a principal adversária, Marina Silva, na defensiva. Integrantes da coordenação da campanha petista dizem que Marina terá que responder pelo envolvimento de Eduardo Campos, ex-governador de Pernambuco, morto em um acidente aéreo no mês passado, no esquema de recebimento de propina delatado por Costa.

- Marina é do PSB. Era candidata a vice de Eduardo Campos. É sua herdeira política na disputa eleitoral. Não há como ela se descolar das denúncias - disse um auxiliar da presidente.

O comitê de Dilma provocará a adversária a defender Campos sempre que forem mencionadas as denúncias de Costa. A estratégia é de contra-ataque, respondendo na linha de que Marina não representa "a nova política" no momento em que pairam dúvidas sobre a conduta política de Campos.

Quanto ao tucano Aécio Neves, a avaliação entre os aliados de Dilma é que ele não terá mais tempo de se recuperar eleitoralmente, e que a polarização com Marina é irreversível. Os dirigentes petistas sabem que os ataques do PSDB serão intensos, mas esperam que eles tenham pouca ressonância. Por isso, a ideia é deixar Aécio em segundo plano, polarizando mesmo com Marina. Além de colar a pessebista em eventuais problemas de Campos, Dilma insistirá nas contradições da ex-ministra.

Novo coordenador avalia quadro com Dilma
Rossetto passou a tarde de ontem no Palácio da Alvorada com Dilma avaliando o quadro eleitoral e redefinindo os rumos da campanha. Caberá a ele representar Dilma na definição de estratégias para desconstruir Marina. Numa primeira análise, segundo integrantes da campanha, serão mais bem programadas as viagens e os eventos dos quais ela participará. A avaliação é que, como Dilma decide em cima da hora, os eventos acabam parecendo improvisados.

No começo da disputa eleitoral, a presidente sinalizou que o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) assumiria função estratégica na campanha. Há algumas semanas, no entanto, Rossetto vinha sendo chamado por Dilma a opinar politicamente. As conversas vieram se acentuando nos últimos dias. Dilma e o ministro se conhecem há pelo menos 20 anos.

Rossetto foi "chefe" de Dilma quando era vice-governador do Rio Grande do Sul, e ela, secretária de Minas, Energia e Telecomunicações do estado. Ele foi um dos principais articuladores da saída de Dilma do PDT e de sua filiação ao PT. É um dos raros políticos que consegue ter autonomia e carta branca da presidente para trabalhar. Antes de voltar ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, cargo que já ocupou no governo Lula, foi presidente da Petrobras Biocombustível.

- A campanha precisava de alguém com uma espécie de mandato de Dilma para resolver, decidir e analisar o quadro de forma mais estratégica - disse um auxiliar da presidente, sem mencionar as denúncias de Costa.

Desde o começo da disputa eleitoral se avolumam reclamações sobre desentendimentos internos e falta de comando na campanha.

PT e PSB querem acesso a delação sobre Petrobras

• Dilma Rousseff e Marina Silva temem desgaste eleitoral com citação a aliados

• Oposicionista acha que noticiário dá novo fôlego a CPI, mas teme articulação do governo contra requerimentos

Valdo Cruz, Dimmi Amora e Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA / SÃO PAULO - Preocupados com o desgaste diário provocado pela delação do ex-diretor da Petrobras, PT e PSB querem ter acesso aos depoimentos de Paulo Roberto Costa para traçar uma estratégia de reação e evitar danos eleitorais.

Assessores presidenciais disseram à Folha que o governo, por meio da Petrobras, vai solicitar a documentação assim que o processo de delação premiada estiver concluído. O problema, diz um deles, é que não há prazo para que isso ocorra.

O temor do governo é que o processo se arraste até o final do primeiro turno, desgastando a imagem de Dilma. Nesse caso, diz um auxiliar da presidente, a candidata à reeleição pode virar "refém dos vazamentos" de informações, sem condições de reagir preventivamente a eles.

Neste domingo (7), a presidente afirmou que, quando tiver informações detalhadas, tomará "todas as medidas cabíveis", mas negou que seu governo esteja sob suspeita.

"[Uma reportagem] não lança suspeita nenhuma sobre o governo, na medida em que ninguém do governo foi oficialmente acusado", disse.

A campanha do PT ainda vai avaliar, por meio de pesquisas, o impacto das acusações na campanha de Dilma para definir uma estratégia de reação no programa eleitoral da candidata.

A revista "Veja" revelou os nomes de 12 políticos mencionados em depoimento do ex-diretor da Petrobras como envolvidos em esquema de corrupção na estatal. Não foram divulgados detalhes, documentos nem valores.

Dentre os citados por Costa estão Sérgio Cabral (ex-governador do Rio pelo PMDB), Roseana Sarney (governadora do Maranhão pelo PMDB), João Vaccari (tesoureiro nacional do PT), Henrique Alves (PMDB, presidente da Câmara), Renan Calheiros (PMDB, presidente do Senado), Edison Lobão (PMDB, ministro de Minas e Energia) e Mário Negromonte (PP, ex-ministro das Cidades).

Os senadores Ciro Nogueira (PP) e Romero Jucá (PMDB) e os deputados Cândido Vaccarezza (PT) e João Pizzolatti (PP) também foram relacionados como beneficiários, assim como o ex-candidato à Presidência pelo PSB Eduardo Campos, morto em agosto.

Vice de Marina, o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS) assumiu a linha de frente da defesa de Campos. Em entrevista ao lado da candidata, foi ele quem falou primeiro das acusações.

"O PSB já requereu acesso ao processo. Ele é sigiloso, mas queremos ler, saber exatamente com detalhes o que foi feito", afirmou. Ele disse que a família de Campos tem sofrido com as suspeitas e que não vai deixar o caso passar sem esclarecimentos.

Em outra frente, os pessebistas vão aproveitar o caso para tentar desqualificar a gestão da estatal no governo do PT e argumentar que Campos sempre apoiou investigações de eventuais ilegalidades na empresa.

O relator da CPI da Petrobras no Congresso, deputado Marco Maia (PT-RS) disse que vai requisitar os depoimentos de Costa. "Será a primeira coisa que vamos fazer. A partir disso, vamos discutir os rumos das investigações."

O deputado Fernando Francischini (SDD-PR) disse que não acredita que o governo permita a aprovação dos requerimentos sobre o compartilhamento das informações do depoimento de Costa. Ainda assim, avalia que as revelações dão novo fôlego ao trabalho da comissão.

"Essa CPI tomou um rumo inesperado. Agora vamos poder investigar os poderosos", disse Francischini.

Marina diz que 'corrupção e uso político' destroem a Petrobras

• Mas candidata classificou como "leviandade" ligar Eduardo Campos a escândalo

Sérgio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - Diante da delação de corrupção na Petrobras, a candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, resolveu adotar um discurso duro conta a gestão dos governos petistas à frente da estatal. Mas a presidenciável também afirmou que é uma "leviandade" ligar o ex-governador Eduardo Campos ao esquema de pagamento de propina na empresa.

A estratégia deve ser levada ao horário eleitoral, principalmente para rebater as críticas da presidente Dilma Rousseff de que Marina pretende deixar em segundo plano, caso eleita, a exploração de petróleo da camada pré-sal. Ontem, tendo como gancho a comemoração do Dia da Independência, Marina fez um pronunciamento em que acusou o governo federal de fazer "uso político" da Petrobras e destruir a empresa pela "corrupção". Também acusou PT e PSDB de estarem "irmanados" para destruir sua candidatura, se valendo de "boatos".

- Na campanha eleitoral, sou caluniada e acusada de ser contra esse patrimônio do Brasil. Enquanto essa mentira é alardeada por todos os meios, a Petrobras é destruída pelo uso político, o apadrinhamento e a corrupção - afirmou a candidata.

"Não queremos uma segunda morte"
Sobre a citação do nome de Eduardo Campos como beneficiário de propina, no entanto, a presidenciável afirmou que o nome do ex-governador, de quem era vice, não pode ser envolvido antes que sejam feitas apurações e se tenha mais informações sobre o depoimento do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

- Não queremos uma segunda morte ( De Eduardo Campos ) por leviandade - disse Marina, que pediu o aprofundamento das investigações. - Queremos a verdade. A verdade jamais irá atrapalhar uma campanha que se dispõe a ajudar a passar o Brasil a limpo.

Candidato a vice, Beto Albuquerque também defendeu Campos, alegando que antes de sua morte "as pessoas não tinham coragem" de atacá-lo.

- A família do Eduardo sofre muito com essas acusações. Não vamos deixar isso em vão - disse o vice da chapa.

Marina disse que, em agenda no interior da Bahia, no sábado, ouviu relatos de que petistas espalham boatos de que em caso de uma vitória sua o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida serão extintos. Os tucanos propagariam, segundo ela, que o seu governo não se sustentaria por falta de apoio político.

- A sociedade brasileira está assistindo a um degradante espetáculo político inédito: PT e PSDB irmanados na determinação de nos destruir, não importam os meios - discursou.
Depois do pronunciamento de ontem, Marina também foi questionada sobre as críticas que têm sido feitas contra ela pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem se diz amiga. O petista afirmou na sexta-feira que a candidata "ou não leu o próprio programa de governo ou não aprendeu nada quando estava no PT".

- Eu esperava um pouco mais de criatividade do presidente Lula no debate político. Se está certo o que saiu nos jornais, ( Lula ) está recorrendo a um acervo de desqualificações e preconceitos que eram feitos contra ele no passado. Nessa época, eu ia para a linha de frente defendê-lo.

A candidata foi indagada ainda sobre por que agora defende enfaticamente o pré-sal, se em seu programa de governo a exploração de petróleo em águas profundas só é citado uma vez em 242 páginas.

- O pré-sal já é um dado de realidade. Já está resolvido - justificou a candidata, acrescentando que uma de suas bandeiras é "manter e ampliar as conquistas" dos governos anteriores.

Antes de fazer o pronunciamento sobre a Petrobras, Marina fez um caminhada no Parque da Independência, na Zona Sul de São Paulo. O evento não fez parte de sua agenda oficial porque ela não queria que o tumulto causado pela presença da imprensa a impedisse de conversar com eleitores.

Lula está recorrendo a preconceito e discriminação, critica Marina

Fabiana Batista - Valor Econômica

SÃO PAULO - A candidata à presidência pelo PSB, Marina Silva, considerou preconceituosas e discriminatórias as declarações do ex-presidente da República Luís Inácio Lula da Silva de que ela não teria lido seu próprio programa de governo.

“Esperava mais criatividade do Lula. Se de fato ele disse o que estava nos jornais, ele está recorrendo a um acervo de desqualificações e preconceitos que eram feitos contra ele. Ouvi muita gente dizer isso dele, que o Mercadante é que tinha feito por ele tal coisa, que o Lula nem tinha lido nada. Faziam isso porque ele era metalúrgico”, lembra Marina.

Mas a sua posição, garante, sempre foi ir para a linha de frente defendê-lo. “Eu sabia que ele era inteligente e capaz. Mas hoje ele está fazendo essas mesmas desqualificações, porque eu sou negra, filha de seringueiros, porque me alfabetizei aos 16 anos. Está usando o preconceito como ferramenta política”.

Aécio: Dilma 'não pode dizer que não sabia de nada'

• Candidato do PSDB à Presidência diz que presidente precisa se posicionar de modo mais firme

Marco Grillo – O Globo

SÃO GONÇALO (RJ) - O candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, afirmou neste sábado que a presidente Dilma Rousseff (PT) "não pode dizer que não sabia de nada" em relação ao suposto esquema de corrupção na Petrobras. Em depoimento à Polícia Federal, revelado pela revista "Veja", o ex-diretor Paulo Roberto Costa citou o nome de diversos políticos que participariam das fraudes, entre eles o ministro de Minas e Energia Edison Lobão (PMDB).

Questionado se a presidente precisaria se poscionar de um modo mais firme a respeito das denúncias, Aécio foi taxativo.

- Eu acredito que sim. Não dá para dizer que não sabia de nada.

O candidato, que participou de um evento religioso em São Gonçalo, região metropolitana do Rio, voltou a classificar o episódio como "mensalão 2":

- Essas denúncias mostram que o mensalão não acabou. Criou-se um mensalão 2 durante todo esse período de governo do PT. As empresas públicas se submeteram a um projeto de poder.

Aécio evitou citar nomes de supostos envolvidos no esquema, pregou a cautela na análise do caso, mas defendeu uma nova convocação de Paulo Roberto Costa para prestar depoimento no Congresso. O ex-diretor da Petrobras depôs em junho na CPI que investiga o tem.

- Eu vejo com muita cautela essas denúncias. Elas têm que ser apuradas. O que eu constato hoje, e obviamente que não vou entrar em nomes individuais, porque não tenho ainda outras informações, mas o fato concreto, e isso quem diz é a Polícia Federal, é que existe uma organização criminosa funcionando dentro da Petrobras. Tem que se ir a fundo nisso - disse ele, que prosseguiu:

- O que nós queremos é que a CPMI (da Petrobras) possa voltar a chamar o senhor Paulo Roberto. Para que ele diga de forma mais clara, além dos nomes já vazados para a imprensa, como funcionava esse esquema. Eu não condeno previamente ninguém. Mas que existia, segundo o diretor mais importante da empresa, uma organização criminosa funcionando dentro dela durante todo esse período de governo. Isso me parece, segundo a Polícia Federal, um fato inquestionável

Marina ataca gestão petista na Petrobras e diz querer a verdade sobre denúncias

• Envolvimento do nome do ex-governador Eduardo Campos no caso das propinas recebidas da estatal foi classificado como leviandade

Sergio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - A candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, fez um pronunciamento neste domingo em que acusou o governo federal de fazer "uso político" da Petrobras e destruir a empresa pela "corrupção". A estratégia da campanha de Marina, depois das denúncias do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, será centrar fogo na gestão petista à frente da estatal, tentando vincular ao partido da presidente Dilma Rousseff às irregularidades cometidas na empresa.

Segundo a revista Veja, entre os nome de políticos que teriam sido beneficiados pelo esquema de desvio de recursos de contratos da Petrobras, estava o do ex-governador Eduardo Campos, morto em acidente aéreo.

A candidata classificou como "leviano" o envolvimento do nome do ex-governador Eduardo Campos no esquema de distribuição de propina na Petrobras. Marina disse que pretende reagir às denúncias envolvendo Campos conversando com as pessoas, com muita tranquilidade.

"Vamos reagir conversando com as pessoas e fazendo tudo até com muita tranqulidade porque nós somos democratas e acreditamos na democracia ", disse ela ao jornal O Estado de S. Paulo, durante uma caminhada no Parque da Independência, na zona Sul de São Paulo.

O candidato a vice, Beto Albuquerque, também defendeu o aliado histórico.

- Queremos a verdade. A verdade jamais atrapalhará quem está embuido de mudar o Brasil. O Eduardo morreu por uma fatalidade. Não podemos deixar que ele morra agora por uma leviandade.

Marina mais uma vez voltou a defender a exploração do pré-sal. A presidenciável tem sido acusada pela adversária Dilma Rousseff de ter planos de abandonar a exploração dos campos de petróleo em águas profundas.

Para a candidata do PSB, PT e PSDB "estão unidos na determinação de destruir" a sua a candidatura.

- A sociedade brasileira está assistindo a um degradante espetáculo político inédito: PT e PSDB irmanados na determinação de nos destruir, não importam os meios - disse Marina.

Marina disse que, em agenda no interior da Bahia, ouviu relatos de que petistas espalham boatos de que em caso de uma vitória sua o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida serão extintos. Os tucanos propagariam, segundo ela, que o seu governo não se sustentaria por falta de apoio político.

Na fala, a presidenciavel faz um histórico da Indendência do país, comemorado neste dia 7 de setembro.

- Nessa velha política, as prioridades e conquistas do povo são tratadas como favores de grupos poderosos que mantêm a nação cativa de seus interesses e de sua impressionante teia de protegidos e cúmplices no assaltos aos bens públicos. O maior exemplo disso é a Petrobras - disse a candidata.

Delação desmonta estratégia de Dilma

Andrea Jubé, Bruno Peres e Lorenna Rodrigues – Valor Econômico

BRASÍLIA - As revelações do delator da Operação Lava Jato e ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa colocaram em xeque uma das estratégias orquestradas pela campanha de Dilma Rousseff para conter a escalada de Marina Silva nas pesquisas: a importância do pré-sal. Um trunfo da Petrobras que, agora, na campanha, virou sinônimo de corrupção. A própria Marina já fez a defesa da Petrobras e do pré-sal em seu programa eleitoral do sábado, um antídoto permitido pela citação do PT e aliados na delação.

Um dos coordenadores da campanha petista admitiu ao Valor que teme o impacto da delação de Costa sobre a defesa do pré-sal, um contraponto que Dilma passou a fazer em relação a Marina, depois que o programa de governo divulgado pelo PSB reduziu a prioridade da exploração dessa riqueza natural. A valorização dessa fonte de energia como "passaporte para o futuro do Brasil", ao lado da "ameaça" de enfraquecimento dos bancos públicos - com reflexos em programas como Minha Casa, Minha Vida e financiamento da agricultura familiar - são discursos que ganharão corpo na propaganda dilmista.

O temor de que os desdobramentos das denúncias enfraqueçam esse discurso ronda a cúpula da campanha petista. Por ora, a palavra de ordem é cautela, até porque o delator citou encontros com o ex-presidente Lula e incluirá nos depoimentos a refinaria de Pasadena, mau negócio da empresa feito tendo no Conselho a própria presidente Dilma. O governo está também informado de que a lista de parlamentares envolvidos é mais extensa do que a conhecida.

A avaliação até agora é de que não há provas concretas das declarações de Costa, mas persiste a apreensão quanto ao que ainda virá a público nos próximos dias.

Por enquanto, está mantida a estratégia de acusar Marina de reduzir a prioridade do pré-sal. Na propaganda eleitoral de Dilma veiculada também no último sábado esta retórica foi reforçada. Ontem, a presidente voltou a afirmar que teme a redução da importância do pré-sal, durante entrevista no Palácio da Alvorada, após assistir ao desfile cívico-militar em comemoração ao 7 de Setembro.

Questionada sobre as denúncias de improbidade na Petrobras, Dilma afirmou que gostaria de ter acesso a "informações oficiais".

"Ninguém foi oficialmente acusado. Enquanto não me derem os dados (oficiais), não tomarei nenhuma providência. Não posso me pautar pelo que dizem, não os órgãos de investigação, mas a imprensa", rebateu.

Perguntada sobre a permanência do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB), no governo, Dilma se esquivou, dizendo que não falou com ele "nos últimos dias". Seu nome teria sido citado na delação premiada. Dilma arrematou destacando que é próprio do presidente da República "ser pressionado". "Eu também aguento a pressão bem", afirmou.

O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, que acompanhou Dilma ao desfile de 7 de setembro, classificou as denúncias como "boataria de um vazamento de um procedimento". Para ele, trata-se de uma coisa "em geral dirigida", com a finalidade de "proteger um e beneficiar outro". Para Carvalho, "estão tentando usar a notícia da delação premiada para mudar o rumo da campanha eleitoral". Em defesa dos parlamentares da base aliada (PT, PMDB e PP) citados na delação, Carvalho disse que "o que importa é a defesa das bandeiras das mudanças".

Diferentemente de outros desfiles, em que surgiu acompanhada de familiares, com todos os ministros e suas mulheres ao seu redor no palanque, a presidente apareceu sozinha neste ano, desembarcou do Rolls-Royce presidencial sob aplausos. Em pontos mais distantes do palanque de autoridades, vaias foram dirigidas a Dilma.

O vice-presidente Michel Temer à esquerda, o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), à direita, e o ministro da Defesa, Celso Amorim, dividiram o palanque com Dilma. Chamou a atenção a ausência de autoridades que prestigiaram o evento nos anos anteriores, como o ministro Edison Lobão e o segundo e terceiro na linha sucessória, os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), todos citados na delação.

Jarbas Vasconcelos diz que inclusão de Campos em denúncia visa atingir Marina

• Para senador, Paulo Roberto Costa vai 'fazer de tudo para escapar da prisão'

Ângela Lacerda - O Estado de S. Paulo

RECIFE – “A inclusão do nome de Eduardo Campos nesse lamaçal do PT tem o único objetivo de atingir a candidatura de Marina Silva, que representa hoje a mais viável possibilidade de mudar tudo isso que o PT instalou no Brasil”.

A afirmação é do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), em nota divulgada nesta tarde (7), pouco depois do candidato socialista ao governo de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), se posicionar em defesa do ex-candidato à presidência, morto em um acidente aéreo no dia 13 de agosto.

Aliado do PSB em Pernambuco, Jarbas pediu “toda a cautela possível” com a inclusão do nome de Eduardo Campos “nesse novo escândalo na Petrobras promovido pelo Governo do PT”. Para ele, o diretor de abastecimento da empresa, Paulo Roberto Costa, “vai fazer de tudo para escapar da prisão e escolher este ou aquele, visando poupar os principais responsáveis pela degradação ética e administrativa dentro da maior estatal brasileira: o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff”.

“Não podemos aceitar que um réu confesso tente incluir nomes de inocentes nas falcatruas comandas pelo PT”, frisou ele, ao mencionar que Campos “não está mais aqui para se defender” e havia se afastado do governo “justamente por discordar desse tipo de prática”.

A lista que sacode a eleição

• Delação do ex-diretor da Petrobras implica ministros, senadores, governadores e deputados, que teriam recebido propina em contratos da estatal. Acusação põe Dilma e Marina na defensiva e dá nova munição a Aécio

- Zero Hora ( RS)

Depois de a morte de Eduardo Campos provocar uma guinada nos rumos da campanha eleitoral, um novo ingrediente passou a dominar os debates dos três principais candidatos à Presidência. Ao delatar ministros, senadores, governadores e deputados na Operação Lava-Jato, da Polícia Federal (PF), o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa colocou em saia justa Marina Silva (PSB) – pelo fato de o nome de Eduardo Campos ter sido mencionado – e, principalmente, a presidente Dilma Rousseff (PT). Aécio Neves (PSDB) ganhou nova munição contra Dilma, já que dos nomes que Costa teria citado como supostos recebedores de propina a maioria integra a base aliada do governo.

De acordo com reportagem da revista Veja desta semana, Costa, preso em março pela Polícia Federal, citou em depoimentos de delação premiada nomes como os dos presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), além do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA).

Costa, preso desde março, acusa ainda três governadores, em Estados onde a Petrobras tem investimentos: Sérgio Cabral (PMDB), ex-governador do Rio, Roseana Sarney (PMDB), atual governadora do Maranhão, e Eduardo Campos, ex-governador de Pernambuco e ex-candidato à Presidência da República morto no mês passado em um acidente aéreo.

Do Senado, Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP, e Romero Jucá (PMDB-RR). Entre deputados, o petista Cândido Vaccarezza (SP) e João Pizzolatti (SC), do PP. O ex-ministro das Cidades e ex-deputado Mario Negromonte, do PP, também é citado.

Ainda de acordo com a revista, Costa admitiu que as empreiteiras contratadas pela companhia tinham, obrigatoriamente, que contribuir para um caixa paralelo destinado à base aliada do governo. Quem fazia a ponte com o esquema no PT, segundo Costa, era o tesoureiro nacional do partido, João Vaccari Neto.

Desde o dia 29, Costa está depondo em regime de delação premiada para tentar obter o perdão judicial. Os depoimentos são todos filmados e tomados em uma sala na custódia da PF em Curitiba.

Querem mudar eleição,diz Gilberto Carvalho
O vazamento "parcial" dos depoimentos do ex-diretor da Petrobras à Polícia Federal e ao Ministério Público, segundo os quais os desvios de recursos na estatal irrigaram o caixa dos partidos da base aliada, são "um pouco de desespero para mudar o rumo da campanha", disse ontem o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

– Não posso tomar como denúncia contra a base aliada uma boataria de um vazamento, de um procedimento que eu não sei qual é. Só vamos falar sobre esse tema depois que houver o inteiro teor dessas denúncias. Vazamento é uma coisa, em geral dirigida – disse.

Ele acrescentou que, por enquanto, as informações são precárias e frisou que o governo não pode agir em cima de "boataria" e "denúncia que no momento é sem comprovação, sem fundamento":

– Ninguém tem de ficar muito preocupado enquanto não tiver acesso ao inteiro teor dessa dita denúncia.

"Nunca vi uma eleição como esta", diz cientista político

Entrevista
Jairo Nicolau - Cientista político e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Sob o impacto da ascensão fulminante da candidatado PSB, Marina Silva, nas últimas semanas, o cientista político e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Jairo Nicolau afirma que nunca viu um fenômeno similar em nossa história política: "Nas eleições recentes, e mesmo antes, nunca tivemos nada do gênero dessa "onda" Marina. Em 15 dias, ela amealhou algo em torno de 38 milhões devotos. Foram quase 2 milhões de votos por dia". Nicolau arrisca dizer que é alta a probabilidade de uma vitória de Marina, mas alerta para os riscos que a ex-senadora ainda corre, tendo que se expor a debates, críticas e questionamentos. "Ela está ganhando de 2 a 0 no segundo tempo, tem um time bom, está jogando melhor, tem mais torcida, mas tem que segurar esse resultado até o final da partida", compara. No caso de Dilma Rousseff, o problema está no segundo turno: "Crescer e superar Marina, com esse forte antipetismo no ar, vai ser um enorme desafio para Dilma. O segundo turno é mata-mata. O eleitor zera o taxímetro. O PT vai ter que se organizar de outra forma", pontifica Nicolau.

Eduardo Miranda / Paulo Henrique de Noronha - Brasil Econômico

Marina Silva pode ser a próxima presidente do Brasil?

A probabilidade é alta. Eu acompanho eleição há muito tempo e nunca vi nada do gênero. É algo tão surpreendente quanto aquele 7 a 1 do Brasil e Alemanha. É totalmente fora dos padrões do comportamento eleitoral brasileiro. Mesmo se você lembrar, por exemplo, do Collor. Ele foi um outsider naquele momento, porque era filiado a um partido pequeno. Foi do PDS, depois se filiou ao PMDB, e depois desfiliou-se para entrar em um partido nanico, chamado PJ (Partido da Juventude). Trocou o nome para PRN e se candidatou à Presidência. A ascensão dele foi muito lenta, aconteceu em alguns meses. Virou um fenômeno de opinião pública, conquistou eleitores mais pobres, uma parte da classe média, e também do Nordeste. Nas eleições recentes, e mesmo antes, nunca tivemos nada do gênero dessa "onda" Marina. Em 15 dias, ela amealhou, nas minhas contas, algo em torno de 37, 38 milhões de votos.

Ela teve 19,6 milhões de votos na eleição de 2010.

Se a Rede tivesse saído e eu tivesse que apostar, em janeiro, projetaria que ela teria em torno de 20% a 25% dos votos válidos. Na estimativa que eu faço agora, excluindo os indecisos, ela estaria, hoje, com 37%, 38%. Os indecisos, brancos, nulos e candidatos dos pequenos partidos formavam 30%, e o Eduardo, 10%. Agora, eles somam10%, e Marina, mais de 30%. Ela tirou voto de todo mundo. Fez com que a Dilma tenha, hoje, o pior desempenho de um candidato do PT depois de 2002. É algo realmente impressionante para 15 dias. Foram quase 2 milhões de votos por dia que ela capturou. Dilma perdeu. Aécio, então, nem se fala. Os pequenos, que chegaram a somar 10 pontos, estão praticamente reduzidos a resíduo.

Como avalia as últimas pesquisas do Ibope e do Datafolha?

Acho que mudou pouca coisa, Dilma não cresceu, nem Marina. Elas apenas oscilaram na margem de erro. Mas a polarização é clara. Dilma parece ter se ancorado num patamar de votos válidos de 35% a 40%, o que lhe garante lugar no segundo turno. Para Marina, o desafio agora é saber se ela já atingiu seu teto devotos no primeiro turno, um teto que não é baixo, e se consegue se manter ali para evitar o risco de cair e ver o Aécio voltara crescer e ameaçar — o que é pouco provável, mas não impossível. Fazendo paralelo com um jogo de futebol, Marina está ganhando de 2 a 0 no segundo tempo, tem um time bom, está jogando melhor, tem mais torcida, mas tem que segurar esse resultado até o final da partida. Esse é o desafio dela agora, que pode se complicar porque ela está tendo que se expor, sendo criticada e questionada. E uma parcela significativa dos eleitores dela, que tem curso superior e quer uma nova política, e que migrou de maneira fulminante para Marina, vai querer saber quais são os programas, as ideias, o que ela pretende. Esse eleitor quer mais. Marina vai se expor, vai a debates, será criticada. Há uma série de críticas que vão aparecer, medos, coisas do gênero. Quando se embarca em uma onda emocional, não se pensa muito, as pessoas votam na Marina porque ela é moderna. Mas ela já recuou em alguns aspectos. De repente, o sujeito vê que estava embarcando no moderno, mas não era bem isso.

E a situação da presidenta Dilma Rousseff?

O grande desafio da campanha de Dilma será o segundo turno. O sentimento anti-Dilma é muito forte, se agravou bastante desde 2010, e a campanha do Aécio Neves concentra muitos votos desses eleitores antipetistas. No segundo turno, eles tenderão a migrar para Marina. Crescer no segundo turno e superar Marina, com esse forte antipetismo no ar, vai ser um enorme desafio para Dilma. O primeiro turno é por pontos corridos, o segundo é mata-mata. O eleitor zera o taxímetro. O PT vai ter que se organizar de outra forma.

Qual a ligação entre votos brancos, nulos, os indecisos, eleitores do Aécio, dos nanicos, e a ascensão da Marina?

Acho que os nacos que ela tirou são diferentes. Por exemplo: Rio e São Paulo estavam com 30% de eleitores dispostos a votar em branco e nulo na última pesquisa, antes da morte do Eduardo. O que já era algo espetacular, muito alto. Nas últimas eleições, os brancos e nulos ficavam na faixa de 10%. Quando o horário eleitoral começava, entre 8% e10% das pessoas diziam que iam anular o voto. Agora, a média era de 15%, mas, no Rio e em São Paulo, estava em 30%. No caso de São Paulo, o eleitor tradicional estava acostumado a ver uma polarização entre PT e PSDB, mas com um candidato a presidente tucano de São Paulo. Desta vez, não tem paulista na disputa. O candidato Aécio não teve tempo de se fazer conhecerem São Paulo. O eleitor do Rio e de São Paulo, que dizia que iria votar nulo e branco por desconhecimento, era antipetista, mas não conhecia direito nem o Campos, nem o Aécio. O Aécio teve interrompido seu processo de ascensão, sobretudo nas cidades médias do Sudeste para o Sul, onde o PSDB sempre foi muito bem desde 2002. Tudo indicava que, no mínimo, o PSDB empataria em São Paulo, com chances de vencer. Agora, está em terceiro lugar.

Mas as pesquisas indicam que o PSDB ainda está muito forte em São Paulo, deve eleger facilmente Geraldo Alckmin e José Serra.

O eleitor tucano de classe média, por alguma razão, antes de se transferir para o Aécio, migrou para a Marina. Isso aconteceu em outros estados, principalmente nos do Sul. É um fenômeno de opinião pública, que nunca aconteceu. Não só pela ascensão enorme, como pela velocidade. Todos os processos de expansão eleitoral que eu vi no Brasil foram mais graduais do que esse.

A comoção com a morte de Eduardo Campos contribuiu?

Acho que é um exagero essa avaliação. É claro que, pelo fato de ele ser um governador de um estado importante e um candidato competitivo à eleição presidencial, e a forma trágica como tudo aconteceu, acabou tendo um destaque grande na cobertura da imprensa. Eu não me lembro, nos últimos anos, de ter visto o velório de um político brasileiro que tenha mobilizado tanto. É um fenômeno... a própria cobertura da televisão, as redes sociais, a forma como tudo aconteceu, surpreendendo a todos. Ele dá uma entrevista no "Jornal Nacional" e, pela primeira vez, tem uma audiência de massa na campanha. No outro dia, de manhã... A Marina não fez nada para crescer assim tão rapidamente, ela nem teve tempo. Na verdade, teve a memória de seu desempenho em 2010. Mas é um paradoxo inacreditável. Como uma mulher que, em outubro do ano passado, não conseguiu registrar 500 mil assinaturas para organizar um partido, consegue 38 milhões de votos? É algo chocante para todos os parâmetros razoáveis. Enquanto ela não conseguia oficializar a Rede, o PEN, que é o Partido Ecológico Nacional, conseguiu. O que é o PEN? O Solidariedade também conseguiu, o Pros...

Dá para apontar uma causa para o crescimento da Marina, além dos 19,6 milhões de votos que ela teve em 2010?

É difícil de explicar. É um fenômeno que acontece, exclusivamente, na eleição nacional, não se reproduz nos pleitos estaduais. Independentemente da avaliação que se faça da Marina, das suas ideias, do que ela simboliza, há um fenômeno de contágio de opinião pública, epidemiológico. Uma coisa de "meme", para quem acompanha as redes sociais. Ela encaixou um sentimento de insatisfação como governo do PT. É um fenômeno muito pouco refletido, comum forte componente emocional. Não vejo uma reflexão, as pessoas pouco conhecem o que a Marina pensa do mundo.

Mas as pessoas têm uma imagem da Marina...

Têm. É um clichê a respeito dela, de que ela representaria uma nova política, uma política diferente. Uma mistura de correção pessoal com ideias novas no campo ambiental. Tem um clichê de sua biografia, que já tinha sido veiculado em 2010. Isso estava adormecido? O que foi isso? Mas acho que tem um fenômeno emocional, de contágio, que não está necessariamente associado à morte do Campos. Havia, no eleitorado, uma acolhida para alguém diferente, com esse perfil.

Quanto do sentimento anti-Dilma está nisso?

Se a gente lembrar daquela teoria dos conjuntos matemáticos,há várias interseções. Por exemplo, uma parte do voto anti-Dilma mais forte, que estava com Aécio, foi transferido, por razões muito simples. É um voto útil: Marina tem mais chances de derrotar Dilma. E parte da elite está embarcando na Marina como alternativa com condições de vitórias. Não acho que ela tenha tirado votos da Dilma. Ela pegou um sentimento antiDilma dos indecisos e do Aécio.

Dilma já está em um nível histórico mínimo de votos?

Ela está abaixo do que o Lula navegou, em 2002 e 2006, desde que o horário eleitoral começou, e que ela própria navegou, em 2010 — quando começou o horário eleitoral, na faixa dos 40% (dos votos válidos). Agora, tem a chance de ela embicar para baixo, chegando aos 35%, voltando para um patamar mais próximo do PT de 1998.

E o Aécio Neves, como fica?

O Aécio tem, hoje, pouquíssimas chances. Para o PSDB, este momento é um desastre total. Mas o partido ainda tem ambições de fazer uma boa bancada e, provavelmente, será decisivo para a base de sustentação de um eventual governo Marina.

O que PT e PSDB poderiam fazer para virar esse quadro?

O Aécio conseguiu abrir dez pontos em relação a Campos, estava administrando razoavelmente bem, mirando para cima. E o PT logo percebeu que disputaria o segundo turno com ele. Agora, os estrategistas dos dois partidos não têm saída, só bater na Marina. A probabilidade de uma vitória da Dilma sobre a Marina é baixa. Não diria que é impossível, mas, em termos de probabilidade, é muito pequena. A rejeição dela é muito grande, e o voto do Aécio no segundo turno irá quase todo para a Marina. Um dado interessante desta eleição é que, ao contrário do que aconteceu com Brizola em 1989, e com Garotinho e Ciro Gomes em2002, os votos do terceiro colocado não irão para o PT no segundo turno, porque Aécio representa o voto anti-Dilma.

E a propaganda negativa, as denúncias?

Eu acho que Marina vai sofrer um ataque pesado, não tem como não sofrer. Da blogosfera petista, da máquina petista, dos partidos da base governista que estão bem alocados. De milhares de pessoas que estavam razoavelmente tranquilas e cujas vidas não mudariam caso o PT se mantivesse no poder.

Marina falou que vai convidar PSDB e PT para compor seu governo, mas não o PMDB. É possível governar sem o PMDB?

Acho difícil. Historicamente, o PMDB é um partido que se divide. Ele sempre entra com uma ala, e a outra fica na oposição. O partido pode não entrar no governo, mas algumas lideranças, sim — Pedro Simon, Jarbas Vasconcellos, Geddel Vieira Lima.Acho difícil ela falar que não vai aceitar peemedebistas. O que vejo mais parecido com o que pode ser o governo Marina é o governo Itamar Franco. Um governo de centro-direita, com setores da esquerda. Por exemplo, o Itamar puxou a Luiza Erundina, ela foi expulsa do PT por ter sido sua ministra. Vai ser um governo com PSB, PSDB, DEM, alas do PMDB. Mesmo assim, provavelmente, um governo de minoria.

O PT aceitaria o convite?

Acho que não. Marina provavelmente atrairá muitos técnicos do PT, pessoas que estão em Brasília, à frente de programas, projetos, técnicos competentes do partido que devem continuar por razões até de oportunidade. Como uma ex-egressa do PT, ela tem contatos no partido. Agora, não acredito que o partido, formalmente, participará do governo. Porque ainda tem um mês de campanha, mais o segundo turno, quando a tensão, os conflitos, os ódios e as rusgas vão se aprofundar. Ainda que ela seja uma ex-petista, hoje ela é a principal adversária, e vice-versa. No final de outubro, a relação vai estar totalmente esgarçada,é inevitável. Com o potencial, sempre, da volta de Lula em2018, é mais razoável o PT apostar e ir para a oposição, esperando quatro anos. O problema é que a minha expectativa é deque o PT saia muito mal dessas eleições. Pode se salvar um pouco em Minas, mas deve encolher sua bancada na Câmara, no Senado e em muitas assembleias. Há muita rejeição ao PT.

O PSB parece que não está se beneficiando da "onda" Marina... o partido corre o risco de não ganhar nenhum governo estadual. Aparentemente, o fenômeno Marina não se reproduz nos estados.

Pela primeira vez na história, o PSB possivelmente vai reduzir sua bancada. Ele é o único partido no Brasil que sempre aumentou sua bancada na Câmara em relação à eleição anterior. Sem Campos, ele não tem aquela força. Nas eleições estaduais, deve acontecer o de sempre. O PMDB vai crescer sua bancada, porque tem muitos candidatos a governador, e a gente vai continuar nesse cenário da hiperfragmentação, com partidos com 25, 30 deputados. O PSDB deve aumentar, vai voltar para um patamar mais condizente com seu tamanho. Deve somar, nacionalmente, uma bancada maior do que tem. Mas os demais partidos não vão ficar muito diferentes. O PT está perdendo para a oposição e vai ter que se reconfigurar internamente e fazer sua autocrítica, apostando em 2018.

No programa de governo da Marina, algo lhe chamou a atenção?

A política econômica é muito semelhante à do PSDB. Tem um ponto ou outro de políticas públicas, mas não tem nenhum diferencial significativo. Desde o governo Lula, a gente discute mais programas do que projetos. Não se fala em projeto de desenvolvimento, projeto para a educação. O que temos são programas. Acho que o programa de governo do Campos foi desenhado lá atrás por alguns técnicos de partido, com ideias socialistas. Só que, agora, o programa passou a ser algo que as pessoas vão ler. Em nenhuma outra eleição as pessoas tiveram tanto interesse em ler um programa como terão, agora, como da Marina, porque ela nos colocou nessa incerteza total do que ela é. A gente entrou em um território de muita incerteza, em termos de ideias.

Dá para dizer se a Marina é de esquerda, direita ou centro?

Não acho que ela seja uma pessoa de direita. Ela veio da esquerda, militou no PT a vida inteira, mas, desde que saiu do PT— e não tem muito tempo, foi em 2009 — tem procurado um espaço. Buscou abrigo no PV e não conseguiu ficar. Quis organizar a Rede e não conseguiu. E buscou o PSB por uma pura estratégia de viabilizar seus quadros, de modo que os candidatos ligados a ela pudessem se eleger e criar uma base mínima. A ideia era muito mais fortalecera Rede para, depois, ela ter um partido, do que propriamente uma vitória. Não acho que seja de direita, mas terá que fazer um governo de centro-direita. Talvez, com um diferencial de uma agenda com temas ambientais. O meio ambiente nunca foi o tema central do PT, que sempre foi um partido desenvolvimentista clássico, com o tema ambiental entrando pela lateral. Talvez, ela possa, em uma política pública aqui, outra acolá, colocar essa marca ambiental. Mas, seu governo deve ser parecido com o que seria um governo liberal na economia, conservador nos costumes e progressista nas questões ambientais. Pelo menos são os sinais que está dando.

E a resistência do agronegócio?

O agronegócio encontrou no Aécio seu candidato mais natural, outra parte foi acolhida no governo petista e Marina deu declarações fortes. Acho que eles não odeiam, mas não têm simpatia por ela. O que ela poderia fazer? Um presidente pode muito pouco. Mandar uma lei proibindo o alimento transgênico? Isso é com o Congresso, que no Brasil é de centro-direita. Ela não pode muito contra o agronegócio.

Marina é a "nova política"?

Não se faz uma nova política sem um novo partido. Talvez se a Rede tivesse se viabilizado com uma agenda nova, quadros novos, fazendo bancada... O que percebo é alguém que encarnou essa renovação da política, mas não tem o lastro do carisma e do que ela representa. O Lula, por exemplo, sempre foi muito maior que o PT e conseguiu se comunicar com a sociedade de maneira muito mais eficiente do que o partido. A Marina é uma figura que acentua esse aspecto da renovação, mas o que me preocupa é que ela subiu sem nada embaixo. Para mim, é muito sintomático que ela não tenha conseguido organizar a Rede. É uma expressão de inépcia política não conseguir 500 mil assinaturas para registrar um partido no Brasil. Marina não tem um movimento, e as renovações da política acontecem com movimentos. Acho que ela está chegando à Presidência em função de um sentimento geral de insatisfação como governo que aí está, sem que a população tivesse tido chances de conhecer outras alternativas. Acho que ela é uma candidata que vai se cercar de quadros bons, terá de fazer aliança com quadros tradicionais, mas não tem o lastro da renovação.

Beto Albuquerque, vice de Marina, defendeu que a população vá às ruas pressionar o Congresso pela reforma política. Isso é viável?

Não é viável. Eu quase diria que é patético. Primeiro, a população não vai para a rua por esse exemplo particular. A população só vai para a rua discutir reforma política quando isso envolve a corrupção. Foi assim na Itália e no Japão, em 1993. São os únicos exemplos que eu conheço, em um regime democrático, para a reforma política. Temas da reforma política são técnicos, envolvem uma discussão ouvindo especialistas. É o mesmo que pedir à população para ir às ruas pela reforma tributária. Exige um conhecimento técnico-orçamentário. Acho isso uma fantasia. A população brasileira não tem esse hábito de pressionar Congresso nenhum para tema nenhum. Se, eventualmente, em um tem a chave, tivermos que fazer algumas passeatas, como os cariocas fizeram para o pré-sal, e os evangélicos por uma lei das células-tronco, é da vida. Agora, pressupor uma mobilização permanente, não cabe no modelo democrático brasileiro. É uma tolice achar que, para o governo ser eficiente, você tem que criar uma espécie de democracia de ruas. Nem o Lula tentou isso.

O horário eleitoral gratuito no rádio e na TV ainda tem peso na eleição? Dilma tem 5,5 vezes mais tempo do que Marina...

O horário eleitoral fixo, que é o latifúndio da Dilma, de 12 minutos, praticamente não está sendo mais assistido pela população. No começo dele, bateu 30 pontos de audiência, 10 abaixo do que a última eleição. Agora, quatro anos depois, muito mais gente tem TV a cabo, Netflix, banda larga em casa, formas de pensar uma utilização do tempo que não seja ficar diante da TV. O formato do programa se exauriu, não está mais funcionando como canal de comunicação. Diferentemente daqueles spots de 30 segundos, que passam em meio à programação normal, que têm uma utilidade, de fazer com que candidatos sejam conhecidos pelo eleitor. Por exemplo, o Miro Teixeira, que eu achava que não seria mais candidato, de repente, no meio do futebol, da novela, entra o spot do Miro, com seu número. Aí a pessoa descobre que ele veio a candidato. Para o PT, que tem que enfiar a Dilma falando coisas em 12 minutos, um tempo gigantesco, esse horário rígido não irá reverter o cenário. O que poderia reverter é o contencioso: a Marina ter que se explicar, participar dos debates e não ir bem.Para o segundo turno, o PT tem uma expectativa muito grande de que a Marina deslize, por ambas terem tempos iguais no rádioe TV. A Dilma teria muitas coisas para mostrar, e Marina, não. O problema é: o eleitor já conhece os programas e está avaliando o governo mal. Uma parte da população não quer mais esse governo. Cansou, por uma série de razões. Com a economia parada, o governo mal avaliado, o PT está muito queimado.

O PSDB vai embarcar no governo Marina, se ela ganhar?

Não tem outro jeito. O PSDB acaba se não for para o governo da Marina. Apesar de ter São Paulo, deve perder o governo de Minas,e isso já é um golpe muito forte.Do ponto de vista político, o PSDB sai arrasado. Mas pode fazer uma bancada de 50 a 60 deputados federais. E Marina vai precisar de centenas de técnicos para fazer a máquina andar. O PSDB tem esses técnicos em seus quadros, nos estados. Acho que o PSDB vai em peso para o governo,como base de sustentação, e vai querer influenciar nas decisões.

Fernando Gabeira: Sobre o fim de uma era

• Não há mágicas para criar um novo mundo político. Mas há possibilidades de algo melhor. Por que não aceitar isto?

- O Globo, 7/9/2104

No livro de Milan Kundera “A festa da insignificância”, um personagem disse: “Ninguém em torno de Stálin sabia mais o que é uma brincadeira. É por isso, a meu ver, que um grande novo período da história se anunciava”. O personagem, chamado Charles, referia-se a uma piada que Stálin contava e nenhum dos seus ministros conseguia rir, com medo de que o ditador estivesse falando sério.

É muito difícil prever fins de era. Mas quando o país entra numa recessão econômica é razoável prever o fim de uma longa política que resultou num desastre: foi a pior performance da História, pior que a do Marechal Floriano, em tempo de guerra.

No Flamengo, um amigo me perguntou o que era recessão técnica. Repeti o que tenho lido: o país não cresceu nos dois últimos trimestres. É como um time que passasse meio ano sem vencer.

— Se é a recessão técnica, por que não demitir o técnico, como no futebol? — concluiu o amigo.

No jogo democrático troca-se o grande técnico de quatro em quatro anos, com direito a mais quatro. O amigo perguntou: quem e como vai nos tirar desse buraco? Se fosse só a recessão econômica as coisas seriam mais simples. Minha resposta seria limitada aos projetos e equipes econômicas.

Mas há uma crise de outra natureza: o imenso abismo entre o sistema político e as aspirações cotidianas. Para milhões de brasileiros, o programa eleitoral na tevê não interessa. Muitos limitam-se a se divertir um pouco com mensagens e figuras que parecem de outra galáxia.

O clima em Brasília é de terra arrasada. O governo e seus aliados tiveram o maior empenho em nivelar por baixo. A frase da velha senhora, na peça de Friedrich Dürrenmatt, foi o guia da esquerda no poder: “O mundo fez de mim uma puta. Vou fazer do mundo um bordel”.

Contei ao amigo do Flamengo que durante muitos meses mostramos que havia algo de errado na economia, que o ciclo estava esgotado.

Dilma e a artilharia do PT nos chamavam de urubus. Tinham e têm, até hoje, confiança de que estão no caminho certo. O que fazer? Se no Planalto animalizam a oposição, o que esperar dos militantes na planície? Sou meio vegetariano, mas admiro a elegância do voo do urubu.

Mesmo sem crise econômica, já seria delicado o momento de rejeição aos políticos. Com ela, aumentam as chances de mudança. Os caminhos para superar a crise econômica, de uma certa forma, já estavam implícitos nesses anos de crítica. Não há uma grande invenção no horizonte.

Para superar a crise de confiança na política, as alternativas são bem mais complicados. Desejo profundamente uma reforma que restabeleça em nosso pais um mínimo de confiança na democracia representativa. Tenho reservas quanto ao rótulo de uma nova política. Sou escaldado com aquele conceito do novo homem, na revolução cubana. Quantos não foram fuzilados ou presos porque não cabiam no modelo?

Se o leitor de Guevara se dedicar a algumas peças de Shakespeare vai compreender que as pessoas, de uma certa forma, são sempre as mesmas ao longo do tempo: imperfeitas, contraditórias, comoventes, limitadas. No entanto, é possível fazer algo melhor no Brasil. A sinceridade de alguns líderes, por exemplo, é algo que pode contribuir para a redução do abismo.

Não há mágicas para criar um novo mundo político. Mas há possibilidades de algo melhor. Por que não aceitar isto? Quem esperou um novo mundo, amanhãs que cantam, sociedades perfeitas, aprendeu, desde que tenha suportado as dores, que o buraco é mais embaixo. A existência de razões para o fim de uma era não basta para inaugurar uma outra. Os atores são importantes, sobretudo se concordarem com alguns pontos essenciais e mantiverem a unidade diante dos anos difíceis que virão.

De um ponto vista econômico a experiência chavista na Venezuela é um fracasso. Mas ainda assim, na últimas eleições, a maioria preferiu Nicolás Maduro. Hoje, na Venezuela, os consumidores passam por uma identificação digital antes das compras. É para evitar que comprem duas vezes no mesmo dia. Com todo o fracasso econômico, Maduro ainda se equilibra conversando com Chavez transfigurado em pássaro ou desenhado numa caverna do metrô.

O Brasil não tem os excedentes do petróleo, é mais complexo que a Venezuela. Os dois estão numa encruzilhada. A nossa é menos assustadora, menos presente no cotidiano. Costumo dizer que a nacionalidade não é uma segunda pele. Você pode se desfazer dela, vivendo no estrangeiro. Mas o Brasil tem um peso na identidade de cada um. Quando murcha, murcha uma parte de nós.

Há uma chance real de mudança que encaro com um otimismo moderado, fiel ao mundo de Shakespeare, ao mundo das pessoas reais que, modestamente, querem controle da corrupção, serviços públicos decentes e políticos, ainda que tediosos, razoavelmente confiáveis.

José Roberto Toledo: Marina e a terceira onda

- O Estado de S. Paulo

A primeira lhe chegou como quem vem do passado. Trouxe 20% de eleitores, com o mesmo perfil dos que haviam votado em Marina Silva em 2010. A segunda correu por sobre a primeira. Trouxe descontentes, anuladores e distraídos. Somados aos jovens e velhos protestantes, equipararam-na a Dilma Rousseff e seus petistas e bolsistas. Haverá uma terceira onda? O tsunami definitivo de petróleo, lama e votos? Não imediatamente.

Todas as pesquisas divulgadas e não divulgadas mostram que a segunda onda de Marina espumou. Tampouco há sinais de crescimento da candidata do PSB nos trackings telefônicos dos partidos. O motivo é simples: não há mais eleitores à toa.

Marina raspou o que havia em excesso de votos nulos, brancos e indecisos - só sobraram as proporções históricas e esperadas. Transformou o Pastor Everaldo (PSC) em nanico e levou a maioria dos nanicos de volta à taxa zero. Para voltar a crescer, Marina precisa obrigatoriamente tirar de Aécio Neves ou de Dilma.

A presidente encontrou seu bastião da resistência no eleitorado que se beneficia do Bolsa Família e nos petistas históricos e militantes. É bem mais difícil Marina seduzir esses eleitores de Dilma do que os que estavam sem candidato ou haviam nanicado. Sobra-lhe o eleitorado aecista.

O tucano está se segurando, por enquanto, nos 15%. São eleitores mais velhos, de renda mais alta, nível superior, brancos e católicos. Estão concentrados principalmente no Sudeste. São antipetistas, mas não são eleitores típicos de Marina. Só votariam nela no primeiro turno se tivessem a certeza de que Aécio não tem mais chance e de que o seu "voto útil" em Marina liquidaria logo a eleição e tiraria o PT do poder de vez.

Esse consenso ainda não se formou, porém. Apesar de ter precisado convocar entrevista para dizer que não iria renunciar, Aécio ainda se imagina no jogo. E está mais animado depois da última denúncia envolvendo a Petrobrás e meia dúzia de partidos.

Há a deduragem de um réu confesso (no Brasil, quanto mais suja a fonte, mais transparente ela quer parecer): nomes vazados; provas, nem tanto. Pouco importa a precisão na eleição. O que decanta, para o grosso da opinião pública, é mais um escândalo envolvendo políticos. É mais do mesmo. Só reforça a antipolítica e a despolitização que desgastou Dilma e submergiu Aécio.

Tanto faz o adjetivo: o maior escândalo, mensalão 2 (mensalão 3 seria mais apropriado, mas deixa estar), a mãe de todas as corrupções. Pode-se exagerar os superlativos até matar Joaquim Barbosa de inveja por ter julgado um caso, por comparação, menor. De tanto martelar que política é sinônimo de corrupção, grande parte dos eleitores acabou acreditando.

Quem é o símbolo da antipolítica na eleição presidencial de 2014? PT e PSDB é que não são. Difícil de imaginar que possam colher algum voto de mais um escândalo. Podem se acusar o quanto quiserem, só estarão pregando para convertidos. Se alguém pode crescer no tiroteio, é quem se vende e é comprado como "o novo".

O nome de Eduardo Campos apareceu na alcaguetagem, e logo: "A refinaria de Abreu e Lima custou bilhões, e 3% disso dá centenas de milhões de reais". Assim como o avião fantasma da campanha do PSB não colou em Marina, a refinaria não fica no Acre, mas em Pernambuco. Marina e Eduardo tinham pouco em comum, só o plano de se ejetarem do jato petista e tentarem alçar voos solos. "Providência divina" ou acaso, Marina não voou e voou. Alto.

Sem contratos na Petrobrás, Marina vai representar, de novo, o papel que mais lhe convém, o de injustiçada indignada. Já recitou as primeiras falas ao dizer que "qualquer acusação sobre uma pessoa que não está aqui para se defender pode ser uma grande injustiça". Talvez não seja o suficiente para iniciar uma terceira onda, mas vai provocar uma marolinha em Pernambuco.

Por ora, o "petrogate" segura Aécio. No fim, ajuda Marina

Ricardo Noblat: Um mar de lama ameaça a Petrobras

- O Globo

"A Petrobras é uma conquista do trabalhador brasileiro. É do interesse da União defender a Petrobras" Dilma Rousseff

A exemplo de Lula no caso do mensalão, em 2005, quando Dilma dirá que foi traída e pedirá desculpas aos brasileiros pelo escândalo do mar de lama que entope os dutos da Petrobras , ameaçando tragar a maior empresa do continente? No mínimo, é o que se espera dela, ex-ministra das Minas e Energia, ex-presidente do Conselho de Administração da Petrobras e presidente da República em final de mandato.

DIGAMOS QUE Dilma compete com Lula para ver quem foi mais feito de bobo por seus subordinados. A auxiliar de mais largo prestígio nos oito anos de Lula no poder, a presidente eleita sem jamais ter sido, sequer, síndica de prédio, Dilma foi surpreendida, assim como o seu mentor , pelo escândalo do mensalão — o pagamento de propina a deputados federais para que votassem conforme a vontade do governo .

FOI SURPREENDIDA de novo quando chefiou a Casa Civil da Presidência da República e ficou sabendo que um dos seus funcionários confeccionara um dossiê sobre o uso de cartões corporativos pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e sua mulher, dona Ruth. Dilma pediu desculpas ao casal. O autor do dossiê conseguiu manter-se na órbita do serviço público.

OUTRA VEZ, Dilma foi surpreendida pela suspeita de malfeitos praticados por Erenice Guerra, seu braço-direito na Casa Civil e, mais tarde, sucessora no comando do ministério. Na ocasião, Dilma estava em campanha pela vaga de Lula. Para evitar danos à sua candidatura, Erenice pediu demissão. Dali a dois anos, a Justiça a inocentou por falta de provas de que roubara e deixara roubar.

QUASE AO TÉRMINO do seu primeiro ano de governo, batizada por assessores de "a faxineira ética", Dilma degolou seis ministros de Estado. Pesaram contra eles acusações de corrupção publicadas pela imprensa. De lá para cá, ministérios e cargos públicos foram entregues por Dilma aos ex-ministros degolados ou a grupos políticos ligados a eles. A "faxineira ética" baixou à sepultura.

POR ORA, Dilma está atônita e se recusa a falar sobre o mais novo escândalo que bate à sua porta. Paulo Roberto Costa, chamado de Paulinho por Lula, preso em março último pela Polícia Federal como um dos cérebros da quadrilha acusada de roubar a Petrobras, começou a contar o que sabe — ou o que diz saber. Em troca, quer o perdão judicial para não ter que amargar até 50 anos de cadeia.

DILMA SABE muito bem quem é Paulinho, nomeado por Lula em 2004 para a diretoria de Abastecimento da Petrobras. Saiu dali só em 2012. No período, compartilharam decisões, algumas delas, responsáveis por prejuízos bilionários causados à Petrobras. Dilma mandou diretamente na empresa enquanto foi ministra das Minas e Energia e chefe da Casa Civil. Manda, hoje, via ministro Edison Lobão, das Minas e Energia.

LOBÃO FOI CITADO por Paulinho como um dos políticos integrantes da mais nova e "sofisticada organização criminosa " da praça, juntamente com mais seis senadores, 25 deputados federais e três ex-governadores. A organização superfaturava licitações da Petrobras e desviava dinheiro para um caixa que financiava campanhas de políticos da base de apoio ao governo. Por suposto, nem Lula nem Dilma sabiam disso.

O QUE É MAIS notável: entra campanha e sai campanha da Era PT, e os adversários do governo são acusados por Lula e Dilma de se valerem da Petrobras como arma política. Pois bem, debaixo do nariz deles, seus camaradas usaram a Petrobras como arma para enriquecer.

Valdo Cruz: Vista grossa

- Folha de S. Paulo

De como funcionava o esquema, pelo visto, ela não sabia. De detalhes, também não. Mas ela sabia que a pedra preciosa de seu governo estava sendo dilapidada por grupos nada republicanos.

Sua margem de manobra, contudo, era estreita no início de seu mandato. Tanto que, a princípio, deixou tudo como havia herdado de seu antecessor e criador. Aos poucos, porém, fez uma limpeza na área.

Não por outro motivo virou alvo da ira de petistas e peemedebistas, acostumados com as benesses milionárias da Petrobras, símbolo da política de Estado forte na economia da presidente Dilma Rousseff.

Daí que ninguém no Palácio do Planalto pode se dizer surpreendido com as revelações da delação premiada do ex-diretor da estatal Paulo Roberto da Costa. Talvez com sua magnitude e nomes envolvidos.

Por que, então, o governo Dilma não mandou fazer uma auditoria geral na empresa? Um amigo responde: a ela nunca chegou denúncia de um esquema concreto, mas a presidente fez o que estava a seu alcance. Mudou toda diretoria.

Um empresário diz que ela fez mais. Contratos suspeitos foram revistos e tiveram valores reduzidos. Por que não foram investigados? Aí a resposta talvez esteja nos compromissos entre criador e criatura.

Pessoalmente, o risco de envolvimento da presidente Dilma com o esquema é inexistente. Sua conduta foi no sentido contrário. Fica a dúvida se a petista não fez vista grossa diante de negócios bem suspeitos.

Tal questão será explorada na eleição. Potencial para causar estragos na candidatura petista ela tem. Dilma mandava na Petrobras --como ministra da Casa Civil e, depois, como presidente da República.

Enfim, as negociatas na Petrobras eram um escândalo à espera de um delator. Seus sócios confiavam que nenhum louco estouraria esquema tão rentável, mas surgiu um preso sem vocação para virar um novo Marcos Valério no país.

Renato Janine Ribeiro: O valor dos consensos

• Ou será mais democrático o dissenso?

- Valor Econômico

Para entender Marina, seu programa e sobretudo seu impacto em intenções de voto, é bom falar um pouco dos tipos de jogos. Estamos acostumados a jogos em que um lado ganha e outro perde. O futebol, por exemplo. A vitória do São Paulo é a derrota do Corinthians. Ou apostas. O dinheiro que amealho é o mesmo que meus adversários perderam. Mas nem todos os jogos são assim. Um roubo rende menos ao ladrão do que o prejuízo causado à vítima. Se ele rouba o som de seu carro, o dinheiro que receberá pelo equipamento será menos do que você gastará para comprar um novo e consertar a janela. E há os jogos em que os dois perdem.

O grande exemplo do jogo perde-perde é a poluição. As motosserras e carvoarias da Amazônia causam perdas imediatas, em vidas e saúde, e lucros também imediatos: a riqueza de quem desmata. Mas, a médio prazo, todos perdem com a devastação da natureza. A seca que este ano assola o Centro-Sul pode derivar desse descaso com a base natural da vida. Correu faz um tempo a lenda de que o general Westmoreland, que comandou a destruição norte-americana do Vietnã, teria perdido um filho depois da guerra, contaminado pelo pior desfolhante ali utilizado, o agente laranja. É só uma estória, mas com uma moral: quem destrói a natureza paga por isso.

A ideia de uma situação perde-perde contrasta com nossa visão usual da política e da economia, na qual sempre imaginamos que haja ganhadores e perdedores. Mas, se houver situações em que todos perdem? Então, deve também haver soluções ganha-ganha.

Temos aqui um dos raciocínios mais poderosos em termos de meio ambiente ou ecologia. Uns ganham a curto prazo com a destruição, outros perdem, mas em uma geração, todos perdemos. Assim, se revertermos esses processos, sairemos todos ganhando.

Esta é uma das lógicas subjacentes à candidatura Marina Silva. Quando ela afirma que governará com os melhores dos dois lados em que se cindiu a política brasileira, exprime a convicção de que pode unir as pessoas capazes e bem-intencionadas numa só direção. Não é fortuito que a Rede tenha nascido de uma preocupação ecológica - embora esta não seja mais o centro de suas análises e propostas. No horizonte, sempre está o ganha-ganha.

Daí, o modelo de discussão que a Rede prefere, ironizado por alguns críticos, o de construir um consenso. Reuniões duram horas. O objetivo não é tomar uma posição, o que se faria rápido com um voto. Porque votos só acentuam o racha, e a Rede quer unir as pessoas. A meta é construir propostas melhores e com maior apoio. Isso funciona muitas vezes. Gera um engajamento maior na proposta finalmente aprovada. Não exclui nenhum dos participantes. Opera de forma centrípeta, ao passo que a política é centrífuga, com as pessoas se dividindo por vaidade, interesses e até subornos. A Rede quer levar para a esfera política formas de convívio testadas em ambientes de empresas e organizações, as quais buscam aproximar, e não opor, as pessoas.

Mas os problemas são óbvios. Nada garante que, na gestão de uma sociedade complexa, essa demora dê certo. Se o presidente tem que "matar um leão por dia" (dizia FHC), não é possível construir um consenso em cada caso. Ademais, nem todas as questões podem ser conduzidas ao modelo ganha-ganha. Esse modelo serve como uma luva para a ecologia, mas bem menos para a economia.

Há o risco de que a busca do consenso paralise o processo de decisão, nublando também os conflitos reais que precisam ser decididos. Existem situações ásperas de conflito. Quem fez as contas do novo programa da Rede+PSB diz que ele não cabe no orçamento da União. Como criar um ambiente favorável às empresas e ao mesmo tempo lançar programas sociais ambiciosos?

Não custa lembrar a etimologia de decisão: vem da palavra "cisão". Decidir é cortar possibilidades. Nem sempre a decisão satisfaz, sequer parcialmente, as partes em confronto. Ou seja, o modo de convívio prezado pela Rede serve para certas situações, não para todas, talvez não as mais importantes. Para incorporar a Rede ao PSB, ao que consta Marina ouviu muitos, mas decidiu sozinha. Fica um contraste grande entre o ideal democrático, de ampla participação, e a prática por vezes monocrática.

Mas com certeza uma parte dos conflitos que hoje vivemos pode ser resolvida de modo mais manso. Conflitos entre vizinhos ou mesmo parentes poderiam sair da esfera judicial, em que apenas pioram, passando para o âmbito da conciliação. Aqui temos o que muitos chamam, palavra inflacionada de que pessoalmente não gosto, um novo "paradigma". Num mundo em que as relações sociais se tornaram mais democráticas, o que é bom, mas ao mesmo mais tensas, o que é ruim, seria uma forma de melhorar a convivência entre as pessoas, de unir o melhor da independência de cada um com o melhor da cooperação entre os próximos.

Outro risco é que sejam encobertas algumas tensões reais. Por exemplo, a certa altura o programa da candidata diz que o Tesouro deve deixar de gastar dinheiro público com certas medidas. Parece bonito, mas na verdade significa que as despesas em questão vão passar para nossos bolsos. Nossos impostos não mais as pagarão, mas nós arcaremos com elas. No final, pagaremos o valor em questão, ou nos impostos como agora, ou direto ao prestador de serviços. O custo para o cidadão pode até aumentar. Esse é um conflito real, mas que está sendo apresentado como solução, quando na verdade cria novo problema. Pode ser justa essa transferência de despesas, mas não está explicitada no programa. Ou seja, a crença no consenso pode ocultar conflitos reais. Talvez não seja por acaso que, na filosofia política, os pensadores mais recentes da democracia preferem falar em dissenso: este, pelo menos, explicita os pontos de divergência.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.