terça-feira, 16 de abril de 2019

Opinião do dia: Jürgen Habermas*

Essa formação política horizontal da vontade orientada pelo entendimento ou ao consenso alcançado de modo comunicativo deve inclusive gozar de uma primazia, tanto do ponto de vista genético quanto normativo. Para a prática de autodeterminação cidadã supõe-se uma base social autônoma, independente em relação à administração pública e ao intercâmbio socioeconômico privado, que projeta a comunicação política de ser absorvida pelo aparato do Estado ou de ser assimilada na estrutura do mercado. Na concepção republicana a esfera pública política e a sociedade civil como sua infraestrutura adquirem um significado estratégico. Ambas deve assegurar a prática de entendimento dos cidadãos sua força de integração e autonomia. Ao desacoplamento entre comunicação política e sociedade econômica corresponde um reacoplamento entre o poder administrativo e o poder comunicativo que emana da formação política da opinião e da vontade.

*Jürgen Habermas é um filósofo e sociólogo alemão que participa da tradição da teoria crítica e do pragmatismo, sendo membro da Escola de Frankfurt. Dedicou sua vida ao estudo da democracia, especialmente por meio de suas teorias do agir comunicativo, da política deliberativa e da esfera pública. “A inclusão do outro – Estudos de teoria política”, capitulo: “O que significa “política deliberativa”?”, p 398-9. Editora Unesp, 2018.

Merval Pereira: Reféns do senso comum

- O Globo

A decisão do presidente Jair Bolsonaro de intervir na Petrobras, proibindo o aumento do óleo diesel programado pela estatal, está gerando apreensão não apenas no campo econômico do governo, liderado por Paulo Guedes, mas também nos setores militares que cuidam das questões de segurança.

A certeza é de que o governo não pode ficar refém dos caminhoneiros, mesmo que avaliações políticas do Chefe do Gabinete Civil, Onyx Lorenzoni, tenham pesado mais na decisão presidencial do que a política de preços que vem sendo adotada pela Petrobras desde o governo Temer.

A estatal só se recuperou da crise em que foi jogada pelas ações populistas dos governos petistas, principalmente no mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, porque adotou uma política de preços alinhada ao mercado internacional.

As reuniões que começaram ontem e vão até hoje, em que estão presentes o presidente Jair Bolsonaro, o vice Hamilton Mourão e o ministro da Economia, Paulo Guedes, buscam compatibilizar o senso comum do presidente com as necessidades técnicas da Petrobras de se manter competitiva no mercado internacional.

Um busca otimizar a performance econômica do governo, outra procura se alinhar com seu eleitorado, que se sente explorado pelos preços da gasolina e do óleo diesel cobrados nas bombas. Uma atenção especial, no entanto, precisa ser dada à questão do ICMS, que encarece o preço do óleo diesel e da gasolina para o consumidor.

No diesel, as alíquotas mais altas são as do Amapá (25%) e Maranhão (20%). Sete estados utilizam a tarifa de 12%, a menor permitida por lei: Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O Rio a reduziu de 16% para 12% depois da greve dos caminhoneiros.

O presidente Jair Bolsonaro colocou em seu Twitter ontem uma comparação com a média dos preços da gasolina cobrados em vários países do mundo e os do Brasil, para demonstrar que cobramos muito acima: R$ 0,84 contra R$ 4,00 por litro.

Esse é um raciocínio que reflete o senso comum que se espalha pelo Twitter e outras mídias sociais. Só que Bolsonaro se esqueceu do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias), que eleva os preços nas bombas, pois a gasolina e o diesel são vendidos pela Petrobras por um preço abaixo, que chega às bombas muito mais caro.

Míriam Leitão: Investidor está desanimado

- O Globo

PIB dá sinais de fraqueza e os investidores da economia real estão desanimados com os erros sucessivos do governo

Houve uma queda de valor de mercado da Petrobras que pode ser revertida rapidamente, e o governo está formatando uma saída para atenuar o que houve. Ontem, o presidente da estatal, ao sair da reunião no Palácio, disse que a empresa é livre para reajustar os preços. O problema de curto prazo pode ser resolvido. Mas a intervenção nos preços da companhia, na sexta-feira, confirmou a desconfiança que os mais seniores no mercado financeiro e os investidores da economia real têm neste momento. Há temores e dúvidas sobre a capacidade de a atual administração superar a crise econômica, e isso se reflete nas projeções de crescimento cada vez menores. Ontem o Banco Central divulgou uma queda de 0,73% no índice de atividade de fevereiro.

Frases feitas do presidente Bolsonaro como “não entendo de economia” ou “tudo é com o Posto Ipiranga” só conseguem tranquilizar os jovens operadores do mercado. Conversas com pessoas mais graduadas revelam que tem havido muita saída de dinheiro do país e muita hesitação em apostar realmente em novos empreendimentos, por causa do conjunto de sinais negativos do governo.

Evidentemente nenhum presidente precisa ser especialista em economia, ou em educação ou em saúde, ou em transportes, ou em meio ambiente. Mas tem que ter capacidade de compreensão de assuntos complexos para a tomada de decisão. Até para delegar é preciso entender o que está entregando. A intervenção no preço do diesel foi apenas uma peça que tornou o todo bem coerente. Bolsonaro é o que sempre foi. Tem um conhecimento raso dos vários assuntos que precisa dominar para governar e preserva intacta a sua crença no intervencionismo econômico.

José Casado: O custo da desconfiança

- O Globo

Insone, Jair Bolsonaro tem passado os dias caçando fantasmas do comunismo, sepultado há três décadas. Agora resolveu renovar a fé no socialismo de direita, jabuticaba descrita pelo humorista Millôr Fernandes.

Bolsonaro reinaugurou o sistema de controle de preços em privilégio da minoria de empresários e profissionais autônomos cujos lucros oscilam com o preço do diesel da Petrobras. Uma iniciativa de clientelismo antimarxista, replicando práticas dos adversários Lula e Dilma, que levaram a empresa à bancarrota.

Na quinta-feira, ele ouviu preocupações do chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, neoconservador gaúcho, com as finanças dos “caminhoneiros” —pessoas físicas e jurídicas.

O governo já os atendera em março, impondo reajustes quinzenais à Petrobras. Desta vez, rejeitavam o aumento (5%). Onyx sugeriu, Bolsonaro chamou o presidente da petroleira e revogou a mudança.

O telefonema foi breve, mas suficiente para colocar o governo na lista de exemplos da teoria do caos aplicados à política: pequenas mudanças podem provocar efeitos imensuráveis e imprevisíveis, como mostrou o cientista Edward Lorenz há 56 anos.

Bernardo Mello Franco: Toffoli não gostou, o Supremo censurou

- O Globo

Toffoli se disse vítima de “sites ignóbeis que querem atingir as instituições”. A frase contém dois erros. O ministro não deveria atacar a imprensa nem se confundir com o tribunal que integra

Ao anunciar uma investigação sobre supostas ofensas ao Supremo, o ministro Dias Toffoli disse que o tribunal “sempre atuou na defesa das liberdades, em especial da liberdade de imprensa e de uma imprensa livre”. Um mês depois, a Corte usou o inquérito para censurar uma reportagem sobre seu presidente.

Toffoli se irritou com um texto da última edição da “Crusoé”. A revista digital informou que o ministro era tratado, em e-mails internos da Odebrecht, pelo apelido de “Amigo do amigo de meu pai”. Ele foi procurado antes da publicação, mas não quis se manifestar.

Ao se queixar da reportagem, Toffoli determinou a “devida apuração das mentiras recém divulgadas por pessoas e sites ignóbeis que querem atingir as instituições brasileiras”. A frase contém dois erros. Um ministro do Supremo não deveria atacar jornalistas nem se confundir com a instituição que integra.

O apelido revelado pela “Crusoé” se refere a Toffoli, não ao tribunal. Ele é um entre 11 juízes e ocupa a presidência em caráter temporário, graças a uma regra de rodízio. O ministro deveria explicar a mensagem, que foi passada à Lava-Jato pelo empresário Marcelo Odebrecht. Preferiu atacar o mensageiro, a revista que revelou o seu codinome.

Eliane Cantanhêde: Entre o bem e o mal

- O Estado de S.Paulo

De um lado, homenagens a Stroessner e Pinochet; de outro, ataques a Paulo Freire

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro choca o mundo ao saudar os sanguinários Alfredo Stroessner e Augusto Pinochet, a tropa bolsonarista ataca a memória, o legado e a simbologia de um dos brasileiros mais prestigiados no mundo: o educador Paulo Freire.

Ditador do Chile por 16 anos, Pinochet foi responsável por muitos milhares de mortos, desaparecidos e torturados. Já Stroessner subjugou o Paraguai por 35 anos e, além de torturas e assassinatos de adversários políticos, entrou para a história como corrupto e até pedófilo.

E quem foi Paulo Freire? Um católico e humanista que dedicou toda a vida à educação como instrumento de inclusão social, igualdade e emancipação dos povos. Sua meta, ou seu sonho, era alfabetizar e tornar cidadãos milhões de adultos brasileiros que nunca tiveram acesso a escola, a saúde e a futuro.

Seu método, reconhecido no mundo todo, respeitava as peculiaridades e o hábitat dos alunos. Ele ensinava pedreiros a ler com a palavra “tijolo”. Dezenas de países lhe renderam homenagens e ainda hoje rendem, mais de vinte anos após sua morte. Para o mundo, um educador revolucionário. Para o regime militar no seu próprio país, um comunista perigoso.

Por que comunista? Porque defendia e se dedicava a métodos inovadores de alfabetização de miseráveis e desvalidos? Porque acreditava que as pessoas têm o mesmo direito de aprender, entender, pensar, manifestar, concordar, discordar, participar? Será que comunismo é isso? Será que uma pessoa que defendia um direito universal era “de esquerda”? E será que só a esquerda defende que as pessoas aprendam a ler e se tornem cidadãos e cidadãs plenos? Duvido. Muita gente que se autoclassifica de direita também defende e se esforça para isso. Assim como muita gente que se diz de esquerda não está nem aí para “pobres” perdidos nas grandes periferias e esquecidos nos rincões do País.

Ana Carla Abrão*: Liberdade, liberdade

- O Estado de S.Paulo

Assim como a ordem permite avançar, o excesso de regras podem fazer retroceder

O Estado tem o poder de interferir no funcionamento da economia de diversas formas. É o poder público quem detém, em caráter exclusivo, a prerrogativa de regulamentar o funcionamento da economia em questões que vão desde a ordem macroeconômica, como, por exemplo, a determinação da taxa de juros (ou da meta de inflação), até o reconhecimento (ou não) da legitimidade de contratos, passando por autorizações e licenças para funcionamento de empresas, taxação ou isenções tributárias, fiscalização e tantas outras.

O conceito que se assenta por trás da regulação pública das atividades econômicas é o da correção de eventuais falhas de mercado que nos distanciam dos resultados gerais de um ambiente competitivo, transparente e eficiente. Além disso, há setores e atividades que demandam regras e critérios de funcionamento que garantam a proteção dos interesses da sociedade. São atividades onde os incentivos e resultados individuais estão desalinhados dos interesses da coletividade. Aqui, Direito e Economia se misturam e abarcam, além dos serviços públicos, as regulações financeira e de seguros, a ambiental, de preços de bens e serviços e diversas outras atividades privadas que são objeto de regras, licenças, critérios pré definidos e monitoramento por parte do poder público.

Mas assim como a boa regulação ajuda, a má atrapalha. Assim como a ordem permite avançar, o excesso de regras e sua sobreposição podem fazer retroceder. Excesso de regulação e/ou regulação mal desenhada geram restrições à liberdade econômica, comprometendo o ambiente de negócios e inibindo o empreendedorismo e a inovação. Uma burocracia custosa e pouco eficaz compromete os resultados e entrega uma economia menos produtiva. Regras inúteis e contraditórias reduzem o investimento privado e, consequentemente, a capacidade de crescimento do país e de geração de emprego e renda para a sua população. É o caso do Brasil de hoje.

Andrea Jubé: A política nacional em rotações por minuto

- Valor Econômico

A política dá voltas, e erros e pressões do passado ressurgem

Vivemos tempos estranhos em que a surpreendente fotografia de um buraco negro a 55 milhões de anos-luz da Terra, resultado inequívoco dos avanços científicos e tecnológicos, convive com a crença medieval dos terraplanistas de que a Terra é plana, e o Sol e a Lua orbitam dentro de um domo na nossa atmosfera. A Antártida ocuparia as bordas da Terra, que teria a nostálgica forma de um disco de vinil.

Contrariando os novos céticos, as evidências científicas ainda são as de que a Terra é redonda, gira em torno de si mesma, à velocidade média de 1.674 km/h para dar a volta completa em torno de seu eixo. O mesmo fenômeno se repete no estranho "planeta" chamado Brasília, conforme atestam cientistas, astrofísicos e articuladores políticos mais experientes, com milhares de horas de voo no Congresso Nacional.

Para os profissionais da Ciência Política, o mundo e a política dão voltas, em um movimento de rotação como o da Terra, de modo que a história se repete como uma constante, para recomeçar do mesmo lugar. Essa repetição dos fatos é uma oportunidade conferida aos atores políticos - que se revezam em seus papéis - para que aprendam com erros do passado.

Por esse raciocínio, nos últimos três anos, a política nacional girou e girou em torno de episódios dramáticos como um processo de impeachment, as eleições municipais, a greve dos caminhoneiros que paralisou o país, uma conturbada eleição nacional - com o clímax de um atentado a faca contra um dos candidatos - até a posse do presidente Jair Bolsonaro.

Depois de milhares de rotações por minuto, os fatos políticos voltam ao mesmo ponto de partida de 2016: ressurge o temor de nova greve dos caminhoneiros; deputados e senadores se veem novamente às voltas com a votação de uma imbricada reforma da Previdência e de uma reforma ministerial, sob as mesmas pressões enfrentadas pelo então presidente Michel Temer. Uma delas, que promete ganhar corpo nas próximas semanas, é a recriação do Ministério da Cultura.

O pano de fundo desse movimento de rotação política é a capacidade de articulação do governo. Três vezes presidente da Câmara, Michel Temer era considerado um articulador político habilidoso e profundo conhecedor das idiossincrasias do Legislativo - atributos que não se aplicam ao atual chefe do Executivo.

Daniela Chiaretti: O lado digno da natureza humana e sua sombra

- Valor Econômico

ONGs dizem coisas que governos não gostam de ouvir

No feixe de decretos dos cem dias do governo de Jair Bolsonaro, divulgados na semana passada, dois deles atingem a área socioambiental pelo bem e pelo mal. O que trata da conversão de multas ambientais tem aspecto positivo por dar continuidade ao que foi desenhado na gestão anterior, mas deixa dúvidas em suas reticências. O outro, o que extingue conselhos que incluem a participação da sociedade, é um exemplo concreto de arbitrariedade.

O decreto nº 9.760/19 dispõe sobre infrações ao ambiente e traz uma novidade que pode ser boa e outra que pode ser ruim. É preciso dar tempo a cada uma delas para ver como vão maturar.

A boa notícia é que a decisão mantém a conversão de multas ambientais. Trata-se de uma ferramenta prevista na Lei de Crimes Ambientais, de 1998, e aplicada em decreto de 2008, mas de forma confusa. Foi diligentemente aprimorada pela ex-presidente do Ibama Suely Araújo e lançada em 2017. A intenção era conseguir que infratores que não pagam paguem. O estímulo seria dar a eles desconto de 60% sobre a infração. A proposta era fazer com que o dinheiro financiasse, por exemplo, projetos de recuperação ambiental das sub-bacias do rio São Francisco, que está em situação dramática de escassez hídrica.

A proposta da conversão de multas foi mantida, mas com nova arquitetura. "Não inventamos nada, apenas aprimoramos", diz o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. A medida agora tem um sistema de descontos progressivos, dependendo do momento em que o infrator aderir ao acordo. Outra alteração é permitir empresas, além de ONGs, nas licitações dos projetos de recuperação ambiental.

Hélio Schwartsman: Censura?????

- Folha de S. Paulo

É complicado invocar no caso Danilo Gentili o argumento da legalidade

“Censura????? O cara comete um crime, é punido e vc chama de censura? Vamos é comemorar a prisão de @DaniloGentili isso sim. Foi feita justiça!” Esse tuíte é da produtora cultural Paula Lavigne. Algo na mesma linha, mas de forma mais técnica e ponderada, escreveu a professora Marina Coelho Araújo nesta Folha.

É verdade que não houve censura prévia e que o humorista foi condenado no curso de um processo regular, no qual teve direito a ampla defesa. A juíza que lhe impôs a pena de seis meses e 28 dias de prisão por ter, em vídeo de 2017, ofendido a honra da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) fundamentou sua sentença, que encontra amparo nos artigos 140 e 141 do Código Penal.

Ainda assim, penso que é complicado invocar, neste caso, o argumento da legalidade. O juiz saudita que manda apedrejar homossexuais também está só aplicando as leis do país. Há situações —e esta é uma delas— em que é necessária uma discussão prévia acerca da moralidade/oportunidade da própria norma.

Ranier Bragon: Estude o Pateta, senhor presidente

- Folha de S. Paulo

Ações ignaras de Bolsonaro para o trânsito estimulam o vale-tudo nas estradas

Está para completar 69 anos o clássico e genial desenho de seis minutos da Disney que traz o Pateta nas peles do sr. Andante (Mr. Walker) e do sr. Volante (Mr. Wheeler).

Como pedestre, o sr. Andante é um gentil cavalheiro incapaz de pisar sobre uma formiga sequer. Assim que dá partida ao motor do seu carro, porém, um fenômeno estranho acontece e sua personalidade muda completamente. De repente “ele se transforma em um monstro incontrolável, um motorista diabólico”. Agora, o sr. Andante é o sr. Volante.

Daí em diante o desenho satiriza barbaridades que assolam desde sempre as metrópoles do mundo.

Hoje em dia o Brasil vê prédios desabarem, barragens se romperem, florestas serem devastadas, além de um sem-fim de situações potencialmente desastrosas clamarem por fiscalização e prevenção rigorosas. O governo, porém, move-se em sentido oposto, na linha do desmonte.

Que importa que mais de cem pessoas morram por dia no Brasil, em média, em decorrência de acidentes nas vias públicas? Que estudos e estatísticas apontem o oposto do que o Palácio do Planalto apregoa?

Joel Pinheiro da Fonseca: Censura togada

- Folha de S. Paulo

Ao agir de forma descarada em sua defesa, STF une contra si a opinião pública

Há uma campanha injusta contra o Supremo Tribunal Federal por parte de uma militância de extrema direita, que chega a falar em "fechar o STF". É um eco da ideia lançada pelo deputado Eduardo Bolsonaro de que, caso a Suprema Corte se colocasse contra a Presidência de seu pai por qualquer motivo, bastaria mandar "um cabo e um soldado" para dar conta dela.

Dito isso, é impossível não se revoltar contra o próprio Supremo quando ele veste a carapuça do poder quase ditatorial que lhe é atribuído, e em benefício de seus próprios membros. Ao proibir que a revista Crusoé e o site O Antagonista veiculem o conteúdo do depoimento de Marcelo Odebrecht à Lava Jato, em que ele menciona o ministro Dias Toffoli, os ministros do Supremo Tribunal Federal mostram que, de fato, se julgam acima das liberdades e direitos que valem para o resto dos brasileiros.

A informação veiculada pela Crusoé consta dos autos da Lava Jato. Não é uma invenção do jornalista (caso em que, aí sim, seria razoável vedar sua reprodução). Dias Toffoli errou, portanto, ao caracterizá-la de "fake news". Pode inclusive ser que Marcelo Odebrecht tenha mentido, mas isso em nada altera a verdade do fato noticiado: ele de fato se referiu a Dias Toffoli em seu depoimento. Inevitavelmente, a tentativa de calar a imprensa produz a suspeita contrária na mente da população: se Toffoli é mesmo inocente, por que manda barrar o conteúdo da reportagem?

Ricardo Noblat: Bolsonaro é tóxico

- Blog do Noblat / Veja

Foi só um mal entendido...
Cada absurdo protagonizado pelo presidente Jair Bolsonaro desde que tomou posse não se limita a produzir estragos apenas à imagem dele, o que já não seria pouco. Estraga também a imagem dos que o socorrem para impedir que o mal se alastre.

Foi o que voltou a acontecer depois que Bolsonaro suspendeu o reajuste do preço do diesel anunciado pela Petrobras. Ao fazê-lo, metendo-se em um assunto que desconhece, Bolsonaro deixou em maus lençóis o ministro da Economia e o presidente da Petrobras.

Paulo “Posto Ipiranga” Guedes censurou com elegância a decisão do presidente da República e disse que se dará um jeito no estrago. Roberto Castello Branco, presidente da Petrobras, preferiu fazer de conta que nada simplesmente aconteceu.

Que história é essa de que Bolsonaro suspendeu o aumento anunciado pela Petrobras? Coisa nenhuma. Foi a empresa que suspendeu porque quis, segundo seu presidente. “A Petrobras é livre para tomar suas decisões”, disse ele. “Petrobras é uma coisa. Outra é o governo”.

A suspensão do reajuste custou à empresa uma perda de R$ 32 bilhões em valor de mercado na última sexta-feira com a queda de 8,5% no preço das ações. Ontem, o preço continuou caindo. Castelo Branco foi incapaz de explicar por quê.

Toffoli, uma caricatura de ditador

A censura voltou!
De duas uma. Ou falta conhecimento jurídico ao ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ou sobra vocação para ditador. Há uma terceira hipótese: à ignorância jurídica e à vocação para ditador alia-se o medo de ser flagrado em ato ilícito.

Está na Constituição: “Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social”. Está lá também: “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”.

E como se não bastasse, outro artigo da Constituição determina: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Seria preciso dizer algo mais a respeito? Por desnecessário, não.

Pois bem: Toffoli pediu e seu colega Alexandre de Moraes ordenou à revista eletrônica Crusoé e ao site O Antagonista a retirada do ar de uma reportagem onde o empresário Marcelo Odebrecht revela quem era o dono do codinome “amigo do amigo do meu pai”.

Luiz Carlos Azedo: Mais um ano no vermelho

Nas entrelinhas / Correio Braziliense

“Bolsonaro emite sinais de que não está muito empenhado em aprovar a reforma da Previdência nem acredita nos fundamentos liberais de sua política econômica”

O governo Bolsonaro prefere rosa e azul, principalmente na roupa das crianças, mas é vermelho o seu projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) apresentado ontem: a estimativa do deficit das contas públicas no próximo ano é de R$ 124 bilhões, R$ 14 bilhões a mais do que a anterior. Ou seja, o governo está enxugando gelo em termos de ajuste fiscal, mesmo considerando a reforma da Previdência.

O outro lado da moeda é o valor do salário mínimo em 2020, que será de R$ 1.040, um aumento de R$ 42 em relação aos atuais R$ 998. Não haverá aumento real do salário mínimo no ano que vem, que será corrigido apenas pela inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor). Os números da LDO são um banho de realidade na retórica da “nova política”, que coleciona polêmicas no varejo. No atacado, a opção é quase o “mais do mesmo”: meta de inflação e câmbio flutuante; o superavit fiscal, premissa para a retomada do crescimento, está além do horizonte.

A economia do país está em desaceleração. Em fevereiro, registrou a maior retração desde maio de 2018, quando ocorreu a greve dos caminhoneiros, segundo os números divulgados, ontem, pelo Banco Central. Considerado uma prévia do PIB, o Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br) registrou, em fevereiro, um recuo de 0,73%, na comparação com janeiro deste ano. O resultado foi calculado após ajuste sazonal (uma espécie de “compensação” para comparar períodos diferentes). Maio de 2018 foi marcado pelos efeitos da greve dos caminhoneiros, que resultou em um tombo de 3,11% na prévia do PIB.

A economia está travada porque o cenário macroeconômico não mudou, em grande parte, porque o presidente Jair Bolsonaro emite sinais de que não está muito empenhado em aprovar a reforma da Previdência nem acredita nos fundamentos liberais de sua política econômica. No varejo, há sinais preocupantes de que o presidente Bolsonaro governa na contramão do projeto do atacado. O caso da política de preços da Petrobras é bastante emblemático quanto a isso.

Ao intervir numa decisão da petroleira, sustando o aumento do diesel, para atender reclamações de lideranças dos caminhoneiros, o governo meteu-se numa enrascada, porque sinalizou fraqueza e desorientação. Recuou diante de uma ameaça de greve dos caminhoneiros, que foram um esteio de sua campanha eleitoral; agiu de forma extremamente inábil, ao vetar publicamente o aumento, o que desmoralizou a diretoria da empresa e sua política de preços perante os seus investidores.

Ontem, ministros e técnicos do governo passaram o dia discutindo como consertar o estrago, enquanto o mercado aguarda uma decisão sobre o preço do diesel, que deve ser anunciada, hoje, em reunião com o próprio presidente Jair Bolsonaro. A política de concessões do governo Bolsonaro é seu ponto mais forte, administrativamente, mas está batendo no teto, enquanto o programa de concessões e os leilões de petróleo vão muito bem, obrigado. O problema são as privatizações, que estão estagnadas. Os militares ocuparam as empresas estatais e consideram muitas delas estratégicas para o desenvolvimento nacional.

Entrevista / Cesar Maia: Bolsonaro é a velha direita e merece nota 6 até agora

Ex-prefeito do Rio e pai de Rodrigo Maia espera que investigação de caixa 2 contra eles seja arquivada

Catia Seabra / Folha de S. Paulo

RIO DE JANEIRO - O ex-prefeito do Rio de Janeiro e hoje vereador, Cesar Maia (DEM), dá nota seis —ou seis e meio— para os cem primeiros dias de governo de Jair Bolsonaro (PSL).

Na entrevista à Folha, concedida neste domingo (14), ele também chama o presidente de líder sindical e representante da velha direita.

Pai do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o ex-prefeito do Rio critica a articulação política de Bolsonaro. Para ele, é uma confusão. Cesar também questionou a capacidade do presidente de escalação de ministros. "Qual é a informação que Bolsonaro acumulou para fazer as escolhas certas?"

Na semana passada, a Procuradoria-geral da República remeteu ao STF (Supremo Tribunal Federal) pedido de prorrogação do inquérito sobre Cesar Maia e seu filho. Perícia da PF encontrou, no sistema da Odebrecht, registro de pagamento de R$ 1,5 milhão aos dois.

• Na semana passada, foi remetido ao Supremo um relatório de janeiro da Polícia Federal indicando repasses da Odebrecht para o sr e seu filho. Acha que é retaliação?

São procedimentos. A gente sabia desses prazos. Ficávamos torcendo para a [Raquel] Dodge —ou, agora, o [Edson] Fachin— entender que aquilo era uma porcariazinha de caixa dois. Aí, não encaminha para frente e arquiva. Vários foram arquivados assim, né? A gente estava com expectativa de arquivamento. Mas tinha que acontecer.

• Foi prorrogada a investigação. Mas o senhor tinha a expectativa que fosse arquivado.

Todo réu em potencial acha que vai ser arquivado. Primeiro eu já não era prefeito. Eles falam 2008, 2010 e 2014. Um deles era meu último ano de governo e eles acusam meu chefe de gabinete de ter pedido dinheiro para a campanha da Solange Amaral. Eu nem sabia. Até porque eles eram proibidos por mim e por lei. Quem está no governo não pode fazer campanha eleitoral. Eles falam que teria sido feito pedido a Odebrecht para ajudar, por caixa dois, a campanha de senador. Eu era candidato porque o partido me pedia. Não tratava de captação de recursos.

• Como o sr avalia articulação do governo Bolsonaro?

Parece que está começando agora. O Bolsonaro disse que a aprovação da reforma era coisa do Congresso. Mas passou. É um projeto de lei dele e o Poder Executivo tem que capitanear, articular.

• O presidente finalmente está assumindo a responsabilidade?

Obrigatoriamente. Como o Rodrigo disse, a responsabilidade é dele. E ele vai ter que chamar os líderes para conversar. Perderam prazos, perderam tempo. Uma coisa que já deveria ter sido votada pela CCJ vai ser votada na semana que vem, se for.

• A intenção era votar antes da Páscoa. Mas o Rodrigo Maia definiu que, nesta semana, terá o Orçamento impositivo…

Os jornais publicaram um estudo da relação de poder entre Legislativo e Executivo. O Brasil era o segundo onde o Executivo tinha mais poder sobre o Legislativo em uma lista de, sei lá, 30 países. O caso do Brasil era um caso de 91%, um número desses. O que está acontecendo e vai acontecer —e seria inevitável, fosse o Bolsonaro, fosse quem fosse— é que o Legislativo vai dizer "nesse número não pode ficar. Vamos reduzir para 70%". Uma primeira medida é o Orçamento impositivo.

• Mas teve um mal-estar porque o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), disse ter acertado com o Rodrigo que a Previdência seria antes.

O Onyx não é exatamente um articulador. Era um deputado nosso, do PFL. Representava a indústria de armas do Rio Grande do Sul. E teve uma bobeira ali em que os procuradores apresentam as leis de anticorrupção. Ninguém sabe por que o Onyx foi nomeado relator. Uma vez relator, ele resolveu ser o representante dos procuradores. Nem no Supremo passava aquele relatório dele… O Legislativo, não é o Rodrigo, é qualquer que estivesse ali, tem que pensar que outras medidas precisa tomar de maneira a reduzir a disparidade de poder entre Executivo e Legislativo. Só no Brasil, um país democrático, se tem esses instrumentos. Esses vão ser rediscutidos.

Bolsonaro precisa ter agenda para DEM ser governo, diz Maia

Por Carolina Freitas, Hugo Passarelli e André Guilherme Vieira | Valor Econômico

SÃO PAULO - O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), adotou ontem um discurso de otimismo em relação à aprovação da reforma da Previdência, mas marcou posição política e afirmou que para o DEM fazer oficialmente parte do governo de Jair Bolsonaro o presidente precisa definir uma agenda de políticas públicas para além da pauta econômica.

"Meu partido não está no governo. Para estar, a gente precisa compreender o que o governo pensa em outras políticas públicas, além da economia", afirmou Maia, ao participar de evento promovido pelas revistas "Veja" e "Exame", em São Paulo. "Se for para ter um comprometimento só com agenda econômica, fazemos um acordo de pauta."

Maia tentou contemporizar a polêmica da semana passada, com a sinalização de intervencionismo de Bolsonaro na política de preços da Petrobrás. O parlamentar disse ver 15 de julho como data limite para aprovação da reforma da Previdência na Câmara.

O DEM tem três ministérios: Casa Civil, com Onyx Lorenzoni; Saúde, com Luiz Mandetta; e Agricultura, com Tereza Cristina. Maia disse que Onyx foi uma escolha pessoal de Bolsonaro e que Mandetta e Tereza, "são dois dos melhores quadros de seus setores". "O partido não sentou com o governo para discutir a agenda do governo para que a gente possa ser a favor. A gente não pode ser a favor de dois políticos estarem no governo. Isso não é agenda de acordos entre um partido e o presidente", disse o deputado.

CCJ aprova Orçamento impositivo e fala em tirar trechos da Previdência

Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico

BRASÍLIA - A Câmara impôs ontem uma nova derrota ao governo Jair Bolsonaro ao aprovar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em votação simbólica, o relatório do líder da Maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), sobre a proposta de emenda constitucional (PEC) do Orçamento Impositivo. O governo não queria aprovar a PEC antes da reforma da Previdência.

A proposta do Orçamento Impositivo obriga o governo a executar todos os investimentos previstos e torna obrigatório o pagamento de emendas parlamentares de bancada. Na prática, a medida engessa as possibilidades do governo de executar a peça orçamentária e diminui a margem para remanejamentos. O texto já havia sido aprovado pela Câmara, mas como foi alterado no Senado, está sendo apreciado novamente pelos deputados. O texto segue agora para análise da comissão especial e precisará ser votada em dois turnos no plenário da Casa antes de ser promulgado. Após a votação, a reunião da CCJ foi encerrada.

A discussão da reforma da Previdência começará hoje e terminará só após o feriado da Páscoa.

A falta de articulação do governo se refletiu também no plenário da Câmara, com um número crescente de parlamentares "independentes" defendendo publicamente a exclusão de pontos da reforma da Previdência já na CCJ - o discurso da maioria dos líderes partidários e dos integrantes da comissão, duas semanas atrás, era de aprovar a proposta completa no colegiado, que só analisa se algum artigo contraria uma das cláusulas pétreas da Constituição. O exame de mérito da reforma será feito na comissão especial.

Líder do bloco da maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro afirmou que vê um movimento crescente para suprimir pontos da reforma, como a aplicação automática para os servidores dos Estados e municípios. "Eu advogava a tese de não tirar nada na CCJ, deixar para a comissão especial, mas têm muita gente defendendo isso", afirmou. O relator da reforma, Marcelo Freitas (PSL-MG), que é ligado ao governo, deu parecer pela admissibilidade total.

Bolsonaro interrompe política de aumento real do salário mínimo

Projeto com diretrizes para Orçamento ainda prevê rombo fiscal de R$ 124,1 bi

Bernardo Caram/ Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) propôs, nesta segunda-feira (15), que o Orçamento de 2020 preveja uma correção do salário mínimo apenas pela inflação.

Na prática, a medida interrompe uma política pública que permitiu 25 anos de ganhos reais aos trabalhadores.

O ganho real do salário mínimo foi implementado informalmente em 1994, por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), logo após a adoção do Plano Real. As gestões petistas oficializaram a medida.

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estabeleceu a fórmula de reajuste pela inflação medida pelo INPC mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes. Dilma Rousseff (PT) transformou a regra em lei.

Michel Temer (MDB), que governou durante a recessão, não mudou a legislação.

A proposta que traça as diretrizes para o Orçamento de 2019, enviada nesta segunda ao Congresso, estima que o piso de salários no Brasil será de R$ 1.040 a partir de janeiro de 2020. Isso representa correção de 4,2%, referente à previsão de variação da inflação.

É a primeira vez que o piso salarial fica acima de R$ 1.000. Hoje, o valor está em R$ 998.

Até o fim deste ano, o governo apresentará um projeto de lei definindo qual será a nova política de reajuste.

Sem política para salário mínimo, Bolsonaro se expõe a risco político

No Orçamento, valorização desde 1995 é a maior transformação sob a democracia

Gustavo Patu / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A cifra pode soar ridícula hoje, mas a busca por um salário mínimo equivalente a US$ 100 era uma importante bandeira política no início dos anos 1990, quando a superinflação tornava irrelevante o valor em moeda nacional.

Não foi por outro motivo que, ainda durante a euforia do Plano Real, o Congresso impôs ao governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, um brutal aumento do mínimo, de R$ 70 para R$ 100 --na época, o estreante real estava atrelado ao dólar.

Precipitava-se ali, também, o início do déficit da Previdência Social.

De lá para cá, o piso salarial teve seu poder de compra elevado em quase 160%, enquanto o Produto Interno Bruto, uma espécie de salário do país, cresceu cerca de metade disso. Os R$ 998 mensais de agora equivalem a US$ 258, mesmo em tempos de encarecimento da divisa americana.

Enquanto isso, a despesa com benefícios previdenciários, trabalhistas e assistenciais saltou da casa dos 5% para os 10% do PIB. Do ponto de vista orçamentário, a alta do mínimo foi a maior transformação desde o restabelecimento da democracia.

Única saída aceitável para o diesel é técnica: Editorial / O Globo

Inadmissível que a política de preços dos combustíveis não seja transparente e bem fundamentada

O desastrado telefonema dado pelo presidente Bolsonaro para a Petrobras, com a determinação de suspender um aumento já anunciado para o diesel, apanhou o ministro da Economia, Paulo Guedes, em viagem aos Estados Unidos, e surpreendeu os mercados. Efeito inevitável, o valor de Bolsa da Petrobras, calculado pela cotação de suas ações, caiu em um dia R$ 32 bilhões.

A gravidade da intervenção do presidente, em sentido oposto à linha liberal da política econômica do seu ministro da Economia, Paulo Guedes, e referendada por ele mesmo, degradou as expectativas dos agentes econômicos. Isso no momento em que analistas do mercado financeiro, segundo sondagem semanal do BC (Relatório Focus), reduzem pela sétima vez consecutiva as estimativas de crescimento da economia para este ano — de 1,97% para 1,95%. Enquanto esperam que a inflação (IPCA) suba de 3,90%, estimativa de uma semana atrás, para 4,06%, mais próxima do centro da meta para este ano, de 4,25%.

As implicações da iniciativa justificaram o agendamento da reunião, para ontem, do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco. O encontro antecedeu a um outro, marcado para hoje, com o presidente Bolsonaro, estando presente o ministro Paulo Guedes.

Bolsonaro e os caminhoneiros: Editorial / O Estado de S. Paulo

Na campanha eleitoral do ano passado, o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro manifestou apoio à greve dos caminhoneiros que emparedou o governo, fez a sociedade de refém e causou imensos prejuízos econômicos a todo o País. Agora na condição de presidente da República, Jair Bolsonaro continua a agir como se fosse representante dos interesses dessa categoria profissional, em detrimento dos interesses dos demais brasileiros. “O presidente está do nosso lado”, comemorou Wallace Landim, vulgo “Chorão”, líder dos caminhoneiros.

“Chorão” tem acesso direto ao gabinete do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e foi graças a esse trânsito que, na semana passada, fez chegar ao presidente Bolsonaro a ameaça de nova paralisação caso a Petrobrás consumasse o anunciado aumento de 5,7% no preço do óleo diesel. Como se sabe, no mesmo dia Bolsonaro telefonou para o presidente da Petrobrás e mandou suspender o reajuste.

O custo econômico da interferência do presidente da República na política de preços da Petrobrás já é conhecido - a empresa perdeu R$ 32 bilhões em valor de mercado em questão de horas. Para o País, contudo, o episódio, do ponto de vista político, pode representar um prejuízo ainda maior, pois ficou claro que Jair Bolsonaro ainda se vê e ainda é visto como deputado, e não como presidente. Ou seja, Bolsonaro se julga comprometido com sua base eleitoral, como se fosse apenas deputado, e não com os brasileiros em geral, como deveria fazer o presidente da República.

O desafio dos juros: Editorial / Folha de S. Paulo

Cadastro positivo não bastará para a redução substantiva das taxas bancárias

Com a gradual entrada em vigor da lei que ampliou o alcance do cadastro positivo, é grande a expectativa de que o custo do crédito, ainda escorchante no Brasil, venha a cair de forma mais consistente.

O instrumento funcionará como uma espécie de atestado de saúde financeira, facilmente acessível para a consulta dos potenciais ofertantes de crédito. Ficará disponível uma nota, obtida a partir de modelos que consideram todo o histórico de pagamentos.

Foram mantidas salvaguardas para a preservação da privacidade. Os dados mais amplos só poderão ser acessados com a permissão do consumidor; as entidades que elaboram as notas (os birôs de crédito, como Serasa e SPC) e as pessoas jurídicas que as consultam terão responsabilidade solidária no caso de dano para o avaliado.

A inclusão automática dos consumidores no cadastro ocorrerá em quatro meses, e as notas de crédito começarão a ser colocadas à disposição em 180 dias. Os birôs farão campanhas de esclarecimento.

O impacto do cadastro poderá ser grande. Até agora, na prática, apenas informações sobre maus pagadores era pública. Os que tinham bom histórico não conseguiam facilmente se valer disso.

Aposta redobrada no crédito com o novo cadastro positivo: Editorial / Valor Econômico

Demanda antiga, o cadastro positivo com adesão automática tornou-se realidade neste ano, acompanhada de eloquentes promessas de juros mais baixos e adequados aos bons pagadores, maior oferta de crédito, inclusive para quem até agora esteve à margem do sistema financeiro. Desde pelo menos o fim do século passado, pregava-se a importância do cadastro positivo, que retrata a assiduidade com que uma pessoa cumpre seus compromissos financeiros, do pagamento de uma conta de luz à quitação de um empréstimo, ao contrário do cadastro negativo, que registra quem deu calote.

O pleito passou a ser lei em 2011, mas, pela justificativa de proteger o consumidor, estabeleceu que as pessoas teriam que consentir formalmente em ter suas informações registradas nos bancos de dados. A adesão foi baixa. Nesses oito anos de existência, apenas 6 milhões de pessoas aderiram, em contraste com o cadastro negativo, que relaciona cerca de 60 milhões de nomes. Em consequência, os bancos continuaram argumentando a ausência de informação a respeito dos tomadores de crédito para cobrar os juros elevados de sempre.

Diante da ineficácia da regra antiga, o Banco Central e o mercado financeiro buscaram incorporar a adesão automática à legislação, que passou a incluir também os microempreendedores. O processo ainda levou tempo. O governo de Michel Temer fez uma Medida Provisória em 2016, que se tornou projeto de lei complementar no ano seguinte, para ser aprovado pelo Senado e Câmara dos Deputados somente neste ano e, finalmente, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no início deste mês. De acordo com a nova legislação, cada pessoa terá uma nota de crédito definida por sua assiduidade no pagamento de empréstimos bancários, cartão de crédito entre outras contas, e até de serviços públicos de fornecimento de água, luz e telefone. Quanto mais alto o escore, melhor pagador será o indivíduo, o que deverá ser levando em conta pela instituição financeira quando lhe conceder um empréstimo.

Vinicius de Moraes: Soneto do amigo

Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

Maria Rita: Do fundo do nosso quintal