quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Bancos estatais seguram o crédito

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Qualidade do endividamento da pessoa física piora, "spread" sobe ainda mais e bancos privados batem em retirada

O AUMENTO dos recursos emprestados à praça em dezembro foi quase todo devido à atuação dos bancos estatais. O custo de captação de dinheiro pelos bancos, na média, foi menor do que antes da explosão da crise, em agosto, mas os juros continuam a subir. Entre as pessoas físicas, aumentou o endividamento em linhas de crédito de custo catastrófico, como é o caso do cheque especial e o da rolagem de dívidas no cartão de crédito.

É o que se depreende dos dados divulgados ontem pelo Banco Central sobre as operações de crédito do setor financeiro. O panorama do crédito em dezembro, em quase toda parte, é ruim, embora a atuação dos bancos públicos possa não ser tão arriscada e/ou danosa quanto os mercadistas mais afoitos apregoam.

O estoque de crédito para as pessoas jurídicas, o total de dinheiro emprestado e ainda por pagar, cresceu pouco em dezembro. Foi o menor incremento do ano, desconsiderados os habitualmente mais fracos janeiro e fevereiro. E cerca de 77,5% do incremento do estoque de novembro para dezembro caiu na conta do setor financeiro público. Na média do ano "pré-crise", até setembro, o aumento médio mensal do estoque de crédito na conta do setor público era de 33,5%. O setor financeiro privado se retraiu demais.

A taxa média de juros para as pessoas físicas caiu de 58,2% ao ano para 58%. Pífio. Mas o "spread" cresceu. Desde agosto, os bancos pagam 1,6 ponto percentual a menos pelo dinheiro que emprestam à pessoa física. Mas a taxa que cobram subiu 5,9 pontos percentuais. Como os impostos não aumentaram e como o compulsório diminuiu, os bancos estão antecipando enorme inadimplência, que é a justificativa restante para o aumento do "spread". A ver.

O total de novos empréstimos concedidos às pessoas físicas cresceu R$ 3,8 bilhões -mas havia caído R$ 5,8 bilhões em outubro e novembro. A parcela de novos empréstimos nas linhas de cheque especial e cartão de crédito subiu para 68% do total de novas concessões de financiamentos -era de 62% em agosto. A fatia dos financiamentos para veículos caiu de 8,1% em agosto para 5,9% em dezembro. Caiu bem a qualidade do endividamento, pois.

A inadimplência subiu de fato entre pessoas físicas e, dadas as notícias sobre demissões, devem crescer mais. Mas entre as pessoas jurídicas tal indicador continua bem comportado. De certo modo, isso deveria atenuar, ao menos por ora, os temores quanto à atuação dos bancos públicos. A reação estereotipada diante da substituição do crédito dos bancos privados pelo oferecido pelos estatais em geral limita-se a observar que, sob pressão do governo, estatais podem fazer empréstimos ruins e que a conta acabe no Tesouro, em suma, dos contribuintes. Porém um exagero contracionista dos bancos privados pode provocar também danos generalizados.

O problema aí é dosar o contrapeso estatal. De resto, o BC pode checar a qualidade do crédito dos estatais. Enfim, não há como evitar a queda do crescimento; mas não se pode deixar a inércia do medo carregar o país para um resultado do PIB ruim demais. Saber a dose certa é que é dose. Mas deixar tudo na mão do mercado pode ser tão ruim quanto confiar no governo.

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