quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Medidas anticíclicas

Antonio Corrêa de Lacerda
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O desempenho da economia brasileira deste e dos próximos anos, com um cenário internacional adverso, dependerá cada vez mais do papel das políticas econômicas domésticas. Reorientar o foco das políticas econômicas para combater os efeitos da crise deve ser a prioridade. O Produto Interno Bruto (PIB) global não deverá crescer este ano. No entanto, os países em desenvolvimento, em especial as grandes economias, poderão fomentar o mercado doméstico como fator de estímulo do seu crescimento.

Para o Brasil, especialmente, o fato de a exportação representar um baixo coeficiente de exportações em proporção do produto, relativamente a outros países em desenvolvimento, representa uma vantagem num cenário de contração de quantidades e preços no mercado global. No entanto, aproveitar o potencial do mercado doméstico como fator de compensação da contração da demanda internacional requer uma mudança de foco das políticas macroeconômicas.

É preciso rever os objetivos e as prioridades da política econômica, que na crise tem de ser usada para reverter os impactos sobre produção, investimentos, renda e emprego.

O Comitê de Política Monetária (Copom) “surpreendeu” a opinião pública, na semana passada, ao cortar de uma só vez em um ponto porcentual a taxa básica de juros (Selic), que agora está em 12,75%. Embora positiva para a economia, foi uma medida tardia. Na verdade, todos os que acompanham a realidade da economia brasileira sabiam que houve uma extraordinária reversão da atividade econômica a partir de outubro do ano passado.

O corte de um ponto porcentual deve ser encarado apenas como o início de um processo que deve rápida e substancialmente diminuir a taxa real de juros no Brasil, ainda excessivamente elevada para padrões internacionais. Nesse ponto, seria muito oportuna a realização de uma reunião extraordinária do Copom já no mês de fevereiro, antecipando a reunião ordinária prevista para março. A agilidade do aprofundamento dos efeitos da crise exige um monitoramento mais preciso e rápido pelas autoridades monetárias e a medida seria mais do que justificada.

Para além da questão dos juros básicos, há ainda muito por se fazer na redução dos spreads bancários, na expansão do crédito e financiamento e na ampliação e agilização dos investimentos públicos. Também é preciso aprimorar os instrumentos previstos no bojo da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), uma boa iniciativa lançada há cerca de um ano. Como o cenário econômico mudou muito de lá para cá, seria oportuno um aprofundamento das questões de competitividade sistêmica (tributação, financiamento, logística, burocracia, etc.) para estimular as atividades geradoras de valor agregado local. O objetivo deve ser o de preservar ao máximo o mercado doméstico, com estímulos ao emprego, à renda, ao financiamento e ao crédito.

O governo federal fez bem em garantir um aporte de R$ 100 bilhões para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A despeito de algumas críticas quanto ao custo fiscal da operação, a medida foi correta. É relativamente fácil calcular o custo da operação com base em indicadores correntes. O desafio é mensurar o custo representado pela carência de recursos para crédito e financiamento. Isso causaria a postergação e mesmo o cancelamento de projetos de investimentos, afetando o nível da produção e, portanto, o efeito sobre o quadro fiscal seria danoso, pela queda da arrecadação.

O mais sensato, portanto, é mesmo utilizar estímulos tributários e fiscais para fomentar a atividade econômica mesmo que isso represente uma “perda” de curto prazo para a arrecadação. O fundamental na definição das políticas macroeconômicas, especialmente em face do cenário de crise, é estabelecer prioridades e a principal delas é fazer com que o quadro recessivo da economia brasileira do quarto trimestre do ano passado e do primeiro deste ano seja revertido e transformado em desempenho positivo para garantir algum crescimento econômico ao longo de 2009.

*Antonio Corrêa de Lacerda, professor doutor da PUC-SP, doutor em economia pela Unicamp, economista-chefe da Siemens, é coautor, entre outros livros, de Economia Brasileira (Saraiva)

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