Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE
Ao leigo, relevam-se juízos ligeiros e apaixonados sobre complexas questões de direito civil, trabalhista, penal e internacional. Aos que se dedicam à ciência jurídica, e dela fazem profissão de fé, jamais. Cesare Battisti pertence à espécie daqueles que atraem a solidariedade do esquerdismo mais extremado, pois é um dos seus. Fosse alguém sem tumultuado passado político, teria permanecido no anonimato desde o instante em que se viu identificado e preso pela Polícia Federal, até o momento da devolução ao país de origem.
Afinal, quem é a lombrosiana figura que tantos cuidados desperta no governo petista? Como todos os brasileiros, tomei conhecimento daquilo que tem sido divulgado pela imprensa, ou está à nossa disposição na internet. Cesare Battisti nasceu em Sermoneta, pequena comunidade da região de Lazio, na Itália central, em 1954. Abandonou a escola em 1971 e, desde então, teria sido recolhido várias vezes, como ladrão e autor de outros delitos. Libertado em 1976, ingressou no grupo terrorista Proletários Armados do Comunismo (PAC), surgido das Brigadas Vermelhas. O termo armados desnuda a índole dos quadrilheiros.
Acusado da morte de quatro pessoas — Antonio Santoro, agente penitenciário; Pierluigi Torregiani, joalheiro; Livio Sabatini, açougueiro; e Andréa Campagna, policial —, a primeira assassinada em 1976 e as demais em 1979, Cesare Battisti foi condenado à prisão perpétua. Por ser fugitivo, o julgamento dos dois últimos crimes correu-lhe à revelia, recurso processual legítimo, adotado em nossa lei.
Durante os anos de fuga, o criminoso percorreu diversos países, para, afinal, refugiar-se no Brasil, até ser localizado e preso em 2007. Antecipando-se à decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o pedido de extradição formulado pela Itália, o ministro da Justiça, Tarso Genro, conferiu a Cesare Battisti o status de asilado político.
O que sei sobre o perigoso indivíduo é o que acabam de ler. Dois ângulos da polêmica questão, sinto-me apto a analisar, porque independem de consulta aos autos do processo, e envolvem fatos incontroversos. Um deles tem tudo a ver com nossa Constituição, que dedica à matéria os incisos LI e LII do art. 5º. O primeiro prescreve que não se extraditará brasileiro nato; o segundo veda a extradição de estrangeiro “por crime político ou de opinião”. Afastada por razoes óbvias a primeira hipótese, ao caso Batttisti não cabe o benefício da segunda.
Crimes políticos foram os que vitimaram o imperador Júlio César, em 44 a.C. e Aldo Moro, sequestrado e executado pelas Brigadas Vermelhas, em 1978. Qualificar como de cunho político a morte, a frio e a tiros, do agente penitenciário, do joalheiro, do açougueiro e do policial, significa rebaixar a dimensão da incomum figura delituosa, e usá-la como pretexto para acoitar perigoso facínora. Salvatore Giuliano, o bandido que aterrorizou a Sicília, teria sido criminoso político? A Máfia e a Camorra, quando trucidam juízes e policiais, por discordarem das condenações, cometem crimes políticos?
Em situações especialíssimas pode ocorrer certa dificuldade na distinção do crime político, do crime comum. Ambos, porém, pertencem ao submundo dos sequestros, do terror, dos explosivos, das armas de fogo. Qualquer que seja o perfil ideológico de quem analisa o caso, Cesare Battisti, matador de cidadãos de bem, não se encaixa na estreita moldura do criminoso político.
Teria sido vítima de erro judicial? Se disso é que se cogita, qual a competência do governo brasileiro para anular decisões do Poder Judiciário italiano? Estaria equiparando a Itália a regimes ditatoriais, que perseguem, prendem e calam os opositores? Do fascismo, aqui sobrevivente no corporativismo sindical, a Itália nada preserva. É exemplo de república democrática, onde reina a liberdade de opinião, vigora o princípio do devido processo legal e se assegura amplo direito de defesa aos acusados.
O Brasil é famoso pela impunidade. Réus confessos e condenados transitam pelas ruas, aterrorizando a população indefesa. Espero que ao governo não ocorra a idéia de garantir a liberdade de criminosos que nos procuram para se ocultar, como fez Cesare Battisti. Criminosos?
Bastam os nossos.
Ao leigo, relevam-se juízos ligeiros e apaixonados sobre complexas questões de direito civil, trabalhista, penal e internacional. Aos que se dedicam à ciência jurídica, e dela fazem profissão de fé, jamais. Cesare Battisti pertence à espécie daqueles que atraem a solidariedade do esquerdismo mais extremado, pois é um dos seus. Fosse alguém sem tumultuado passado político, teria permanecido no anonimato desde o instante em que se viu identificado e preso pela Polícia Federal, até o momento da devolução ao país de origem.
Afinal, quem é a lombrosiana figura que tantos cuidados desperta no governo petista? Como todos os brasileiros, tomei conhecimento daquilo que tem sido divulgado pela imprensa, ou está à nossa disposição na internet. Cesare Battisti nasceu em Sermoneta, pequena comunidade da região de Lazio, na Itália central, em 1954. Abandonou a escola em 1971 e, desde então, teria sido recolhido várias vezes, como ladrão e autor de outros delitos. Libertado em 1976, ingressou no grupo terrorista Proletários Armados do Comunismo (PAC), surgido das Brigadas Vermelhas. O termo armados desnuda a índole dos quadrilheiros.
Acusado da morte de quatro pessoas — Antonio Santoro, agente penitenciário; Pierluigi Torregiani, joalheiro; Livio Sabatini, açougueiro; e Andréa Campagna, policial —, a primeira assassinada em 1976 e as demais em 1979, Cesare Battisti foi condenado à prisão perpétua. Por ser fugitivo, o julgamento dos dois últimos crimes correu-lhe à revelia, recurso processual legítimo, adotado em nossa lei.
Durante os anos de fuga, o criminoso percorreu diversos países, para, afinal, refugiar-se no Brasil, até ser localizado e preso em 2007. Antecipando-se à decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o pedido de extradição formulado pela Itália, o ministro da Justiça, Tarso Genro, conferiu a Cesare Battisti o status de asilado político.
O que sei sobre o perigoso indivíduo é o que acabam de ler. Dois ângulos da polêmica questão, sinto-me apto a analisar, porque independem de consulta aos autos do processo, e envolvem fatos incontroversos. Um deles tem tudo a ver com nossa Constituição, que dedica à matéria os incisos LI e LII do art. 5º. O primeiro prescreve que não se extraditará brasileiro nato; o segundo veda a extradição de estrangeiro “por crime político ou de opinião”. Afastada por razoes óbvias a primeira hipótese, ao caso Batttisti não cabe o benefício da segunda.
Crimes políticos foram os que vitimaram o imperador Júlio César, em 44 a.C. e Aldo Moro, sequestrado e executado pelas Brigadas Vermelhas, em 1978. Qualificar como de cunho político a morte, a frio e a tiros, do agente penitenciário, do joalheiro, do açougueiro e do policial, significa rebaixar a dimensão da incomum figura delituosa, e usá-la como pretexto para acoitar perigoso facínora. Salvatore Giuliano, o bandido que aterrorizou a Sicília, teria sido criminoso político? A Máfia e a Camorra, quando trucidam juízes e policiais, por discordarem das condenações, cometem crimes políticos?
Em situações especialíssimas pode ocorrer certa dificuldade na distinção do crime político, do crime comum. Ambos, porém, pertencem ao submundo dos sequestros, do terror, dos explosivos, das armas de fogo. Qualquer que seja o perfil ideológico de quem analisa o caso, Cesare Battisti, matador de cidadãos de bem, não se encaixa na estreita moldura do criminoso político.
Teria sido vítima de erro judicial? Se disso é que se cogita, qual a competência do governo brasileiro para anular decisões do Poder Judiciário italiano? Estaria equiparando a Itália a regimes ditatoriais, que perseguem, prendem e calam os opositores? Do fascismo, aqui sobrevivente no corporativismo sindical, a Itália nada preserva. É exemplo de república democrática, onde reina a liberdade de opinião, vigora o princípio do devido processo legal e se assegura amplo direito de defesa aos acusados.
O Brasil é famoso pela impunidade. Réus confessos e condenados transitam pelas ruas, aterrorizando a população indefesa. Espero que ao governo não ocorra a idéia de garantir a liberdade de criminosos que nos procuram para se ocultar, como fez Cesare Battisti. Criminosos?
Bastam os nossos.
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