quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

O caso Battisti

Janio de Freitas
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O aumento da animosidade tem a ver com a má condução do caso, em relação ao governo da Itália, pelo governo do Brasil

O CASO DO italiano Cesare Battisti, entre o refúgio e a extradição, tomou a um só tempo o melhor e o pior caminhos. O governo, porém, vai mal nos dois.

A decisão do governo italiano de chamar a Roma o seu embaixador no Brasil, "para consultas" como consta no jargão diplomático, evidencia que a reação deixou de ser apenas palavrosa na Itália, ante o status de refugiado concedido a Battisti pelo governo brasileiro. É o governo Berlusconi que entra e assume o problema, em nome da contestada Justiça italiana que sentenciara Battisti à prisão perpétua, sob acusação de autoria e coautoria em quatro homicídios alegadamente políticos.

O aumento da animosidade tem a ver com a má condução do caso, em relação ao governo italiano, pelo governo brasileiro. Desde as primeiras reações pessoais de parlamentares e integrantes do governo em Roma, com farta repercussão na imprensa e TV, em vez de explicações e justificativas o governo brasileiro dirigiu-lhes poucas e impróprias palavras.

Sempre com base em duas ideias: a concessão de refúgio feita pelo ministro Tarso Genro "foi um ato legal" e "de soberania brasileira". Duas ideias básicas de um parecer do jurista Dalmo Dallari favorável ao pedido de Battisti e, tudo indica, bastante influente na concessão assinada pelo ministro da Justiça com a cobertura prévia de Lula.

A soberania do Brasil para decidir, entre o refúgio de Battisti e a extradição pedida pela Itália, tornou-se o argumento também de Lula, em suas referências públicas ao caso e na resposta à carta que lhe enviara o presidente italiano, Giorgio Napolitano: "Foi um ato de soberania do Estado Brasileiro", respondeu Lula.

Os ares de resposta altiva nem sequer fazem, no caso, uma resposta à reação italiana. Em nenhum momento a soberania brasileira foi posta em questão nas queixas italianas, fossem pessoais ou oficiais. Os italianos manifestam, desde o início, contrariedade ou inconformismo com a rejeição brasileira ao inquérito da polícia e do Ministério Público e à decisão da Justiça da Itália. Reação esperável e de compreensão sem maior dificuldade. Tanto que, aqui mesmo, a Procuradoria Geral da República e o Conare (Comitê Nacional para Refugiados) recomendaram ao ministro da Justiça a extradição, em concordância com o inquérito e a sentença judicial italiana.

Assim como a soberania não foi questionada, também não o foi o enquadramento legal da atitude de Tarso Genro. Nem ao menos para lembrar que um ato não é correto e bom só por refletir soberania e não ser ilegal. Os exemplos em contrário enchem a pequena e a grande histórias.

O primeiro-ministro Berlusconi e seu governo são destemperados o suficiente para tornar imprevisíveis os futuros lances do caso Battisti. O outro caminho tomado pelo problema oferece, no entanto, uma solução. Primeiro, por levar o caso para o conveniente julgamento coletivo do Supremo Tribunal Federal, entre refúgio e extradição. Além disso, porque a decisão do STF estará baseada em arrazoados que, se em maioria confirmarem o refúgio para Cesare Battisti, darão ao governo e aos queixosos italianos a resposta adequada que não receberam do governo brasileiro.

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