Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O presidente Luiz Inácio da Silva já deu a resposta às autoridades italianas que manifestaram intenção de pedir a ele que reveja a extradição de Cesare Battisti: é não.
Segundo ele, trata-se de uma questão de soberania nacional. Lula pede respeito à decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, em mais uma demonstração da sua (de ambos) capacidade de escrever errado por linhas tortas.
A soberania do Estado brasileiro não esteve em destaque quando os pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara deixaram a comitiva do Panamericano, no ano passado, em busca de asilo.
Ali se despacharam os esportistas para atender de pronto à ditadura amiga, desconsideraram-se as óbvias circunstâncias e montou-se uma ficção - com a gentil colaboração da miopia nacional - segundo a qual os atletas estavam desorientados, mas loucos para voltar a Havana. Onde os aguardavam as respectivas famílias, reféns do regime, e a interrupção das carreiras a título de punição exemplar.
Aqui, no caso do italiano, simplesmente se ignoraram as posições de instância consultiva do próprio Ministério da Justiça (o Conselho Nacional de Refugiados), do procurador-geral da República, do Itamaraty e se houve por bem interferir no processo judicial italiano.
O presidente da República põe a autonomia do Estado brasileiro na roda por causa de uma questão de cunho ideológico. Pede respeito à decisão de Tarso Genro, mas desrespeita as posições do procurador, do Conare e do Ministério das Relações Exteriores, quando menospreza o contraditório e diz que o ato foi uma “decisão do País”.
As instâncias contrárias, ao que se sabe, fazem parte do País. São todas constitucionalmente legítimas, não se pode acusá-las de intromissão indevida nem se deve deixar de considerar a hipótese de que tenham embasado suas posições no processo, na diplomacia, na legislação nacional e internacional e, sobretudo, no bom senso.
A extradição, portanto, não foi uma sentença decretada pelo “Brasil”. Foi uma atitude de caráter particular, produto de um modo de pensar. Respeitável, embora não representativo da soberania nacional, muito menos adequado do regime democrático, por autocrático.
A se aceitar a alegação do presidente, chega-se à conclusão de que o Ministério Público, a Chancelaria e o órgão auxiliar do Ministério da Justiça para assuntos afins não se aliam aos preceitos da autoridade moral do Brasil. E para raciocinar por hipótese, em situação de semelhante agressão à soberania estará o Supremo Tribunal Federal, se porventura vier a acatar o recurso do governo italiano.
Tal possibilidade, entretanto, por ora é mera suposição. De concreto, o que se tem é, de um lado, o peso de instituições abalizadas e desapaixonadas e, de outro, o presidente de novo exercendo o hábito de decidir de ouvido.
Segundo consta, Lula não sabia nada sobre o caso até o mês passado e foi convencido pelo ministro da Justiça e pelo jurista Dalmo de Abreu Dallari de que a extradição obedeceria à tradição brasileira.
Tal relato poderia não ser digno de confiança, mas não são boatos porque combinam perfeitamente com as declarações do presidente a respeito. De acordo com Lula, a decisão se justifica porque o “Brasil é um país generoso” e Cesare Battisti foi condenado “por um crime antigo”. Além disso, “passado tanto tempo ele é outra pessoa, é um escritor”.
Ademais, pondera, a França concedeu asilo a outro acusado “das mesmas coisas”.
O presidente Lula não tem, e expõe a evidência, nada mais que uma leve impressão sobre o assunto. Repete de forma superficial o que ouviu de um lado e se abstém de cotejar todas as informações ou ao menos de perguntar ao procurador-geral, ao ministro das Relações Exteriores a razão de seus votos contrários à extradição.
A intuição é um excelente atributo, o empirismo funciona, mas a ausência de conhecimento e de curiosidade em geral induz ao equívoco. Não necessariamente em relação ao conteúdo, mas no tocante à abordagem de um tema quando assume o caráter de polêmica.
É de se esperar que o presidente da República nessas ocasiões esteja preparado para debater em patamar mais elevado e condizente com a soberania nacional.
Quanto Pior
No discurso, o DEM e parte do PSDB apoiam a candidatura de José Sarney para a presidência do Senado por respeito ao princípio da proporcionalidade, já que o PMDB é a maior bancada da Casa.
À vera, porém, apoiam porque é o caminho mais curto para o atrito irremediável entre o PT e o PMDB. Experientes do tema, tucanos e ex-pefelistas, hoje democratas, sabem o custo presumido desse tipo de conflito.
Similar
Com o delegado Protógenes Queiroz na chefia de inquéritos, o advogado de defesa é quase um acessório dada sua inesgotável capacidade de abrir brechas para anulação de provas.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O presidente Luiz Inácio da Silva já deu a resposta às autoridades italianas que manifestaram intenção de pedir a ele que reveja a extradição de Cesare Battisti: é não.
Segundo ele, trata-se de uma questão de soberania nacional. Lula pede respeito à decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, em mais uma demonstração da sua (de ambos) capacidade de escrever errado por linhas tortas.
A soberania do Estado brasileiro não esteve em destaque quando os pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara deixaram a comitiva do Panamericano, no ano passado, em busca de asilo.
Ali se despacharam os esportistas para atender de pronto à ditadura amiga, desconsideraram-se as óbvias circunstâncias e montou-se uma ficção - com a gentil colaboração da miopia nacional - segundo a qual os atletas estavam desorientados, mas loucos para voltar a Havana. Onde os aguardavam as respectivas famílias, reféns do regime, e a interrupção das carreiras a título de punição exemplar.
Aqui, no caso do italiano, simplesmente se ignoraram as posições de instância consultiva do próprio Ministério da Justiça (o Conselho Nacional de Refugiados), do procurador-geral da República, do Itamaraty e se houve por bem interferir no processo judicial italiano.
O presidente da República põe a autonomia do Estado brasileiro na roda por causa de uma questão de cunho ideológico. Pede respeito à decisão de Tarso Genro, mas desrespeita as posições do procurador, do Conare e do Ministério das Relações Exteriores, quando menospreza o contraditório e diz que o ato foi uma “decisão do País”.
As instâncias contrárias, ao que se sabe, fazem parte do País. São todas constitucionalmente legítimas, não se pode acusá-las de intromissão indevida nem se deve deixar de considerar a hipótese de que tenham embasado suas posições no processo, na diplomacia, na legislação nacional e internacional e, sobretudo, no bom senso.
A extradição, portanto, não foi uma sentença decretada pelo “Brasil”. Foi uma atitude de caráter particular, produto de um modo de pensar. Respeitável, embora não representativo da soberania nacional, muito menos adequado do regime democrático, por autocrático.
A se aceitar a alegação do presidente, chega-se à conclusão de que o Ministério Público, a Chancelaria e o órgão auxiliar do Ministério da Justiça para assuntos afins não se aliam aos preceitos da autoridade moral do Brasil. E para raciocinar por hipótese, em situação de semelhante agressão à soberania estará o Supremo Tribunal Federal, se porventura vier a acatar o recurso do governo italiano.
Tal possibilidade, entretanto, por ora é mera suposição. De concreto, o que se tem é, de um lado, o peso de instituições abalizadas e desapaixonadas e, de outro, o presidente de novo exercendo o hábito de decidir de ouvido.
Segundo consta, Lula não sabia nada sobre o caso até o mês passado e foi convencido pelo ministro da Justiça e pelo jurista Dalmo de Abreu Dallari de que a extradição obedeceria à tradição brasileira.
Tal relato poderia não ser digno de confiança, mas não são boatos porque combinam perfeitamente com as declarações do presidente a respeito. De acordo com Lula, a decisão se justifica porque o “Brasil é um país generoso” e Cesare Battisti foi condenado “por um crime antigo”. Além disso, “passado tanto tempo ele é outra pessoa, é um escritor”.
Ademais, pondera, a França concedeu asilo a outro acusado “das mesmas coisas”.
O presidente Lula não tem, e expõe a evidência, nada mais que uma leve impressão sobre o assunto. Repete de forma superficial o que ouviu de um lado e se abstém de cotejar todas as informações ou ao menos de perguntar ao procurador-geral, ao ministro das Relações Exteriores a razão de seus votos contrários à extradição.
A intuição é um excelente atributo, o empirismo funciona, mas a ausência de conhecimento e de curiosidade em geral induz ao equívoco. Não necessariamente em relação ao conteúdo, mas no tocante à abordagem de um tema quando assume o caráter de polêmica.
É de se esperar que o presidente da República nessas ocasiões esteja preparado para debater em patamar mais elevado e condizente com a soberania nacional.
Quanto Pior
No discurso, o DEM e parte do PSDB apoiam a candidatura de José Sarney para a presidência do Senado por respeito ao princípio da proporcionalidade, já que o PMDB é a maior bancada da Casa.
À vera, porém, apoiam porque é o caminho mais curto para o atrito irremediável entre o PT e o PMDB. Experientes do tema, tucanos e ex-pefelistas, hoje democratas, sabem o custo presumido desse tipo de conflito.
Similar
Com o delegado Protógenes Queiroz na chefia de inquéritos, o advogado de defesa é quase um acessório dada sua inesgotável capacidade de abrir brechas para anulação de provas.
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