EDITORIAL
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Em dezembro de 2007, a maioria dos eleitores venezuelanos infligiu ao coronel Hugo Chávez sua maior derrota política, rejeitando em referendo o projeto de uma constituição que, além de institucionalizar o “socialismo do século 21”, permitia ao caudilho transformar-se em ditador vitalício. Chávez nunca se conformou com a derrota. No dia 30 de novembro do ano passado, determinou aos deputados do Partido Socialista Unido da Venezuela que iniciassem a tramitação, na Assembleia Nacional, de uma emenda constitucional que permitisse a reeleição indefinida do presidente da República.
Hugo Chávez tinha pressa. Determinou que o projeto devia estar pronto em dezembro, aprovado pela Assembleia em janeiro e referendado em fevereiro. As duas primeiras etapas do plano continuísta foram cumpridas a tempo e a hora. Nessa quarta-feira, a Assembleia concluiu a votação em segundo turno, promulgou a emenda e remeteu-a ao Conselho Nacional Eleitoral, para que convoque o referendo para o dia 15 de fevereiro. Isso foi possível porque a Assembleia Nacional é controlada por Chávez. Dos 167 deputados, 6 votaram contra o projeto e 5 se abstiveram.
O caudilho tem motivos para tanta pressa. Seus índices de popularidade são altos - em torno de 60% -, mas os índices de aprovação de seu governo, caracterizado pelo descalabro administrativo e pelo descontrole financeiro, estão em franco declínio. Enquanto estava alto o preço do petróleo - produto responsável por quase 70% das receitas do país - era possível mascarar as deficiências do governo. Mas agora, com o petróleo valendo pouco mais da metade do necessário para cobrir as extravagâncias orçamentárias de Chávez, os problemas adquirem a sua exata dimensão - e o desemprego, a inflação e a escassez de produtos essenciais são fatores de crescente desprestígio do regime bolivariano, que se acrescentam ao descontentamento causado pelas restrições cada vez maiores das liberdades civis.
O caudilho trata de impregnar todos os aspectos da vida venezuelana com a abstrusa ideologia do socialismo bolivariano, mas ele mesmo é, antes de tudo, um pragmático. Sabe que seu projeto político não resistirá a uma prolongada crise econômica e social e por isso adota estratégias de sobrevivência.
Até meados do ano passado, desenvolveu um amplo programa de estatização das principais atividades produtivas. Nacionalizou, por exemplo, as operações petrolíferas da faixa do Orenoco, deixando as empresas privadas que trabalhavam na área com participações minoritárias - oneradas, além disso, por pesados impostos e royalties - e passando o seu controle para a estatal PDVSA. A PDVSA, por sua vez, foi transformada numa enorme holding - que controla supermercados, fábricas de cimento, estaleiros e empresas de construção civil - que também financia os projetos sociais e as aventuras da política externa bolivariana. O resultado disso foi a queda da produção de petróleo: quando Chávez assumiu o poder, há dez anos, o país produzia 3,4 milhões de barris/dia; hoje, produz 2,3 milhões.
No plano político, Chávez descobriu nos últimos tempos que não é imbatível nas urnas. Perdeu o referendo de dezembro de 2007 e, nas eleições regionais do ano passado, a oposição elegeu os governadores dos Estados e das cidades mais ricas do país.
Da soma de todos esses fatores resultou a pressa de Chávez. Acredita que, quanto mais cedo submeter a emenda da presidência vitalícia a referendo, maiores serão suas chances de vitória. Recusa-se a entender a mensagem clara e explícita das duas últimas eleições: os venezuelanos não querem apeá-lo do poder antes do término de seu mandato, mas não admitem que ele se perenize no Palácio Miraflores.
Para a realização de seu projeto, Chávez conta com o apoio entusiasmado do presidente Lula - que diz não querer para si um terceiro mandato, mas encontra justificativas ridículas para a reeleição indefinida do caudilho. Nos últimos dias, Lula travestiu-se de cabo eleitoral dos caciques bolivarianos. Foi à Bolívia dar um alento à campanha de Evo Morales para aprovar a sua constituição. E completou o giro na Venezuela, onde declarou que “Chávez é jovem e aguenta um novo mandato”.
Não é o que os venezuelanos pensam. As últimas pesquisas mostram que 56,8% dos entrevistados não querem Chávez no poder depois de 2013.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Em dezembro de 2007, a maioria dos eleitores venezuelanos infligiu ao coronel Hugo Chávez sua maior derrota política, rejeitando em referendo o projeto de uma constituição que, além de institucionalizar o “socialismo do século 21”, permitia ao caudilho transformar-se em ditador vitalício. Chávez nunca se conformou com a derrota. No dia 30 de novembro do ano passado, determinou aos deputados do Partido Socialista Unido da Venezuela que iniciassem a tramitação, na Assembleia Nacional, de uma emenda constitucional que permitisse a reeleição indefinida do presidente da República.
Hugo Chávez tinha pressa. Determinou que o projeto devia estar pronto em dezembro, aprovado pela Assembleia em janeiro e referendado em fevereiro. As duas primeiras etapas do plano continuísta foram cumpridas a tempo e a hora. Nessa quarta-feira, a Assembleia concluiu a votação em segundo turno, promulgou a emenda e remeteu-a ao Conselho Nacional Eleitoral, para que convoque o referendo para o dia 15 de fevereiro. Isso foi possível porque a Assembleia Nacional é controlada por Chávez. Dos 167 deputados, 6 votaram contra o projeto e 5 se abstiveram.
O caudilho tem motivos para tanta pressa. Seus índices de popularidade são altos - em torno de 60% -, mas os índices de aprovação de seu governo, caracterizado pelo descalabro administrativo e pelo descontrole financeiro, estão em franco declínio. Enquanto estava alto o preço do petróleo - produto responsável por quase 70% das receitas do país - era possível mascarar as deficiências do governo. Mas agora, com o petróleo valendo pouco mais da metade do necessário para cobrir as extravagâncias orçamentárias de Chávez, os problemas adquirem a sua exata dimensão - e o desemprego, a inflação e a escassez de produtos essenciais são fatores de crescente desprestígio do regime bolivariano, que se acrescentam ao descontentamento causado pelas restrições cada vez maiores das liberdades civis.
O caudilho trata de impregnar todos os aspectos da vida venezuelana com a abstrusa ideologia do socialismo bolivariano, mas ele mesmo é, antes de tudo, um pragmático. Sabe que seu projeto político não resistirá a uma prolongada crise econômica e social e por isso adota estratégias de sobrevivência.
Até meados do ano passado, desenvolveu um amplo programa de estatização das principais atividades produtivas. Nacionalizou, por exemplo, as operações petrolíferas da faixa do Orenoco, deixando as empresas privadas que trabalhavam na área com participações minoritárias - oneradas, além disso, por pesados impostos e royalties - e passando o seu controle para a estatal PDVSA. A PDVSA, por sua vez, foi transformada numa enorme holding - que controla supermercados, fábricas de cimento, estaleiros e empresas de construção civil - que também financia os projetos sociais e as aventuras da política externa bolivariana. O resultado disso foi a queda da produção de petróleo: quando Chávez assumiu o poder, há dez anos, o país produzia 3,4 milhões de barris/dia; hoje, produz 2,3 milhões.
No plano político, Chávez descobriu nos últimos tempos que não é imbatível nas urnas. Perdeu o referendo de dezembro de 2007 e, nas eleições regionais do ano passado, a oposição elegeu os governadores dos Estados e das cidades mais ricas do país.
Da soma de todos esses fatores resultou a pressa de Chávez. Acredita que, quanto mais cedo submeter a emenda da presidência vitalícia a referendo, maiores serão suas chances de vitória. Recusa-se a entender a mensagem clara e explícita das duas últimas eleições: os venezuelanos não querem apeá-lo do poder antes do término de seu mandato, mas não admitem que ele se perenize no Palácio Miraflores.
Para a realização de seu projeto, Chávez conta com o apoio entusiasmado do presidente Lula - que diz não querer para si um terceiro mandato, mas encontra justificativas ridículas para a reeleição indefinida do caudilho. Nos últimos dias, Lula travestiu-se de cabo eleitoral dos caciques bolivarianos. Foi à Bolívia dar um alento à campanha de Evo Morales para aprovar a sua constituição. E completou o giro na Venezuela, onde declarou que “Chávez é jovem e aguenta um novo mandato”.
Não é o que os venezuelanos pensam. As últimas pesquisas mostram que 56,8% dos entrevistados não querem Chávez no poder depois de 2013.
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