sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

O mingau das siglas

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL

Não se pode esperar propriamente a inauguração de uma nova etapa na vida do país com a arrancada para este ano decisivo da consolidação ou do naufrágio de projetos de candidaturas que não vingarem, empacados no pau-de-sebo das pesquisas. Mas, seja para os diretamente envolvidos na contradança ou para quem prefere espiar o bailarico da arquibancada ou em pé, na geral, a montagem do espetáculo merece a atenção da platéia pela singularidade dos perfis dos principais atores e o leque de alternativas que terão que ser decifradas nos próximos seis meses.

O maior líder popular da história deste país e do mundo, sem qualquer e descabida intenção maliciosa, vive a sua glória com o ego na lua da virtual unanimidade da aprovação nacional. Não tem mais degrau na escada com a aprovação de 80%. Se chegar a 90%, o risco de queda tira a suprema graça do desfrute de um momento mágico. Mas, Lula parte com temerário projeto de candidata e um partido às suas ordens, mas de duvidosa utilidade eleitoral.

A candidatura da ministra Dilma Rousseff está sendo montada, peça por peça, com a ajuda de especialistas e o bom senso de quem aprendeu ganhando e perdendo eleições e uma incógnita que só os próximos seis meses ajudarão a decifrar. Com as suas singularidades, trata-se de uma experiência inédita. Candidata de proveta, que nunca viu um voto, jamais disputou uma eleição, saltar da cadeira de chefe da Casa Civil para a poltrona presidencial é um desafio que o presidente Lula terá que enfrentar, com um dos olhos nas pesquisas e outro nas saídas de emergência.

A candidata merece que lhe façam a justiça de reconhecer a sua dedicação e empenho em construir a imagem de candidata, passando a borracha nas contradições da sua biografia. Para a clássica restrição da arrogância, a picada da mosca azul foi uma beberagem de resultado milagroso. Dona Dilma já não sabe o que faça depois da plástica facial, do regime de emagrecimento, da troca dos óculos, da reforma dos terninhos que lembravam uniforme e do humor. Dona Dilma não nega cumprimento nem a desconhecidos.

Cada nova pesquisa dará os percentuais do seu sucesso ou soará a sirene de advertência. A esta altura do caminho sem volta, qualquer sinal de desâ- nimo seria um desastre. E Lula não tem onde buscar socorro. O PT purga a sofreguidão do deslumbramento com o poder, depois de três derrotas. Foi à fonte com a goela seca e a ansiedade que pisoteou anos de coerentes compromissos éticos. Virou um balcão de empregos e sinecuras.

A distância que o separa de Lula pode ser avaliada pelo absoluto e objetivo desinteresse do presidente pelas pretensões de aspirantes petistas. Entre os aliados não há grande esperança de solução.

O mais poderoso dos parceiros, o PMDB, que já foi do visionário doutor Ulysses Guimarães e hoje segue o deputado Michael Temer, é o retrato fiel da sigla que baixou as suas ambições à objetividade do toma-lá-dá-cá. Uma gerência comercial: ajustado o preço, entrega a mercadoria do apoio parlamentar com a exigência do pagamento à vista. Se o respeitável público não se interessar pelo espetáculo, a campanha poderá dar cambalhotas até o meio do ano.

E, dependendo do bom-senso, da competência e da maturidade das lideranças dos tucanos e do DEM, a oposição poderá ter a sua oportunidade de disputar a vaga de Lula desde que os dois candidatos ­ governadores José Serra, de São Paulo e Aécio Neves, de Minas ­ componham uma chapa, com candidato a presidente e a vice.

A ministra-candidata, Dilma Rousseff, tem as obras do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, para puxar voto. E à oposição falta o líder que articule a chapa de entendimento, na conversa ou no voto da convenção partidária.

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