sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Quase-oráculos e previsões para 2009

Zander Navarro[1]
DEU NA GAZETA MERCANTIL

Fim de ano, é hora de ler o futuro, assim sugere a tradição. É exercício que motiva inúmeros quase-oráculos e produz erros memoráveis, mesmo quando fundado na boa ciência. E, se sustentado nas “ciências do espírito”, como chamava Weber, o campo dos equívocos se amplia, pois a história já nos ensinou que nada é mais temerário do que prever comportamentos sociais. Sobretudo se debruçarmos sobre futuras operações políticas e o país for o Brasil.

Os registros sobre o desenvolvimento político em nosso país têm a marca da surpresa permanente, o que dificulta a refinada aplicação dos conceitos analíticos com alto grau de probabilidade de acerto. Fazer previsões neste campo sequer deveria ser cogitado. Mas é fim de ano, a tentação é irresistível e, quem sabe, possamos arriscar previsões mais fáceis e fazer uma aposta, esta sim, mais audaciosa, embora parecendo já habitar o imaginário da nação.

O que marcará o ano que vem? Primeiramente, não há como desconhecer o que vai se tornando acaciano. Em um plano mais geral, estaremos todo o tempo discutindo os impactos da monumental crise econômica que vai solapando as economias mundiais, algumas antes saudadas como verdadeiras novas fortalezas do capitalismo mundial, entre as quais o Brasil. Não me arrisco a detalhes, porque é seara dos especialistas que abrilhantam outras páginas do jornal, mas é certo que a economia vem adentrando um período de esfriamento, e as dolorosas conseqüências logo despontarão. Desta forma, a outra previsão nos leva ao campo político, porque a partir de algum momento, quiçá em meados do ano, os debates iluminarão apenas um tema: a sucessão presidencial. São duas visões futuras, portanto, fáceis de apontar. E a aposta?


Esta é mais arriscada e nasce de um, até agora, enigma: por quê Lula insiste em ungir Dilma Rousseff como a sucessora? Parece um mistério porque, uma vez sob os holofotes da campanha, sua fragilidade, naquela condição, será por demais evidente. É personagem pública, mas anódina e sem nenhum lastro eleitoral, dedicada, desde sempre, apenas ao jogo intramuros da política e ao exercício de funções coadjuvantes, ainda que evidenciando inegável competência técnica.


Soube ler os tempos e abandonar as fantasias brizolistas, buscando as águas mais promissoras do PT. Conseguiu se destacar como secretária em meio a um dos mais desastrosos governos estaduais do Rio Grande do Sul. Por isto, seu capital político se ampliou, pois logo convocada a Brasília. Com este histórico, chegar ao papel de “gerente principal” foi apenas uma questão de tempo. Mas assumir o comando de uma campanha eleitoral nacional, com um provável candidato de oposição forte, é tarefa para a qual a selecionada, definitivamente, não ostenta os trunfos necessários.


Assim, enquanto não surgir melhor explicação, a escolha de Lula tem somente uma justificativa: se o milagre ocorrer, Dilma assumirá por apenas um mandato, pois, sem carisma ou luz própria, administrará sem brilho político as coisas do governo. Se não for a preferida dos eleitores, paciência, Lula terá feito de tudo para elegê-la e sua popularidade não será arranhada. Durante três anos pontificará como a éminence grise da vida política e, então, candidato novamente, retornará, quem sabe facilmente, em 2014.


Terá então 69 anos, mas talvez ainda esbanjando saúde para administrar dois outros mandatos. Se esta aposta vingar, Lula quase se igualará a Getúlio Vargas em sua longevidade no poder e, se o seu segundo período for satisfatório, poderá entrar para história como o maior presidente brasileiro de todos os tempos. Maquiavel não faria melhor.

[1] Sociólogo, professor da UFRGS (Porto Alegre) e pesquisador visitante no Instituto de Estudos sobre o Desenvolvimento (IDS, Inglaterra)





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