terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Meio cheio, meio vazio, quase vazio

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Primeiros dados da economia em janeiro indicam que do chão não se passou, mas há problema novo em gestação

DO CHÃO NÃO se passa, diz o provérbio que procura animar quem se arrisca a tomar tombos.

No mês passado, as montadoras não desceram abaixo das profundezas de dezembro, mas as fábricas de veículos, que vinham crescendo mais de 20% ao ano, agora encolhem mais ou menos na mesma proporção. O Banco Central antecipou ontem uma estatística sobre o crédito, com dados coletados até a metade de janeiro. O total de novos financiamentos teria crescido em janeiro (soma de pessoas físicas e jurídicas). Mas os números são um tanto contraditórios e/ou confusos.

No caso das empresas, o total de dinheiro novo emprestado em janeiro voltou a cair em relação a dezembro, ficando quase no mesmo nível de setembro, mês da explosão final da crise americana. No caso das pessoas físicas, teria havido crescimento em relação a dezembro, se considerados os dados oficiais para este mês. Pelos dados divulgados ontem pelo BC, que aparentemente alteram os números oficiais de dezembro, não teria havido avanço.

Não dá para dizer que se chegou ao fundo do poço, nem dá para desdenhar. Após a sufocação de crédito doméstico no final de 2008, trata-se de um alívio. Além do mais, com a oferta de crédito do BC para que as empresas paguem suas dívidas externas, a situação pode melhorar mais um tico em fevereiro.

Um tanto inquietante é que os bancos públicos sirvam de rede de proteção creditícia. De setembro a dezembro, o volume de dinheiro novo emprestado pelos bancos privados nacionais cresceu 2,49%. Nos bancos públicos, 12,92%. Nos privados estrangeiros, 4,56%. De junho a setembro, essas taxas eram 8,83% (privados nacionais), 6,85% (públicos), 7,88% (privados estrangeiros). Isto é, os bancos públicos mantiveram a peteca do crédito no ar.

Dada a seca abrupta de crédito, muito bem que os bancos públicos substituam, em parte e provisoriamente, o setor privado. Tal troca de posições vai continuar a acontecer pelo resto do ano, pois o BNDES foi vitaminado pelo governo. Mas, como no futebol, não é possível substituir o time inteiro durante o jogo, nem os bancos oficiais têm um grupo de reservas bastante para substituir os privados durante muito tempo. Trata-se apenas de um remendo. Um conserto, embora ainda precário, vai demandar medidas oficiais que barateiem o crédito: Selic, compulsórios e impostos menores.

No caso das montadoras, o pior foi o grande baque na venda de caminhões. Se a venda de caminhões despenca é porque as transportadoras estão ociosas e antecipam mais ociosidade. Se o fazem, é porque o tráfego de mercadorias está em baixa.

Os dados sobre desemprego ainda são muito incipientes. Mas a quantidade de acordos para a redução de jornada e salário, que devem durar para além do trimestre, não é muito animadora para as perspectivas do consumo. Também preocupante, os bancos estão não apenas prevendo, mas registrando, um aumento grande de inadimplência. Os números divulgados pelo BC registram, com atraso de um mês, pagamentos em atraso faz mais de 90 dias. Os dados disponíveis, pois, referem-se a dificuldades datadas ainda do início da crise. Os bancos e o comércio já estão vendo coisa bem pior.

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