Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
O pior passeia pelo planeta. Não há lugar intocado pela crise. Leste Europeu quebra devagar e ameaça o "Oeste"
QUANDO A Islândia quebrou, a história circulou o mundo sob um tom de galhofa sinistra mesclado com a graça exótica da ilha gelada e vulcânica da cantora Björk. Mas a estrambótica falência da Disneylândia do liberalismo abilolado não machucou ninguém além dos poucos islandeses e de alguns ingleses que lá arriscavam dinheiro.
O afundamento dos "tigres bálticos" (Estônia, Letônia e Lituânia) e a iminente quebra da Irlanda, à beira de ir ao FMI, também pareciam acontecimentos periféricos. Serviam mais para suscitar a "Schadenfreude" dos inimigos do "neoliberalismo", que se divertiam com a desgraça do hiperliberal "tigre celta".
Ontem, um alerta das desacreditadas agências de classificação de risco sobre o Leste Europeu foi o piparote que levou os mercados do mundo ao chão. Mas o peteleco do risco do Leste Europeu é tão forte assim? Houve algo a mais no ar além de um raio no céu azul da Romênia?
A bem da verdade, o céu de Romênia e cia. nublou faz tempo. Mas quem liga para essas "economias de transição"? Suecos, belgas, austríacos, italianos, mas também franceses e alemães, têm interesses por lá ou são donos de alguns dos maiores bancos da região. Os ex-comunistas convertidos ao capitalismo a crédito se endividaram demais, têm déficits externos gigantes, suas exportações caem e suas moedas derretem com a fuga de capitais: ensaiam um repeteco da crise asiática de 1997-98.
A Moody"s e a Standard & Poor"s avisaram ontem que podem rebaixar a nota de bancos do "Oeste" europeu que têm subsidiárias no Leste. As duas agências não costumam dar notas muito certeiras em período de bonança, mas durante epidemias de peste financeira sabem como "declarar óbitos", quando não ajudam a dar cabo do doente. O risco de mais perdas e mortes bancárias levou os investidores a fugir do risco. Venderam ações, ativos de empresas e países mais periclitantes e compraram títulos do Tesouro americano, que subiram bem ontem. Venderam euros também.
Há mais, claro. A Rússia torra suas reservas, mas não consegue impedir a derrocada do rublo. Ontem teve de fechar sua Bolsa de novo, pois as ações batiam a cabeça no chão. A derrocada do PIB e das exportações do Japão e Alemanha não foi uma notícia que ficou apenas no calendário dos indicadores econômicos. Foi um alerta de coisa feia adiante.
De resto, há cadáveres e zumbis bancários na sala de estar da finança mundial, e ninguém ainda sabe como remover os corpos ou fazer exorcismos. Alguns dos maiores bancos americanos e europeus estão quebrados. Enquanto não se der jeito nisso, não se começa a dar cabo da crise.
Mas ainda não há plano para o conserto da finança americana, o plano britânico chegou a um impasse (não sabem se estatizam mais), o alemão mal foi esboçado.
Enquanto isso, os custos do socorro de instituições financeiras e bancos, o já incorrido e o estimado, são tão grandes que até o "risco-país" de EUA, Alemanha e Japão (zero antes da crise) sobem "a níveis imagináveis", como observava Armínio Fraga em palestra ontem no Instituto FHC. Isto é, o rombo de crédito privado, mal e mal tapado pelos governos, está tornando a dívida desses países centrais mais suspeita.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
O pior passeia pelo planeta. Não há lugar intocado pela crise. Leste Europeu quebra devagar e ameaça o "Oeste"
QUANDO A Islândia quebrou, a história circulou o mundo sob um tom de galhofa sinistra mesclado com a graça exótica da ilha gelada e vulcânica da cantora Björk. Mas a estrambótica falência da Disneylândia do liberalismo abilolado não machucou ninguém além dos poucos islandeses e de alguns ingleses que lá arriscavam dinheiro.
O afundamento dos "tigres bálticos" (Estônia, Letônia e Lituânia) e a iminente quebra da Irlanda, à beira de ir ao FMI, também pareciam acontecimentos periféricos. Serviam mais para suscitar a "Schadenfreude" dos inimigos do "neoliberalismo", que se divertiam com a desgraça do hiperliberal "tigre celta".
Ontem, um alerta das desacreditadas agências de classificação de risco sobre o Leste Europeu foi o piparote que levou os mercados do mundo ao chão. Mas o peteleco do risco do Leste Europeu é tão forte assim? Houve algo a mais no ar além de um raio no céu azul da Romênia?
A bem da verdade, o céu de Romênia e cia. nublou faz tempo. Mas quem liga para essas "economias de transição"? Suecos, belgas, austríacos, italianos, mas também franceses e alemães, têm interesses por lá ou são donos de alguns dos maiores bancos da região. Os ex-comunistas convertidos ao capitalismo a crédito se endividaram demais, têm déficits externos gigantes, suas exportações caem e suas moedas derretem com a fuga de capitais: ensaiam um repeteco da crise asiática de 1997-98.
A Moody"s e a Standard & Poor"s avisaram ontem que podem rebaixar a nota de bancos do "Oeste" europeu que têm subsidiárias no Leste. As duas agências não costumam dar notas muito certeiras em período de bonança, mas durante epidemias de peste financeira sabem como "declarar óbitos", quando não ajudam a dar cabo do doente. O risco de mais perdas e mortes bancárias levou os investidores a fugir do risco. Venderam ações, ativos de empresas e países mais periclitantes e compraram títulos do Tesouro americano, que subiram bem ontem. Venderam euros também.
Há mais, claro. A Rússia torra suas reservas, mas não consegue impedir a derrocada do rublo. Ontem teve de fechar sua Bolsa de novo, pois as ações batiam a cabeça no chão. A derrocada do PIB e das exportações do Japão e Alemanha não foi uma notícia que ficou apenas no calendário dos indicadores econômicos. Foi um alerta de coisa feia adiante.
De resto, há cadáveres e zumbis bancários na sala de estar da finança mundial, e ninguém ainda sabe como remover os corpos ou fazer exorcismos. Alguns dos maiores bancos americanos e europeus estão quebrados. Enquanto não se der jeito nisso, não se começa a dar cabo da crise.
Mas ainda não há plano para o conserto da finança americana, o plano britânico chegou a um impasse (não sabem se estatizam mais), o alemão mal foi esboçado.
Enquanto isso, os custos do socorro de instituições financeiras e bancos, o já incorrido e o estimado, são tão grandes que até o "risco-país" de EUA, Alemanha e Japão (zero antes da crise) sobem "a níveis imagináveis", como observava Armínio Fraga em palestra ontem no Instituto FHC. Isto é, o rombo de crédito privado, mal e mal tapado pelos governos, está tornando a dívida desses países centrais mais suspeita.
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