quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Mistério dos juros

Panorama Econômico :: Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO


O presidente da Febraban, Fábio Barbosa, está em campanha para provar que o bicho não é tão feio assim, ou seja, que os juros bancários não são tão altos. Mas é difícil brigar com os números. Numa entrevista que me concedeu, Barbosa disse que não negaria que o spread é alto, prometeu que a Febraban incentivará a competição e propôs "acender a luz" sobre o tema.

As razões dos bancos, que ele defendeu na entrevista que concedeu a mim na Globonews, é que há muita desinformação sobre o tema e há produtos que os bancos têm que oferecer cujos custos são mais altos que o preço que podem cobrar, como os empréstimos para o setor rural. Fábio Barbosa disse que o Brasil precisa de um cadastro positivo que ajude os bancos a diferenciar os clientes.

Para quem acompanha essa questão há muito tempo no Brasil, a tendência é ser cético em relação a qualquer promessa de queda estrutural das taxas de juros. Os bancos prometeram que tudo seria diferente quando houvesse a Lei de Falências, ou quando os juros da Selic baixassem, ou quando os compulsórios caíssem. Tudo isso aconteceu. Agora, culpam a crise global. Ela existe, é real e tem aumentado o custo do dinheiro no mundo inteiro, mas, ainda assim, não explica tudo.

Ontem, a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) divulgou, mais uma vez, que os juros bancários continuam subindo mesmo após a queda de um ponto percentual da Selic. Quando estava tudo bem, de 2005 a meados de 2008, os juros não caíram.

Fábio Barbosa, que também é presidente do Santander, argumenta que um dos dados que ajudam a tornar o debate mais nebuloso é o destaque ao custo dos cheques especiais.

- Eles são apenas 2% dos empréstimos bancários, mas fazem um barulho danado. É preciso educar o tomador para que ele não use determinados produtos caros demais. Usar cheque especial é como ir de táxi de São Paulo ao Rio de Janeiro - diz ele.

Outros produtos que são naturalmente mais baratos têm uma composição muito pequena no total do crédito brasileiro, explica Fábio Barbosa.

- No Brasil, o crédito imobiliário é apenas 3% do total. Em outros países, ele tem uma fatia maior e, por isso, reduz, na média, o custo do crédito. Aqui, só agora o país voltou ao volume de crédito imobiliário que tinha há 20 anos.

Os números estão contra os bancos, e os fatos recentes atenuam um pouco a crítica feita a eles. Os dados da Anefac mostram que as taxas de juros de crédito pessoal chegam a 140% ao ano. O spread - a diferença entre custo de captação e custo de empréstimo dos bancos - subiu 7,5% de agosto a dezembro do ano passado, chegando a 45,1% para pessoas físicas. O dos empréstimos a empresas subiu 4% nos últimos seis meses de 2008, passando a 18,40%. Isso apenas o spread, ou seja, só a diferença cobrada pelos bancos, e não a taxa total.

A composição dos spreads é curiosa. Segundo levantamento feito pela repórter Juliana Rosa, produtora do meu programa na Globonews, junto à Anefac, é assim: a inadimplência representa 37,35% do spread, o lucro dos bancos corresponde a 26,93%, os impostos são 18,62%, o custo administrativo é 13,5% e o recolhimento compulsório é 3,6% do spread.

O economista Miguel Oliveira acha que todas as fatias dessa pizza estão gordas demais, e que a inadimplência subiu de 4,2% para 4,4%, não justificando um aumento das taxas por causa do risco de não pagamento.

Fábio Barbosa diz que os dados de Miguel Oliveira são de 90 dias atrás e que, nas últimas semanas, a inadimplência tem crescido sim, mas não deu os números atualizados. O cenário é de incerteza mesmo, e a crise aumenta o risco de qualquer crédito, em qualquer país do mundo.

Ainda assim, há muitas perguntas sem respostas. Que negócio tem um retorno desse tamanho, de 27%? Por que o custo administrativo de operações, cada vez mais facilitadas pelo home banking, precisa ser de 13,5%? Por que o compulsório caiu tanto e isso não produziu uma queda das taxas de juros?

Fábio Barbosa diz que a percepção geral no país é que os lucros dos bancos são altos demais. Por outro lado, a comparação feita dos vários setores empresariais do país mostraria, segundo ele, que os bancos são a sexta maior rentabilidade, e não a primeira.

- Nós estamos lá protegendo o dinheiro dos depositantes. A diferença entre os bancos brasileiros e os bancos de outros países é que o nosso sistema está sólido. Isso é uma virtude - diz ele.

É até um alívio enfrentar uma crise externa com os bancos sólidos. As dificuldades localizadas que aconteceram quando travou o interbancário foram resolvidas por medidas rápidas tomadas pelo Banco Central, direcionadas a manter em pé os bancos menores. A crise bancária vivida pelo Brasil nos anos 90 criou regras mais conservadoras de alavancagem do que as que os bancos de outros países foram autorizados a operar. Ninguém quer bancos falidos, mas isso não significa que o país não possa, ou não deva, discutir alguns fatos dos custos bancários que parecem contraditórios e incompreensíveis.

Para Fábio Barbosa, é preciso "acender a luz" sobre o tema. Discutir, abrir os números, expor as taxas. Ele prometeu que a Febraban vai dar mais transparência às taxas de juros dos diversos bancos.

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