terça-feira, 3 de março de 2009

O risco de casuísmo está nas entrelinhas

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Militante da causa da reforma política, o senador Marco Maciel (DEM-PE) acha que as propostas em discussão no Congresso devem ser votadas este ano, mas adverte que é preciso tomar cuidado com o risco de casuísmo. Maciel argumenta que a legislação, quando estabeleceu o prazo de um ano antes das eleições para a vigência de mudanças nas regras do jogo, foi justamente para evitar o casuísmo de última hora dos poderosos de plantão.

Sem casuísmo, portanto, qualquer mudança nas regras das eleições presidenciais de 2010 deve ser aprovada até o próximo dia 3 de outubro, um sábado. Ou seja, daqui a sete meses. Mas esse é o prazo, também, de filiação partidária dos candidatos às próximas eleições, de presidente a deputado estadual.

O projeto de reforma que o governo enviou ao Congresso, no entanto, prevê que detentores de mandato possam deixar seus cargos, para concorrer nas eleições de outubro, até 30 dias antes das convenções partidárias (30 de junho de 2010). Como fica então a questão do prazo de filiação para quem pretende concorrer às eleições? Além disso, o projeto faz tábula rasa da fidelidade partidária, que também é de um ano.

"Seria um retrocesso", diz Marco Maciel. Mas ele assegura não estar "preocupado" com iniciativas casuísticas do governo ou dos partidos que integram sua base de sustentação no Congresso. O que acha é que "nós não podemos mais adiar a reforma política. Nós devemos nos concentrar nessa questão porque ela é essencial para melhorar a governabilidade do país", diz, com a autoridade de quem foi vice-presidente da República nos oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso.

A era tucana, como a atual, teve de se amparar no PMDB como viga de sustentação. Eleito duas vezes no primeiro turno, FHC tinha poucos mais de um terço do Congresso.

Em 2009, Maciel vai trocar o termo "reforma política" por "reforma institucional". Mais importante do que fortalecer apenas os partidos - argumenta - é consolidar todos os instrumentos democráticos estabelecidos na Constituição de 1988.

O senador recorre a Norberto Bobbio para dizer que a política não deve ser tratada somente como uma questão de homens. "Os homens, em sua maioria, são aquilo que são; as boas instituições revelam as qualidades positivas, as más instituições, as negativas", diz Bobbio em seu estudo sobre as origens da democracia italiana "Entre duas Repúblicas". Mas recriminar "a malvadeza dos governantes quando as instituições não são boas é, no mínimo, tão absurdo quanto esperar que os governantes se tornem providencialmente sábios sem que as más instituições sejam removidas".

"O que diz Bobbio é que o importante é fortalecer as boas instituições", afirma Marco Maciel. E quais seriam elas? O senador pernambucano responde com as mesmas "duas" palavras de Norberto Bobbio: "instituições democráticas". Em resumo, quando fala em reformas institucionais, Maciel quer dizer que é preciso fortalecer as instituições democráticas para melhorar o nível de governabilidade.

"Enquanto nós não melhorarmos o nível de governabilidade, nós vamos continuar a conviver, por exemplo, com a insegurança jurídica", diz. Maciel ainda tem nitidos, na memória, casos que vivenciou no governo FHC de empresários internacionais interessados em investir no país que costumavam terminar as conversas com a mesma pergunta: "Quais são as garantias que você me dá de que essas regras não vão mudar"?

Boas instituições e regras permanentes podem ser considerados o resumo da bandeira que Marco Maciel acha que não pode mais ser adiada. Ele considerou o projeto de reforma do governo uma "proposta em aberto, para discussão". O importante, acredita, "é que nós não devemos adiar mais a votação dessas matérias. Sei que não é fácil formar os consensos para votar, mas o momento é agora".

"O fortalecimento das instituições começa logicamente com o fortalecimento dos partidos, que pressupõe - coisa dificílima - mudar o sistema eleitoral em vigor, que não ajuda que os governantes tenham maioria no Congresso. Dificilmente se tem maioria no parlamento". De fato, a própria chapa de Maciel ganhou duas eleições em primeiro turno, mas fez pouco mais de um terço das cadeiras do Congresso.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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