O ano político começou bem, com a comprovação de que não caíram no esquecimento provocado pelo carnaval as denúncias do senador Jarbas Vasconcelos contra a corrupção que domina a política brasileira, que tem no seu partido, o PMDB, um instrumento cada vez mais poderoso. O senador volta à tribuna hoje para reafirmar sua posição, e à noite participa da primeira reunião suprapartidária do grupo parlamentar anticorrupção, inspiração do deputado federal Fernando Gabeira. Mesmo durante o carnaval, o senador Pedro Simon pegou o tema que sempre foi seu e, da tribuna do Senado e em entrevista à imprensa gaúcha, adicionou críticas à direção partidária do PMDB, ele que, assim como Jarbas, é do tempo do "velho MDB" de Ulysses Guimarães.
Jarbas defenderá a reforma política como solução para a organização partidária e, consequentemente, para a reformulação de nosso sistema político. Simon defendeu a punição dos corruptos como única maneira de controlar a corrupção, repetindo que a impunidade é a grande culpada por sua incidência.
O deputado Fernando Gabeira quer atacar pontos específicos, como a transparência na atividade parlamentar, e defende que os avanços sejam feitos por decisões parlamentares, como a instituição do voto aberto.
Não há, no momento, ambiente para a formação de um novo partido que aglutine os diversos políticos que pretendam se unir na luta anticorrupção, mas uma vontade de recuperar a credibilidade da atividade parlamentar.
Idealmente, a campanha anticorrupção se refletirá nos resultados das eleições legislativas em 2010, ajudando a renovação do Congresso.
Mas, como vimos na última eleição, renovação não significa uma representação melhor quando o foro privilegiado atrai para a atividade parlamentar todo tipo de "picareta" - na definição de Lula - em busca de proteção.
Parece difícil, no entanto, que a campanha presidencial escape do tema, como a potencial candidata à sucessão de Lula, ministra Dilma Rousseff, evitou comentar o discurso do senador Jarbas Vasconcelos com uma evasiva qualquer.
À medida que aumente a intensidade da campanha, a posição dos candidatos sobre a corrupção na política brasileira será cobrada, e as próprias alianças eleitorais terão que pelo menos preservar as aparências para que as candidaturas não saiam chamuscadas diante da opinião pública.
Mesmo com todo o apoio da popularidade do presidente Lula, a(o) candidata(o) oficial terá que enfrentar sozinha(o) os debates eleitorais e a disputa política voltará a ser feita entre iguais, sem aquele toque mitológico que o Plano Real deu ao PSDB para derrotar Lula duas vezes no primeiro turno, e que levou Lula a duas vitórias seguidas, mesmo que seu carisma inegável só lhe tenha proporcionado vitórias no segundo turno.
Assim como o apoio de Lula parece suficiente para levar o(a) candidato(a) do PT ao segundo turno, não há indicações de que bastará para lhe dar a vitória. O combate à corrupção deverá reduzir a influência do PMDB dentro do governo, haja vista a reação à tentativa de tomada pelo partido do controle do fundo de pensão Real Grandeza, dos empregados de Furnas.
Mesmo sem acreditar na força dos formadores de opinião, o presidente Lula recuou da posição de aparente indiferença quanto à questão, e evitou que o PMDB causasse novos estragos na imagem de seu governo, já desgastado pelo aparelhamento dos cargos públicos por petistas e aliados.
Só na administração pública direta, petistas ocupam 20% dos cargos mais altos do governo, e praticamente a metade dos indicados é ligada à vida sindical. A campanha contra a corrupção pode evitar o fisiologismo de uma base partidária que, tanto nos governos tucanos quanto na Era Lula, se utiliza da repartição de cargos públicos em troca de apoio político, que muitas vezes não vem.
Mas, se é verdade que a coalizão governista é infiel às direções palacianas na maioria das vezes, obedecendo a interesses próprios, não é menos verdade que ela está sempre disposta a garantir a blindagem do governo que lhe satisfaz as vontades.
O PT tem, na prática, a mesma atitude diante da máquina pública que seus aliados, só que alega que a ocupação é feita por ideologia, e não por interesses secundários. O fundo de pensão da Eletros, por exemplo, é aparelhado pelo PT, enquanto o de Furnas caberia, ou caberá, ao PMDB.
O governo Lula tem uma visão expansionista do funcionalismo público que criou quase 200 mil novos cargos, e atende ao apetite de sua base partidária, heterogênea ideologicamente, mas muito homogênea na visão do Estado como fonte de poder político.
Quando se trata de ocupar a máquina pública, no entanto, as divergências assomam, e foi, aliás, por causa delas que o escândalo do mensalão veio à tona, a partir de desavenças entre o PTB e o PT na divisão dos lucros políticos dos Correios.
Aliás, entre os 40 indiciados do mensalão, apenas o ex-deputado José Borba, que renunciou para não ser cassado, pertence ao PMDB, que naquela época não tinha o peso político dentro da coalizão governista que tem hoje.
Na esteira do mensalão veio a debacle de partidos como o PP, o PL e o PTB, e a perda de prestígio político do próprio PT. O PMDB foi aumentando sua força política dentro do governo e de sua máquina administrativa, e chega hoje a ser o partido dominante na aliança eleitoral.
Ao mesmo tempo, os escândalos envolvendo figuras importantes de sua estrutura foram surgindo. Ficando marcado como um partido fisiológico e corrupto, como membros proeminentes como os senadores Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon acusam, o PMDB pode se tornar um estorvo na sucessão, e não a solução.
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