DEU NO VALOR
Além de escalar a equipe jurídica da campanha da ex-ministra Dilma Rousseff a presidente, o advogado Márcio Thomaz Bastos será o consultor especial de Lula nas eleições. Ele já dá pitacos no conteúdo dos programas de tevê da candidata do PT, mas sua principal missão será a blindagem da participação do presidente na campanha eleitoral de Dilma, que deve ser intensificada nos 45 dias de propaganda gratuita no rádio e na televisão.
Thomaz Bastos e Lula formaram uma parceria de sucesso no primeiro mandato do presidente.
O advogado foi decisivo em alguns dos principais percalços legais do governo. Lula, por exemplo, queria recusar a renovação do visto no passaporte do jornalista Larry Rother, correspondente do The New York Times, o que na prática correspondia à expulsão do repórter do país e um ataque à liberdade de expressão assegurada pela Constituição. Os argumentos de Thomaz Bastos foram decisivos para Lula recuar da decisão.
O criminalista também deu o tom da reação do governo ao escândalo do mensalão. Thomaz Bastos releva sua participação na operação em que o governo classificou o mensalão dos pecados veniais. Segundo alegava, qualquer advogado de porta de cadeia não teria dificuldade para explicar a dinheirama que circulou entre os partidos como um esquema de caixa 2, prática "comum" aos partidos a qual sucumbiu também o PT, como diria mais tarde o próprio presidente da República.
Na prática, Thomaz Bastos teve um papel no mensalão que transcendeu a simples consultoria jurídica. É do conhecimento público que o advogado serviu como mediador entre Lula e os principais líderes da oposição, na crise de 2005. Menos conhecida é sua articulação com os líderes partidários no Congresso para evitar a convocação de testemunhas para depor nas CPIs.
Thomaz Bastos ficou conhecido mais como advogado do que como ministro da Justiça do governo. Por isso é importante precisar agora por que Lula recorre novamente aos serviços de um advogado que conhece como poucos os meandros do poder em Brasília.
Uma explicação é que o presidente da República está preocupado com a condenação que sofreu do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por fazer campanha eleitoral antes do prazo permitido pela legislação eleitoral (a oposição, aliás, prepara outra enxurrada de ações). Preocupado, na realidade, é pouco para descrever a reação do presidente à decisão do TSE. Ele parou de reclamar publicamente, diante da condenação geral, mas em particular não poupa adjetivos poucos lisonjeiros aos juízes eleitorais. Lula acha que está sendo usado como "exemplo pedagógico" pelo TSE. Se já é multado agora ao apenas "insinuar" que sua candidata é Dilma, como será quando entrar pra valer na campanha?
O fato é que Lula está prestes a se envolver mais ainda na campanha de sua ex-ministra. O presidente deixou sua candidata solta durante quatro semanas, e o PT não gostou do que viu e se convenceu de que será preciso o presidente empenhar sua gigantesca popularidade, "entrar de cabeça" na campanha para assegurar a transferência de votos para uma candidata que, a menos de seis meses da eleição, não superou a barreira dos 30% do eleitorado, como era esperado de alguém com um padrinho tão forte.
Entre os conselheiros mais próximos de Lula também formou-se o consenso de que o presidente não aceita a ideia de perder a eleição de outubro e está disposto a fazer o que for preciso para eleger Dilma. Essa é a questão: até que ponto é conveniente e legítimo o envolvimento do presidente da República na campanha eleitoral, um ambiente de normal exacerbação de ânimos, sem que isso leve à divisão do país. Lula é presidente do Brasil. Do PT, é apenas o presidente de honra. E ninguém imagina que seja algo mais que figura de retórica ele dizer que não aceita perder as eleições de outubro.
Existe ainda a questão do uso da máquina. O pronunciamento que o presidente fez no 1º de Maio, em cadeia nacional de rádio e televisão, pouco ou quase nada difere dos discursos pelos quais foi repreendido pela Justiça Eleitoral. Contornando as bordas da lei, sem muita sutileza, Lula pediu para a população tomar "decisões corretas" para manter o atual "modelo de governo". O poder de Lula hoje no PT é ilimitado. Politicamente falando, porque como presidente, mesmo popular como nenhum outro, no país seu poder tem o limite da lei.
Pode ser que o PSDB veja fantasmas ao estranhar que o pronunciamento de 1º de Maio, no rádio e na TV, tenha ido ao ar no dia 29 de abril, o dia em que se divulgou que ele era um entre os 25 principais líderes mundiais, de acordo com pesquisa da revista Time. O PT também estranhou as vinhetas do 45º aniversário da TV Globo, que pareciam remeter ao número do PSDB na urna eletrônica. Ossos do ofício. Esse é o clima de campanha eleitoral, e ela nem sequer começou oficialmente.
Lula e José Serra, o candidato tucano que ameaça a eleição de Dilma, têm um histórico exemplar de campanha. Em 2002, emissários do petista procuraram o então candidato tucano para saber se ele usaria um suposto material sobre a vida pessoal de Lula que chegara ao PSDB. Serra ainda não sabia do material, mas se declarou ofendido com a simples suposição dos emissários de que ele pudesse usar acusações pessoais contra Lula na campanha, sem falar que se tratava de denúncia de origem duvidosa.
Na campanha de 2006 para o governo de São Paulo, Serra ficou sabendo que a campanha de Aloísio Mercadante (PT) armara um falso dossiê sobre irregularidades em sua gestão no Ministério da Saúde.
Por meio de um amigo comum, Serra fez chegar a Mercadante o seguinte raciocínio: Ele perdeu em 2002 para Lula e aceitou o resultado sem criar confusão. Por que então Mercadante não poderia perder uma eleição para ele, José Serra, sem causar problemas? Ficou sem resposta, o suposto dossiê foi publicado e os advogados tiveram muito trabalho. O que se espera agora é que a campanha não chegue a esse extremo.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
Além de escalar a equipe jurídica da campanha da ex-ministra Dilma Rousseff a presidente, o advogado Márcio Thomaz Bastos será o consultor especial de Lula nas eleições. Ele já dá pitacos no conteúdo dos programas de tevê da candidata do PT, mas sua principal missão será a blindagem da participação do presidente na campanha eleitoral de Dilma, que deve ser intensificada nos 45 dias de propaganda gratuita no rádio e na televisão.
Thomaz Bastos e Lula formaram uma parceria de sucesso no primeiro mandato do presidente.
O advogado foi decisivo em alguns dos principais percalços legais do governo. Lula, por exemplo, queria recusar a renovação do visto no passaporte do jornalista Larry Rother, correspondente do The New York Times, o que na prática correspondia à expulsão do repórter do país e um ataque à liberdade de expressão assegurada pela Constituição. Os argumentos de Thomaz Bastos foram decisivos para Lula recuar da decisão.
O criminalista também deu o tom da reação do governo ao escândalo do mensalão. Thomaz Bastos releva sua participação na operação em que o governo classificou o mensalão dos pecados veniais. Segundo alegava, qualquer advogado de porta de cadeia não teria dificuldade para explicar a dinheirama que circulou entre os partidos como um esquema de caixa 2, prática "comum" aos partidos a qual sucumbiu também o PT, como diria mais tarde o próprio presidente da República.
Na prática, Thomaz Bastos teve um papel no mensalão que transcendeu a simples consultoria jurídica. É do conhecimento público que o advogado serviu como mediador entre Lula e os principais líderes da oposição, na crise de 2005. Menos conhecida é sua articulação com os líderes partidários no Congresso para evitar a convocação de testemunhas para depor nas CPIs.
Thomaz Bastos ficou conhecido mais como advogado do que como ministro da Justiça do governo. Por isso é importante precisar agora por que Lula recorre novamente aos serviços de um advogado que conhece como poucos os meandros do poder em Brasília.
Uma explicação é que o presidente da República está preocupado com a condenação que sofreu do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por fazer campanha eleitoral antes do prazo permitido pela legislação eleitoral (a oposição, aliás, prepara outra enxurrada de ações). Preocupado, na realidade, é pouco para descrever a reação do presidente à decisão do TSE. Ele parou de reclamar publicamente, diante da condenação geral, mas em particular não poupa adjetivos poucos lisonjeiros aos juízes eleitorais. Lula acha que está sendo usado como "exemplo pedagógico" pelo TSE. Se já é multado agora ao apenas "insinuar" que sua candidata é Dilma, como será quando entrar pra valer na campanha?
O fato é que Lula está prestes a se envolver mais ainda na campanha de sua ex-ministra. O presidente deixou sua candidata solta durante quatro semanas, e o PT não gostou do que viu e se convenceu de que será preciso o presidente empenhar sua gigantesca popularidade, "entrar de cabeça" na campanha para assegurar a transferência de votos para uma candidata que, a menos de seis meses da eleição, não superou a barreira dos 30% do eleitorado, como era esperado de alguém com um padrinho tão forte.
Entre os conselheiros mais próximos de Lula também formou-se o consenso de que o presidente não aceita a ideia de perder a eleição de outubro e está disposto a fazer o que for preciso para eleger Dilma. Essa é a questão: até que ponto é conveniente e legítimo o envolvimento do presidente da República na campanha eleitoral, um ambiente de normal exacerbação de ânimos, sem que isso leve à divisão do país. Lula é presidente do Brasil. Do PT, é apenas o presidente de honra. E ninguém imagina que seja algo mais que figura de retórica ele dizer que não aceita perder as eleições de outubro.
Existe ainda a questão do uso da máquina. O pronunciamento que o presidente fez no 1º de Maio, em cadeia nacional de rádio e televisão, pouco ou quase nada difere dos discursos pelos quais foi repreendido pela Justiça Eleitoral. Contornando as bordas da lei, sem muita sutileza, Lula pediu para a população tomar "decisões corretas" para manter o atual "modelo de governo". O poder de Lula hoje no PT é ilimitado. Politicamente falando, porque como presidente, mesmo popular como nenhum outro, no país seu poder tem o limite da lei.
Pode ser que o PSDB veja fantasmas ao estranhar que o pronunciamento de 1º de Maio, no rádio e na TV, tenha ido ao ar no dia 29 de abril, o dia em que se divulgou que ele era um entre os 25 principais líderes mundiais, de acordo com pesquisa da revista Time. O PT também estranhou as vinhetas do 45º aniversário da TV Globo, que pareciam remeter ao número do PSDB na urna eletrônica. Ossos do ofício. Esse é o clima de campanha eleitoral, e ela nem sequer começou oficialmente.
Lula e José Serra, o candidato tucano que ameaça a eleição de Dilma, têm um histórico exemplar de campanha. Em 2002, emissários do petista procuraram o então candidato tucano para saber se ele usaria um suposto material sobre a vida pessoal de Lula que chegara ao PSDB. Serra ainda não sabia do material, mas se declarou ofendido com a simples suposição dos emissários de que ele pudesse usar acusações pessoais contra Lula na campanha, sem falar que se tratava de denúncia de origem duvidosa.
Na campanha de 2006 para o governo de São Paulo, Serra ficou sabendo que a campanha de Aloísio Mercadante (PT) armara um falso dossiê sobre irregularidades em sua gestão no Ministério da Saúde.
Por meio de um amigo comum, Serra fez chegar a Mercadante o seguinte raciocínio: Ele perdeu em 2002 para Lula e aceitou o resultado sem criar confusão. Por que então Mercadante não poderia perder uma eleição para ele, José Serra, sem causar problemas? Ficou sem resposta, o suposto dossiê foi publicado e os advogados tiveram muito trabalho. O que se espera agora é que a campanha não chegue a esse extremo.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
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