DEU EM O GLOBO
Na pauta da Câmara, entre as 11 medidas provisórias que estão na fila para serem votadas ainda nesta legislatura, uma das mais polêmicas aumenta o limite de financiamento para estados e municípios que terão jogos da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Outra isenta de impostos produtos e bens necessários para a construção de estádios de futebol.
A MP 496/10 permite que estados e municípios, mesmo os que tiveram débitos com a União renegociados recentemente, comprometam com dívidas o equivalente a 120% de sua receita líquida anual, em vez de 100%, como está estabelecido em lei hoje.
A medida não mexe diretamente na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas sim na lei complementar de rolagem da dívida.
Ela altera a lei, os acordos e tudo o que estava pactuado em torno da rolagem da dívida dos estados e municípios.
É curioso que o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, tenha andado a defender a alteração do indexador da rolagem da dívida, que a torna impagável, mas o governo se recuse a mudar, alegando erroneamente que, para alterar o indexador, seria preciso mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que não é verdade, como mostra a medida provisória que está para ser votada.
A lei da rolagem da dívida foi feita antes da Lei de Responsabilidade Fiscal, também na década de 90.
Desde a época da Primeira República havia estados quebrando, e o governo federal, socorrendo. Inclusive nas moratórias da dívida externa.
Depois da Constituinte de 1988 houve várias rolagens. O próprio ex-presidente Fernando Collor, para tentar se salvar naqueles momentos tensos em que seu impeachment estava para ser votado no Congresso, fez uma rolagem que agradava aos estados.
A Lei de Responsabilidade Fiscal veio então para acabar com essas rolagens permanentes.
A ideia era pagar a conta do passado, mas não repetir o erro no futuro.
A reivindicação de Alckmin tem fundamento técnico, porque a dívida dos estados e municípios é indexada pelo IGPM, pois naquela época havia o câmbio fixo.
Quando o câmbio flutuante passou a ser usado, praticamente tudo que ainda é indexado tem como referência o IPCA, e só contrato de aluguel, tarifas é que ficaram em IGP, além da dívida dos estados e municípios.
Isso gera distorções importantes, por mais que os estados e municípios paguem, a dívida só faz aumentar.
Os governadores deviam 12% do PIB em 2000 e hoje devem 11%, mas pagaram muito mais do que esse ponto percentual de redução.
Isso não está sendo mudado nessa MP, o ministro Paulo Bernardo respondeu a Alckmin, dizendo que não podia mexer no indexador sem mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal e sem mexer nos contratos de rolagem da dívida.
Só que essa MP da Copa está fazendo exatamente isso: sem mexer na LRF, está alterando os contratos de rolagem da dívida.
Do ponto de vista ético, essa mudança pontual para apenas 12 estados e municípios cria uma situação embaraçosa.
É uma aberração federativa, pois existem cidades que estão em estado de emergência por causa de uma calamidade pública, como já estiveram municípios de Santa Catarina; hoje deve haver muitas cidades com problemas por causa da seca no Norte e no Nordeste; há outros casos de cidades que estão em petição de miséria por causa da educação, por causa da saúde, mas, para essas, as regras estão mantidas.
Do ponto de vista financeiro, macroeconômico, a MP da Copa não cria problemas para a economia como um todo, mas apenas problemas localizados no futuro em algumas cidades como Natal, onde o custo de construir o estádio vai ser o dobro do que o município já deve hoje.
A capital do Rio Grande do Norte vai fazer um endividamento brutal, comprometer uma ou duas gerações futuras da cidade, por causa de um estádio de futebol.
A medida provisória permite até mesmo empréstimos externos, e há informações de que o Banco Mundial está querendo emprestar dinheiro para a Prefeitura do Rio.
O que dizem na verdade é que essa MP foi concebida para permitir a construção do estádio do Corinthians em São Paulo, para a abertura da Copa do Mundo.
Das grandes capitais, a que está mais estourada nos limites orçamentários é São Paulo. Por mais que tenha sido feito um ajuste doloroso nos últimos anos, como se estava partindo de uma posição muito ruim, dificilmente a prefeitura vai conseguir se enquadrar nos limites da lei.
Essa MP, embora não mexa diretamente na Lei de Responsabilidade Fiscal, está mexendo na lei da rolagem, dando um péssimo sinal federativo, sinalizando uma falta de prioridade se mostrando que , quando é para agradar a empreiteiras e construir estádios de futebol, a LRF não impede que se mude a rolagem da dívida.
Fora isso, há um aspecto colateral nessa MP que chega a ser hilariante se não fosse tão exemplar do espírito hipócrita com que são tomadas medidas econômicas ultimamente.
A MP, como lei ordinária, não pode mudar uma lei complementar como a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por ela, o Tesouro não pode dar aval para uma prefeitura ou para um governo de estado que esteja desenquadrado.
Para não correr o risco de o Tribunal de Contas da União ou o Ministério Público cobrar providências do Tesouro, a MP tem um artigo que diz que os municípios e os estados estão desobrigados da remessa do balancete da execução orçamentária mensal e do cronograma de compromissos da dívida vincenda, prevista no artigo 21 daquela lei.
Eles só precisam entregar os relatórios depois que fizerem os investimentos.
Os estados ou as prefeituras vão continuar publicando os balanços, mas o que o Tesouro não quer é receber oficialmente esses números, para não ter que cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Na pauta da Câmara, entre as 11 medidas provisórias que estão na fila para serem votadas ainda nesta legislatura, uma das mais polêmicas aumenta o limite de financiamento para estados e municípios que terão jogos da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Outra isenta de impostos produtos e bens necessários para a construção de estádios de futebol.
A MP 496/10 permite que estados e municípios, mesmo os que tiveram débitos com a União renegociados recentemente, comprometam com dívidas o equivalente a 120% de sua receita líquida anual, em vez de 100%, como está estabelecido em lei hoje.
A medida não mexe diretamente na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas sim na lei complementar de rolagem da dívida.
Ela altera a lei, os acordos e tudo o que estava pactuado em torno da rolagem da dívida dos estados e municípios.
É curioso que o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, tenha andado a defender a alteração do indexador da rolagem da dívida, que a torna impagável, mas o governo se recuse a mudar, alegando erroneamente que, para alterar o indexador, seria preciso mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que não é verdade, como mostra a medida provisória que está para ser votada.
A lei da rolagem da dívida foi feita antes da Lei de Responsabilidade Fiscal, também na década de 90.
Desde a época da Primeira República havia estados quebrando, e o governo federal, socorrendo. Inclusive nas moratórias da dívida externa.
Depois da Constituinte de 1988 houve várias rolagens. O próprio ex-presidente Fernando Collor, para tentar se salvar naqueles momentos tensos em que seu impeachment estava para ser votado no Congresso, fez uma rolagem que agradava aos estados.
A Lei de Responsabilidade Fiscal veio então para acabar com essas rolagens permanentes.
A ideia era pagar a conta do passado, mas não repetir o erro no futuro.
A reivindicação de Alckmin tem fundamento técnico, porque a dívida dos estados e municípios é indexada pelo IGPM, pois naquela época havia o câmbio fixo.
Quando o câmbio flutuante passou a ser usado, praticamente tudo que ainda é indexado tem como referência o IPCA, e só contrato de aluguel, tarifas é que ficaram em IGP, além da dívida dos estados e municípios.
Isso gera distorções importantes, por mais que os estados e municípios paguem, a dívida só faz aumentar.
Os governadores deviam 12% do PIB em 2000 e hoje devem 11%, mas pagaram muito mais do que esse ponto percentual de redução.
Isso não está sendo mudado nessa MP, o ministro Paulo Bernardo respondeu a Alckmin, dizendo que não podia mexer no indexador sem mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal e sem mexer nos contratos de rolagem da dívida.
Só que essa MP da Copa está fazendo exatamente isso: sem mexer na LRF, está alterando os contratos de rolagem da dívida.
Do ponto de vista ético, essa mudança pontual para apenas 12 estados e municípios cria uma situação embaraçosa.
É uma aberração federativa, pois existem cidades que estão em estado de emergência por causa de uma calamidade pública, como já estiveram municípios de Santa Catarina; hoje deve haver muitas cidades com problemas por causa da seca no Norte e no Nordeste; há outros casos de cidades que estão em petição de miséria por causa da educação, por causa da saúde, mas, para essas, as regras estão mantidas.
Do ponto de vista financeiro, macroeconômico, a MP da Copa não cria problemas para a economia como um todo, mas apenas problemas localizados no futuro em algumas cidades como Natal, onde o custo de construir o estádio vai ser o dobro do que o município já deve hoje.
A capital do Rio Grande do Norte vai fazer um endividamento brutal, comprometer uma ou duas gerações futuras da cidade, por causa de um estádio de futebol.
A medida provisória permite até mesmo empréstimos externos, e há informações de que o Banco Mundial está querendo emprestar dinheiro para a Prefeitura do Rio.
O que dizem na verdade é que essa MP foi concebida para permitir a construção do estádio do Corinthians em São Paulo, para a abertura da Copa do Mundo.
Das grandes capitais, a que está mais estourada nos limites orçamentários é São Paulo. Por mais que tenha sido feito um ajuste doloroso nos últimos anos, como se estava partindo de uma posição muito ruim, dificilmente a prefeitura vai conseguir se enquadrar nos limites da lei.
Essa MP, embora não mexa diretamente na Lei de Responsabilidade Fiscal, está mexendo na lei da rolagem, dando um péssimo sinal federativo, sinalizando uma falta de prioridade se mostrando que , quando é para agradar a empreiteiras e construir estádios de futebol, a LRF não impede que se mude a rolagem da dívida.
Fora isso, há um aspecto colateral nessa MP que chega a ser hilariante se não fosse tão exemplar do espírito hipócrita com que são tomadas medidas econômicas ultimamente.
A MP, como lei ordinária, não pode mudar uma lei complementar como a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por ela, o Tesouro não pode dar aval para uma prefeitura ou para um governo de estado que esteja desenquadrado.
Para não correr o risco de o Tribunal de Contas da União ou o Ministério Público cobrar providências do Tesouro, a MP tem um artigo que diz que os municípios e os estados estão desobrigados da remessa do balancete da execução orçamentária mensal e do cronograma de compromissos da dívida vincenda, prevista no artigo 21 daquela lei.
Eles só precisam entregar os relatórios depois que fizerem os investimentos.
Os estados ou as prefeituras vão continuar publicando os balanços, mas o que o Tesouro não quer é receber oficialmente esses números, para não ter que cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.
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