Na semana passada, tratando do reforço da urgência de julgamento do mensalão – como dividendo do desastrado encontro do ex-presidente Lula com o ministro do STF, Gilmar Mendes, e do processo de perda de controle da CPMI do Cachoeira pelo PT e pelo Pa-lácio do Planalto – assinalei que isso se deu “num contexto em que a presidente Dilma sente-se desafiada por projeções de um PIB tão pequeno quanto o de 2011, de 2,7%, ou até de crescimento menor”. Perspectiva, esta última, de uma taxa anual entre 2,5% e 2%, já indicada por reavaliações de vários analistas. O que aponta para uma mistura de dois ingredientes negativos – político e econômico – neste ano eleitoral, que gera muitos riscos para o PT e para a presidente. Pois, mesmo que o arsenal de medidas pontuais de apoio seletivo a atividades produtivas consiga reduzir os efeitos agudos das restrições da economia, na fase decisiva das eleições municipais, mesmo assim o impacto do julgamento do mensalão no terceiro trimestre, de um lado afetará fortemente a imagem do PT no eleitorado das capitais e grandes cidades, e, de outro, esgarçará, ou quebrará, a base parlamentar governista, criando até condições – hoje praticamente inexistentes – para a articulação de uma candidatura oposicionista competitiva no pleito presidencial de 2014. Por isso, Lu-la e a direção do PT vão continuar insistindo, a qualquer preço, na postergação do referido julgamento.
As reações da presidente Dilma aos dados do PIB decepcionante constatados em pesquisa do IBGE seguem dominadas pela mesma tônica do voluntarismo das denúncias do “tsunami financeiro dos países ricos”; da responsabilização exclusiva dos bancos privados pelas elevadas taxas de preços, com o recrutamento dos bancos públicos para respaldo à aposta na persistência e no incremento do consumo, bem como para ampliar o peso deles na economia; em mais e mais medidas protecionistas – tarifárias e de subsídios fiscais seletivos – como as que beneficiam a indústria automobilística e agora a Zona Franca de Manaus, esta afetando empresas nacionais de outras regiões. Tudo isso simultaneamente à ampliação das verbas públicas destinadas ao assistencialismo.
Mas os novos dados, inegáveis, do precaríssimo desempenho da economia até agora (que já obrigam o Palácio do Planalto a arquivar de vez a promessa de um PIB em 2012 além dos 4% e a assumir a defensiva da busca de repetição dos 2,7% do ano passado) e, ademais, o receio de que essa busca seja inviabilizada por possível agravamento da crise do Euro e de seus reflexos também no mercado mundial de commodities minerais e agrícolas, em meio ao novo cenário é possível que a presidente abra espaço real a sugestões e propostas anticrise de conselheiros bem diferentes dos de postura estatizante que têm tido acesso privilegiado a ela. O que poderia, até pelo chamado estado de necessidade, levá-la do voluntarismo das medidas pontuais a ações de maior amplitude e consistência.
Aliás, algumas ações desse caráter, embora limitadas e sem sequência, já foram decididas por ela. Foi o caso das concessões no sistema aeroportuário. E da desoneração de custos trabalhistas e fiscais de algumas atividades produtivas (defendida por empresários da Comissão de Competitividade coordenada por Jorge Gerdau), malgrado os critérios muito seletivos da desoneração feita. E tem também esse caráter a proposta de Delfim Netto – acolhida esta semana, para estudo – de suspensão por 90 a 120 dias do recolhimento de impostos pelas empresas vinculadas a essas atividades. Proposta com a qual Delfim procura contornar a “inviabilidade política”, num governo petista, de uma reforma constitucional do sistema tributário. Mais uma inflexão semelhante da presidente: a recomendação à Petrobras para que “flexibilize” o elevado patamar de exigências de conteúdo nacional em suas encomendas.
Uma “virada” efetiva nesse sentido só poderia ocorrer, porém, com mudanças essenciais na visão e nos objetivos do governo Dilma. Um terreno propício seria o dos investimentos na infraestrutura econômica e social, que voltaram a ser enfatizados na reunião promovida pela presidente anteontem, sob o impacto da pesquisa do IBGE. Mas o enfrentamento dos grandes gargalos da infraestrutura – fator relevante do Custo Brasil – re-clama, num plano, um salto do volume e da qualidade dos investimentos públicos, bloqueado pelo crescimento incessante das despesas de custeio e assistencialistas e pelo baixíssimo nível do gerenciamento oficial dos projetos e obras. E, em outro plano, a atração de vultosos investimentos privados, domésticos e externos, obstruída sobretudo pela partidarização e pelo virtual desmonte das agências reguladoras dos serviços pú-blicos nos dois mandatos de Lula e até agora no governo Dilma.
Jarbas de Holanda é jornalista
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