Se pudesse chorar de medo numa casa
solitária,
se pudesse arrancar-me os olhos e comê-los,
eu o faria pela tua voz de laranjeira enlutada
e pela tua poesia que sai dando gritos.
[...]
Se pudesse encher de fuligem as alcaidias,
e, soluçando, derrubar relógios,
seria para ver quando na tua casa
chega o verão com os lábios rachados,
chegam muitas pessoas de traje agonizante,
chegam regiões de triste esplendor,
chegam arados mortos e papoulas,
chegam coveiros e ginetes,
chegam planetas e mapas com sangue,
chegam mergulhadores cobertos de cinza,
chegam mascarados arrastando donzelas
atravessadas por grandes facas,
chegam raízes, veias, hospitais,
mananciais, formigas,
chega a noite com a cama onde
morre entre as aranhas um hussardo solitário,
chega uma rosa de ódio e alfinetes,
chega uma embarcação amarelenta,
chega um dia de vento com um menino,
chego eu com Oliverio, Norah,
Vicente Aleixandre, Delia,
Maruca, Malva Marina, Maria Luisa e Larco,
la Rubia, Rafael Ugarte,
Cotapos, Rafael Alberti,
Carlos, Bebé, Manolo Altolaguirre,
Molinari,
Rosales, Concha Méndez,
e outros que se me esquecem.
Vem para que te coroe, jovem da saúde
e da borboleta, jovem puro
como um negro relâmpago perpetuamente
livre,
e conversando entre nós,
agora, quando não fica ninguém entre as
rochas,
falemos singelamente como és tu e sou eu:
para que servem os versos se não for para o
orvalho?
[...]
Federico,
tu vês o mundo, as ruas,
o vinagre,
as despedidas nas estações
quando a fumaça levanta suas rodas decisivas
para onde não há nada a não ser algumas
separações, pedras, vias férreas.
Há tantas criaturas fazendo perguntas
por todas as partes.
Há o cego sangrento, o iracundo, e o
desanimado,
e o miserável, a árvore das unhas,
o bandoleiro com a inveja às costas.
Assim é a vida, Federico, aqui tens
as coisas que te pode oferecer minha
amizade
de melancólico varão varonil.
Já sabes por ti mesmo muitas coisas,
e outras irás sabendo lentamente.
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