O consumidor brasileiro
que opta por pagar o valor mínimo da fatura e financia a dívida no cartão de
crédito paga, em média, 238,3% de juros ao ano. A taxa é a mais alta do mundo e
é quase cinco vezes maior do que a do segundo colocado, o Peru, com 55%. Além
disso, esses juros permanecem inalterados desde 2010, apesar de a taxa básica
ter caído ao menor nível histórico. Os juros ficam muito distantes do que pagam
consumidores de EUA e Reino Unido, entre 16% e 18% ao ano, informa Lucianne
Carneiro. Segundo as operadoras, um dos fatores que oneram a taxa é o serviço
de parcelamento sem juros
Cartão no topo dos
juros
Taxa média do cartão de crédito no Brasil é de 238% ao ano, a maior entre
nove países
Lucianne Carneiro
Rio e São Paulo Apesar da queda dos juros básicos da economia - que estão no
seu menor patamar histórico - os brasileiros ainda pagam a maior taxa média no
cartão de crédito. Levantamento em nove países - Argentina, Chile, Colômbia,
Peru, Venezuela, México, EUA e Reino Unido, além do Brasil - mostrou que o país
cobra 238,30% ao ano. O número é mais de quatro vezes o registrado pelo Peru, o
segundo colocado, com taxa de 55%, muito próxima aos 54,24% do Chile.
A Argentina é o quarto país com a maior taxa, de 50%, seguido por México
(33,8%), Venezuela (33%) e Colômbia (29,23%). Nos EUA e no Reino Unido, a taxa
é muito inferior, de 16,89% e 18,7%, respectivamente. O estudo incluiu dados da
Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), da Proteste e dos
sites Index Credit Cards e Money Facts, dos EUA e Reino Unido, respectivamente.
- É um absurdo a diferença de taxa de juros. Não tem justificativa, nem
mesmo a inadimplência - diz a economista da Proteste Hessia Costella.
Inadimplência e juros: círculo vicioso
Nem a redução da taxa básica de juros da economia teve impacto nos juros
médios do cartão de crédito, que se mantêm inalterados em 238,30% anuais desde
fevereiro de 2010.
- Existe um círculo vicioso. A inadimplência é alta porque os juros são
elevados. E os juros elevados acabam aumentando a inadimplência. Se os juros
fossem menores, a inadimplência cairia - diz o vice-presidente da Anefac,
Miguel Ribeiro de Oliveira.
- A taxa de 238,30% ao ano é elevadíssima, para não dizer absurda ou irreal
- afirma, por sua vez, o educador financeiro Mauro Calil.
Segundo o Banco Central (BC), a inadimplência no cartão de crédito chegava a
28,10% em julho ( atrasos com mais de 90 dias), contra média de 7,9% no crédito
para a pessoa física. O volume movimentado no rotativo em julho, diz o BC, foi
de R$ 37 bilhões. Para Hessia, quem entra no rotativo dificilmente sai porque as
taxas são muito altas.
Uma dívida no cartão de crédito, diz Oliveira, leva seis meses e meio para
dobrar de valor, a uma taxa média de 10,69% por mês (238,30% por ano). Os
números são mais expressivos quando se olha além da média. Segundo a Anefac, a
taxa varia entre 26,82% e 628,76% ao ano, ou 2% a 18% ao mês.
- O cartão de crédito é o principal meio de pagamento quando se trata de
inadimplência - afirma Mauro Calil.
Além do juro alto, o tema desperta polêmica devido a algumas características
específicas do mercado brasileiro de cartões. Aqui, todos têm a função de
crédito rotativo. Quando o consumidor opta por pagar o valor mínimo da fatura,
já faz uso desse financiamento, e inicia seu processo de refinanciamento. Lá
fora, o rotativo não é disponível em todas as opções do mercado.
Empresas: rotativo representa só 2%
O parcelamento sem juros - praticamente uma exclusividade brasileira -
também pesa sobre os custos do setor, segundo seus representantes. A Associação
Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) diz que 50% do
faturamento dos cartões no Brasil vêm do parcelamento sem juros.
Outra diferença é a data em que o juro começa a incidir sobre as compras. No
Brasil, isso só ocorre quando a pessoa atrasa o pagamento ou opta por pagar o
valor mínimo. Ou seja, quem está com a fatura em dia pode ter até 40 dias de
financiamento sem custo.
- Lá fora, não existe operação sem juros. O pagamento do juro ocorre a
partir do dia seguinte ao da compra, enquanto aqui se cobra o juro apenas a
partir do dia de vencimento da fatura. Além disso, temos o parcelado sem juros.
Tudo isso tem custo - defende o vice-presidente comercial da Mastercard Brasil
e Cone Sul, João Pedro Paro.
Segundo a Abecs, no exterior o saldo do rotativo representa 80% das compras.
No Brasil, 70% do saldo a receber não têm juros e o rotativo representa menos
de 2% do volume total.
Atendente de uma padaria da Vila Olímpia, em São Paulo, Vital Abreu Neto
diz, orgulhoso, que nunca se endividou no cartão de crédito e revela o segredo:
nunca pagar o valor mínimo.
- Se você paga o mínimo, a dívida dobra - diz ele.
Mastercard e Visa, as principais bandeiras globais, argumentam que são os
emissores dos cartões (bancos, redes varejistas e outros) que definem as taxas
de juros. Isso explica, segundo elas, o fato de que a mesma bandeira ter taxas
de juros díspares em diferentes países. A Federação Brasileira dos Bancos
(Febraban) diz que a Abecs é a entidade indicada para tratar do assunto.
FONTE: O GLOBO
Nenhum comentário:
Postar um comentário