Raquel Ulhôa
BRASÍLIA - A apresentação de denúncia contra Renan Calheiros (PMDB-AL) ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, levou o pemedebista a quebrar o silêncio adotado durante o recesso parlamentar para evitar desgaste à sua candidatura à Presidência do Senado, em 1º de fevereiro, em nota para a imprensa, também enviada aos senadores, criticando Gurgel.
A denúncia ao STF, segundo ele, "padece de suspeição e possui natureza nitidamente política", por estar sendo feita uma semana antes da eleição, embora se refira a inquérito aberto em 2007. "Trata-se de atitude totalmente incompatível com o habitual cuidado do Ministério Público no exercício de suas nobres funções", diz a nota.
O fato investigado foi o que levou Renan a renunciar ao cargo de presidente do Senado, em 2007. A suspeita era da apresentação de notas frias para justificar o patrimônio, quando foi acusado de ter despesas pessoais pagas por um lobista.
Antes da apresentação da denúncia ao STF por Gurgel, a intenção de Renan era enviar carta aos colegas nesta semana, explicando pontualmente alguns casos levantados pelo noticiário. Antecipou a nota diante de uma denúncia formal, que não poderia ficar sem resposta. Somente a partir de hoje, quando os senadores retornam a Brasília, será possível medir o impacto da decisão do procurador-geral no Senado.
Até a sexta-feira, a expectativa da Casa era que Renan, a despeito dos processos por suposta quebra de decoro que sofreu (e nos quais foi absolvido pelos senadores) e da renúncia da presidência para evitar o risco de cassação, seria eleito presidente da Casa pela terceira vez, e com votação superior à de 2007.
O cálculo de apoiadores e adversários do líder do PMDB era o mesmo: os votos contra ele não passariam de 20 a 25 dos 81 senadores, levando em conta o risco de traição intrínseco a toda eleição secreta. Essa é uma conta otimista para o grupo contrário a Renan, porque inclui a bancada do PSDB, o que não coincide com a posição da maioria dos tucanos.
A previsão é que Renan tenha votos da maior parte do PSDB e do DEM - o que não ocorreu em 2007, quando disputou com José Agripino (RN), então no PFL (hoje DEM) -, assim como do PT e da maior parte dos partidos da base, hoje mais coesa que em 2007. O pemedebista teve 51 votos e Agripino, 28 - houve um voto em branco e outro nulo.
A oposição era forte. PFL e PSDB, juntos, tinham 30 senadores. Hoje, são 14. E a maioria da oposição, silenciosa, desta vez parece estar com Renan. Na primeira eleição para presidir o Senado, em 2005, Renan era candidato único e teve 72 votos.
O grupo de senadores que defende mudança nos métodos de comando do Senado implantados por José Sarney (PMDB-AP) e defende alternativa a Renan, desmobilizado durante o recesso, tenta se rearticular a partir desta segunda-feira.
Há dois candidatos colocados pelos chamados "dissidentes" - Pedro Taques (PDT-MT) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) -, mas nenhum deles, por enquanto, une o grupo. Randolfe sofre restrições do PSDB e Taques, do PSB.
Apesar dos acordos feitos nos bastidores pelas lideranças, a formalização dos apoios dos partidos só vai acontecer ao longo desta semana. O próprio PMDB se reúne no dia 31 para oficializar a candidatura de Renan.
Com o projeto de disputar o governo de Alagoas em 2014, Renan quer usar o comando do Senado para uma espécie de reconciliação com a opinião pública. Para isso, promete apresentar um programa de gestão que, na prática, rompe com a estrutura criada por Sarney. Como os dois são aliados, senadores têm dúvidas da implantação.
Do programa a ser apresentado, constam medidas de austeridade, corte no orçamento, enxugamento da máquina e criação de uma Secretaria de Transparência, para garantir acesso total às informações da Casa, abolindo a exigência de senhas. Isso, apenas com remanejamento de pessoal e sem aumentar o quadro.
Defende mais independência e fortalecimento do Poder Legislativo e prioridade à votação de projetos de iniciativa de parlamentares. Levantamento mostra que, nas suas duas gestões anteriores, houve mais projetos de iniciativa parlamentar que se tornaram leis do que de origem do Executivo, invertendo o padrão normal.
Como presidente, que tem entre suas funções definir a pauta de votações, quer conduzir a votação dos projetos relativos ao pacto federativo. Como inovação, prepara uma agenda de propostas (incluindo algumas já tramitando) para estimular investimentos e combater os entraves ao crescimento econômico. A agenda está sendo chamada de "Brasil mais Fácil".
Uma das possibilidades é lançar as duas candidaturas - de Taques e Randolfe -, se o grupo avaliar que haveria chance de levar a disputa para o segundo turno. Para ser eleito no primeiro turno, Renan precisa de 41 votos.
Com cerca de 12 senadores, o grupo dissidente tem parlamentares do PMDB, como Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS), da oposição, como o líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), e de partidos da base governista (PDT, PSB, PP e até PMDB). Mas essa posição é, até agora, minoritária nas respectivas bancadas.
Com habilidade, Renan fez acordos com os partidos, acomodou insatisfeitos do PMDB em cargos da legenda e buscou aproximação com o Planalto. O partido enfrenta uma disputa interna pela liderança, entre Romero Jucá (RR) e Eunício Oliveira (CE). Para evitar racha no grupo, Renan tenta adiar essa decisão para depois da eleição da Mesa.
Fonte: Valor Econômico
Nenhum comentário:
Postar um comentário