Em 1988, ano da promulgação da Constituição pelo Congresso Constituinte, 61% dos brasileiros ouvidos em pesquisa de opinião pública do Ibope declararam ter preferência por um partido político. E apenas 38% se disseram apartidários, ou seja, sem simpatia por nenhuma das siglas partidárias que disputavam à época seu voto. No fim de 2012, 24 anos depois, isso se inverteu: em levantamento feito por encomenda do Estado, apenas 44% disseram preferir alguma sigla partidária, enquanto 56% não destacaram nenhuma. Nessa perda de empatia, nenhum partido se salvou: hoje há menos petistas, tucanos, peemedebistas, democratas do que em 2007.
A primeira explicação para esse declínio pode ser encontrada na frustração da cidadania quanto ao desempenho das agremiações partidárias. "Fiquei muito decepcionada. Desde 2005, só voto nulo. Não acredito em nenhum partido, apesar de existirem pessoas que respeito na política", disse a escritora e socióloga Ivana Arruda Leite.
Esta manifestação de descrença não é isolada. Quem duvidar poderá compulsar o total de eleitores que decidiram não sufragar nenhum candidato ou partido nas eleições de 2012. Com uma abstenção de 16,41% dos eleitores em todo o País e altos índices de votos nulos e brancos, considerados inválidos, eles somaram mais de 35 milhões de votos não contabilizados no cômputo final. Este total representa 25%, ou seja, um quarto dos eleitores. Somente em São Paulo, mais de 2,4 milhões de votos, entre brancos, nulos e abstenções, deixaram de ser computados no resultado final pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O desencanto da cidadania pela atividade partidária chegou ao auge no ano passado, a maior parte do qual esteve sob o impacto da transmissão do julgamento do escândalo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Durante o julgamento, foram expostas as vísceras da corrupção na política, tendo como principal alvo as relações espúrias entre partidos e o Estado. Os podres revelados no julgamento levaram à condenação figurões das bancadas da base governista: dos Partidos dos Trabalhadores (PT), Progressista (PP), da República (PR), do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e Trabalhista Brasileiro (PTB).
Este fator, contudo, não basta para explicar o esvaziamento da simpatia partidária. Afinal, os condenados mais importantes no processo foram dirigentes do PT, mas este se mantém no topo da preferência do eleitorado nacional com 24%. Obteve muito menos citações do que no último ano dos dois governos Lula (2010), quando o partido bateu o recorde de 41%, o que justifica a eleição de sua candidata, Dilma Rousseff. Mas, mesmo tendo caído quase pela metade, o prestígio mantido pelo PT, em pleno ano do mensalão, ainda representa quatro vezes o do segundo colocado, o PMDB (6%), seu principal aliado no governo, e do terceiro, o PSDB, maior partido da oposição, com 5%. O desprestígio dos tucanos é ainda mais impressionante ao se analisarem apenas os índices registrados no Sudeste, onde o partido sempre teve mais força, o que se comprova pela ocupação dos governos de dois Estados importantes, São Paulo e Minas: em 1995, 14% dos eleitores o citaram como preferido. Em outubro de 2012, este número caiu pela metade: 7%. O declínio vertiginoso revela, de um lado, um certo cansaço do eleitorado com a sucessão de gestões do PSDB e também constata a ausência de uma política clara e coerente que possa servir de alternativa à do PT e seus aliados, vencedores das três últimas eleições federais.
Deixando de lado as características de cada sigla, há uma explicação genérica para a queda geral da preferência do eleitor por cada uma delas. "Partidos não promovem mais grandes debates. Só se apresentam para a sociedade em período de eleição. Deixaram de ser referência. Não existe mais mobilização, a não ser a defesa do interesse do próprio partido", disse Marco Antônio Teixeira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Outra justificativa a ser levada em conta para entender o desencanto com os partidos foi definida pelo publicitário Daniel Palma ao criticar o "tudo pelo poder". O cerne da política é a luta pelo poder, mas o cidadão não aceita o vale-tudo hoje adotado como regra geral.
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