Calote e endividamento atrapalham plano do governo de elevar empréstimo dos bancos
Paulo Justus, Ronaldo D"Ercole
SÃO PAULO - A inadimplência dos correntistas acima de 7% e o elevado nível de endividamento das famílias devem atrapalhar os planos do governo de acelerar a concessão de crédito nos bancos privados, conforme antecipou O GLOBO ontem, para dar mais combustível à atividade e aumentar o crescimento da economia. Para analistas, o impulso desejado pelo governo nos empréstimos virá apenas com a acomodação do calote e uma expansão maior da economia, que garanta a manutenção do nível de emprego e renda.
Embora tenha recuado de 7,92%, em outubro, para 7,79% em novembro, a taxa de inadimplência - atrasos acima de 90 dias - para a pessoa física medida pelo Banco Central (BC) ainda está muito alta e longe do seu ponto mais baixo desde a crise, de 5,68%, registrados em dezembro de 2010.
- Não adianta dar crédito para pessoa física se você tem a inadimplência em alta. Os bancos ficaram mais receosos de dar crédito - diz Luiz Miguel Santacreu, analista da Austin Rating.
Economista-chefe da Serasa Experian, Luiz Rabi, concorda e ressalta que, mesmo que a inadimplência recue nos próximos meses, como sinalizam os indicadores, a demanda por crédito não deve reagir na mesma intensidade verificada em 2009 e 2010, quando o volume de financiamentos crescia a 20%.
Pelo último dado da série do BC, as operações de crédito do sistema financeiro cresceram 13,8% até novembro sobre o mesmo período de 2011. Uma expansão modesta, de pouco mais de 1% no crédito em dezembro, estima Rabi, deve fazer com que o saldo feche o ano de 2012 com alta próxima de 15%.
- Este ano, é provável que o crescimento das carteiras fique acima desse patamar, mas não vamos voltar à casa dos 20% de crescimento - afirma o economista da Serasa Experian.
Além de aguardar que a inadimplência recue a um patamar mais adequado, o setor bancário deve se pautar pela cautela, até porque vai buscar a taxa de juros adequada de financiamento para diferentes tipos de clientes, observa Ricardo Kovacs, analista sênior do grupo de instituições financeiras da agência de classificação de risco Moody"s.
Com as provisões contra o calote ainda muito altas e os juros em queda, lembra Kovacs, os bancos estão trabalhando com margens menores.
- Os bancos estão financiando uma parcela menor do valor do bem, como por exemplo os automóveis. Por isso, é de se esperar que nos próximos 12 ou 18 meses se tenha crescimento também menor das carteiras, na comparação com 2011 e 2012 - prevê o analista.
Expansão imobiliária não ajuda
Mesmo a forte expansão do crédito imobiliário - acima de 30% e que deve passar o crédito ao consumo - não será suficiente para retomar o ritmo de dois anos atrás. Nesse segmento de crédito, o endividamento das famílias, que em dezembro comprometia 44,53% da renda obtida nos últimos 12 meses, em média, pesa negativamente.
- Não adianta fomentar o financiamento imobiliário se o consumidor já está endividado, e a inflação em alta ainda ajuda a reduzir sua renda disponível. Por isso, os bancos estão olhando com muita acuidade para riscos em empréstimos a partir de R$ 1 mil, para que possam saber como está a saúde do sistema financeiro - diz Rabi.
Em seu último relatório, a agência de classificação de risco Fitch também avalia que o cenário de juros em baixa e inadimplência em alta sinaliza expansão mais moderada do crédito no país.
Essa postura mais cautelosa por parte das instituições privadas fica evidente quando se olha a evolução de seus balanços até setembro (último dado disponível), em meio à ofensiva dos bancos públicos e dos juros em queda.
Nos nove primeiros meses de 2012, enquanto as carteiras de crédito do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal ostentavam taxas de crescimento de 18,4% e 44%, respectivamente, ante igual período de 2011, no Itaú Unibanco os empréstimos cresciam 7,3%, e no Bradesco, de 9,2%. No mesmo período, tomando uma amostra de 24 instituições públicas e privadas, as receitas com crédito avançaram 7,1%, para R$ 221 bilhões, sobre os nove primeiros meses do ano anterior, enquanto as despesas com provisões cresceram 31,7%, atingindo R$ 61,7 bilhões.
Procurada, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não quis se pronunciar sobre a nova cobrança do governo para que as instituições acelerem a concessão de crédito.
Fonte: O Globo
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