Para o grande eleitorado, tanto o foguetório petista em São Paulo quanto o palavrório tucano em Brasília devem soar como ruídos distantes e de vago significado
PT e PDSB, partidos (por ora) polares no sistema de poder brasileiro, deram ontem a largada para a disputa presidencial do ano que vem. O primeiro, com a celebração dos avanços ocorridos no Brasil durante seus anos no poder. O segundo, com o discurso do presidenciável Aécio Neves no Senado. Não devemos, entretanto, superlativizar a força desses eventos. Ambos falaram, basicamente, para as elites e para aqueles que já amam ou odeiam o PT e o PSDB. Para o grande eleitorado, tanto o foguetório petista em São Paulo quanto o palavrório tucano em Brasília devem soar como ruídos distantes e de vago significado. Mas é assim mesmo que as batalhas começam, com o chamado tiro de enfiada, que precede os bombardeios.
Começando por Aécio: para quem estava imobilizado na coxia, sem discurso e sem roupa de campanha, o senador lavrou um tento e alcançou o objetivo de roubar ou dividir a luz que jorraria exclusivamente sobre a festa do PT, que, na verdade, começou anteontem, com o lançamento de novas medidas do Brasil Sem Miséria pela presidente Dilma Rousseff. Um erro de comunicação do PT pode ter permitido que o tucano entrasse em cena e roubasse parte da festa, conseguindo até falar primeiro: os petistas promoveram seu ato à noite para que a presidente comparecesse fora do expediente, evitando acusações de uso do cargo. Se não tivesse deixado circular a informação de que, no ato e na cartilha a ser distribuída, haveria uma comparação de resultados com a era tucana, o adversário talvez não tivesse se eriçado: “Ao anunciar comparações, o PT nos convidou para sua festa, e eu aceitei o chamado para dançar”, disse Aécio após o discurso, emendando que ainda não é candidato. Agora, falta-lhe assumir a presidência do partido e ganhar a estrada.
No mais, foi um discurso duro, em que alegou ter sido difícil listar apenas 13 fracassos do decênio petista. Entre eles, o baixo crescimento dos últimos dois anos, as travas na infraestrutura, o sucateamento da indústria, a inflação (recentemente) em alta, problemas éticos e crise na Petrobras. Coube a Lindbergh Farias e ao líder petista Wellington Dias rebater os ataques, lembrando o crescimento da era Lula, o emprego quase pleno — apesar da crise financeira mundial, que gera desemprego de dois dígitos em outros países —, a queda na desigualdade e a redução da pobreza. Dias tentou listar 45 transformações no período, usando, como Aécio, o número do partido adversário. O tempo regimental não permitiu. Fizeram todos seus papéis, enquanto o auditório era preparado para Lula, Dilma e Rui Falcão falarem em São Paulo.
Decênio petista. Os tambores soaram fortes, talvez mais do que o planejado, na festa petista pelo decênio de poder federal. Embora reclamando da falta de reconhecimento pelo que foi feito antes, acusando o PT de agir “como se o Brasil só tivesse começado a mudar em 2003”, até mesmo Aécio reconheceu que mudanças importantes foram alcançadas no período, “graças à herança bendita” da era tucana. Na celebração petista, um destaque para a unidade raramente exibida pelo partido, especialmente em torno da política econômica, marcada por maior ativismo do Estado.
Do evento, ficará uma cartilha que será distribuída nos 13 seminários que o partido fará em diferentes regiões (e, certamente, na campanha), na qual os resultados de 10 anos — oito de Lula e dois de Dilma — são comparados com o período tucano. Destaque para o aumento do salário mínimo (70,7%), queda na desigualdade (11,4%) e na pobreza extrema (37,3%). Mesmo no controle da inflação, segundo a cartilha, o período petista foi melhor: média de 5,8% contra 9,2% do anterior. Em linhas gerais, o discurso e a cartilha comporão o cerne da campanha de Dilma. E está claro, nesta altura, que será deixada um pouco de lado a economia, que até agora não lhe sorriu, para se concentrar nas conquistas sociais. Daqui para a frente, os bumbos do governo vão se concentrar na divulgação do Brasil Sem Miséria.
Também no Rio. A campanha eleitoral está se acelerando também no Rio. Nas inserções regionais do PT, que foram ao ar ontem à noite, a estrela foi o senador Lindbergh Farias, que deve concorrer ao governo fluminense com a bênção de Lula, por maior que seja sua amizade com o governador Sérgio Cabral. Para tentar evitar que o PT lance a candidatura própria, Cabral — que já anuncia o nome de seu vice, Pezão, para a disputa — vem tentando outros petistas com a oferta da vaga de senador. Um dos alvos diretos é a deputada Benedita. Mas, com isso, foi descortês com o senador Francisco Dornelles, do PP, cujo mandato está se encerrando e tem sido um leal aliado. Na outra ponta, o presidente regional do PMDB, Jorge Picciani, avisou que o candidato do partido será ele mesmo. Vamos ter um longuíssimo ano político de 19 meses.
Além do ponto. A democracia brasileira deve garantir a liberdade de expressão também aos estrangeiros, como a blogueira dissidente cubana Yoani Sánchez. Nem por isso, deve calar os brasileiros que têm assegurada na Constituição a liberdade de protestar contra sua presença. Tudo é do jogo. Desconcertante mesmo foi ver pessoas que na ditadura nunca se preocuparam com a liberdade fazendo festa e rapapés para a dissidente do regime cubano. Por exemplo, o deputado Jair Bolsonaro.
Fonte: Correio Braziliense
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