Quem conta um conto aumenta ou diminui os pontos como melhor lhe convém. Assim faz o PT em seu relato sobre os dez anos do partido no poder, "gloriosos" notadamente se comparados ao período "desastroso" do PSDB.
Obviamente nem tudo é glória, mas também nem tudo é desastre.
Um governo que renegociou a dívida externa de modo a recuperar a confiabilidade internacional do Brasil, que conferiu sentido concreto aos conceitos de estabilidade monetária, de responsabilidade fiscal, essenciais para a organização do País, profissionalizou a direção da Petrobrás, extinguiu feudos políticos dos mais tradicionais ao mesmo tempo em que abria as portas da telefonia à população, não pode ser considerado exatamente catastrófico.
Tampouco pode ser visto apenas sob o prisma do puro esplendor um governo que desmoralizou o conceito de ética, escarneceu das normas de conduta, ignorou as regras do jogo eleitoral, passou a mão na cabeça dos piores tipos, achou que poderia comprar impunemente apoio de partidos no Congresso, desconstruiu as agências reguladoras, pôs em risco a Petrobrás, maquiou dados públicos como naquele passado de descrédito mundial e, na véspera de completar 10 anos no poder e 33 de fundação, teve a antiga cúpula condenada à prisão.
A cartilha comemorativa é um elogio à mistificação: da capa com desenho que remete às velhas imagens do realismo socialista a distorções grosseiras conforme demonstrado em trabalho de Gustavo Patu na edição de ontem da Folha de S. Paulo.
No "mentirômetro" há versões falsas sobre vários assuntos: posição do Brasil no ranking das economias do mundo, o crescimento do PIB por habitante nos últimos anos, a desigualdade social, a redução da taxa de pobreza e a inflação.
Ninguém espera que o PT vá esconder seus bem feitos e exaltar os malfeitos, bem como não seria de se imaginar que o partido enaltecesse o adversário.
Um pouco de comedimento e maturidade, contudo, daria ao PT um ganho no campo da honestidade, onde anda precisando se recuperar. Mas à ponderação que confere credibilidade aos discursos, o partido preferiu apresentar-se infalível.
Como um herói de faz de conta.
Terreno no céu. A reforma administrativa anunciada pelo presidente do Senado falando em economia de R$ 262 milhões por ano, por enquanto, é estimativa e expectativa.
Com sérios problemas de credibilidade decorrentes das repetidas promessas não cumpridas desde 2009, quando da descoberta dos atos secretos e do escândalo conhecido como "farra das passagens".
Nesses quase quatro anos, o que se teve foi um projeto elaborado pela Fundação Getúlio Vargas ao custo de R$ 500 mil que foi literalmente para o lixo. Na época, José Sarney fez exatamente o que faz agora Renan Calheiros: procurou conter as críticas com promessas de mudanças. Andar com fé.
O presidente da Câmara disse terça-feira numa reunião que daqui em diante não vai mais pautar só assuntos que sejam produto de consenso total entre os líderes partidários.
Henrique Eduardo Alves assegurou que o critério para inclusão na pauta será a relevância dos temas, independentemente da unanimidade que acaba funcionando como obstáculo para votações que não interessem a este ou àquele partido.
Referiu-se diretamente ao fim dos 14.º e 15.º salários dos parlamentares e deu a entender que o fim do voto secreto no Congresso pode ter o mesmo destino.
Considerando o gosto de Henrique Alves pelo vaivém - como visto na questão da perda dos mandatos dos condenados no processo do mensalão -, conviria ver para crer.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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