O Ministério das Cidades vai investigar se Daniel Nolasco, ex-servidor do órgão que é sócio de empresa acusada de fraudar o Minha Casa Minha Vida, teve acesso a senhas de funcionários da pasta. Uma delas seria a da atual secretária de Habitação, Inês Magalhães
Minha Casa, sua senha
Denunciante diz que empresa acusada de fraude teve acesso a e-mails de servidores de ministério
BRASÍLIA - O Ministério das Cidades investigará se Daniel Vital Nolasco, ex-diretor da pasta e um dos sócios da RCA Assessoria, valeu-se de informações privilegiadas da área de habitação do governo federal para operar o esquema de empresas de fachada e se beneficiar de recursos do programa Minha Casa Minha Vida. Nolasco foi diretor de Produção Habitacional da Secretaria de Habitação do ministério até 2008. Depois disso, de acordo com um ex-sócio, ele usava senhas de e-mails de funcionários importantes da pasta para beneficiar o grupo que opera contratos do programa.
Num processo que corre na Justiça de São Paulo, Fernando Lopes Borges, que sustenta ter sido sócio oculto da RCA, denuncia que, mesmo depois de deixar o Ministério das Cidades, Nolasco se apresentava a terceiros como se ainda chefiasse a diretoria de Produção Habitacional. Também teria usado do antigo posto para fechar contratos com pequenas instituições financeiras e receber repasses de dinheiro público. No endereço da RCA estão registradas outras empresas. Com várias firmas abertas, os sócios se beneficiavam de repasses de dinheiro público, tocavam obras e também fiscalizavam o que eles mesmo faziam.
"Para convencer os bancos a participarem dos programas, Daniel Vital Nolasco apresentava-se como diretor de Produção Habitacional do Ministério das Cidades, e mesmo depois de ter deixado o ministério dizia-se ainda uma pessoa muito bem informada, pois tinha acesso, antes de todos no mercado, aos documentos que eram discutidos em caráter sigiloso dentro do governo", diz o denunciante no processo. "Na verdade, ele sempre se valeu mesmo foi da senha de acesso aos emeios (sic) dos executivos do ministério", diz Borges num trecho da ação.
Borges detalha quais eram os endereços eletrônicos e as senhas de pessoas importantes dentro do ministério usadas pelo grupo. Uma das senhas pertence à secretária nacional de Habitação, Inês Magalhães, de quem Nolasco seria próximo, segundo o ex-sócio.
O GLOBO enviou ao Ministério das Cidades os logins e senhas de Inês que Nolasco teria usado e estão citados no processo judicial. O ministério evitou confirmar se as senhas estão corretas. Mas informou que violações de informações do ministério serão investigadas.
"No exercício das suas funções públicas, no período de 2003 a 2008, o ex-servidor Daniel Nolasco teve acesso a inúmeras informações que devem ser resguardadas pelo principio ético do serviço público. A possível quebra dessa ética também será objeto de investigação da comissão", diz a nota do ministério.
O ministério alegou que as senhas são "de caráter pessoal e intransferível" para não confirmar os dados enviados pelo GLOBO. Documentos oficiais da Caixa Econômica Federal disponíveis na internet mostram que os e-mails citados na ação judicial são mesmo da secretária de Habitação. Outros dois e-mails citados na ação judicial e que também teriam sido violados por Nolasco são da gerente de Projetos do Departamento de Urbanização de Assentamentos Precários, Marta Garske, e da ex-assessora técnica do Departamento de Produção Habitacional Celma Casado.
Celma foi exonerada, a pedido, em fevereiro. Fernando Borges relata no processo que o irmão dela, Divaildo, fazia parte do esquema da RCA. A construtora de Divaildo, a DJC/Naza Engenharia, seria responsável pela construção de 8 mil casas do programa. As senhas citadas na ação judicial já foram alteradas.
Segundo a assessoria do ministério, a secretária nacional de Habitação, Inês Magalhães, manteve relacionamento profissional com Nolasco enquanto este estava no governo, "conforme determina o Código de Ética Profissional do Servidor Público". E informou que a comissão de sindicância instaurada pelo ministério investigará o caso, assim como a Controladoria Geral da União.
Desde domingo, O GLOBO mostrou como como funcionava o esquema de empresas de fachada controladas pelo grupo de ex-funcionários das Cidades. Até um ex-garçom da pasta é sócio da firma responsável pelo repasse de milhões de reais do Minha Casa Minha Vida, o principal programa habitacional do país. O grupo atua em cidades com menos de 50 mil habitantes, onde os negócios não precisam ser feitos pela Caixa ou pelo Banco do Brasil.
A RCA diz atuar em mil municípios e que já entregou 80 mil casas. Todos os bancos representados pela empresa - Luso Brasileiro, Bonsucesso, Paulista, Schahin, Tricury e Morada - foram responsáveis pela construção de 113 mil unidades habitacionais até hoje. O governo não sabe quantas foram intermediadas pela RCA. Ela é invisível aos olhos do ministério, que apenas se relaciona com as instituições financeiras.
RCA retirou informações de site
Assim que foi procurada pelo jornal, a RCA tirou do site da empresa a prova de que simulava concorrências. Sumiu da página o edital para contratar uma construtora responsável pela execução de obras no Espírito Santo e o resultado da suposta concorrência. A vencedora foi a empresa JB Lar, registrada no mesmo endereço da RCA: Avenida Brigadeiro Luiz Antônio, em São Paulo.
O caso envolve pessoas com fortes conexões com o PCdoB, e até a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra tem seu nome citado. Na ação, o ex-sócio afirma, sem apresentar provas, que o esquema teria começado com Erenice, quando articulou a entrada de bancos privados na operação do MCMV em pequenos municípios. Ela, segundo o denunciante, teria direito a R$ 200 por casa construída, o que renderia até R$ 12 milhões.
Numa troca de e-mails, Antônio Carvalho, irmão e sócio de Erenice, pede informações sobre o faturamento da RCA. E diz que isso foi objeto de discussão em "reunião do partido". Não diz a qual legenda se refere.
Fonte: O Globo
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