Ciro Carlos Rocha e José Accioly
Há quase seis anos na presidência do PSDB, o deputado Sérgio Guerra passa o comando do partido ao senador e presidenciável Aécio Neves (MG) e faz um balanço positivo. Fala de 2014 e critica a pressão, segundo ele sem limites, do governo Dilma e do PT para prejudicar novos projetos presidenciais, como o do governador Eduardo Campos (PSB). Para ele, isso já representa o "primeiro turno" de 2014. Guerra aposta que várias candidaturas levarão a oposição ao turno decisivo, torce pela candidatura Eduardo, mas alerta que ele descerá à "mortalidade", tendo dificuldades até por ser ainda desconhecido. "A minha impressão é que chegaremos (com Aécio) no segundo turno", analisa.
JORNAL DO COMMERCIO - Como projeta o quadro sucessório nacional de 2014?
SÉRGIO GUERRA - Primeiro, se Eduardo (Campos) vai ser candidato (a presidente da República). Por muito tempo levantou-se a questão se Aécio (Neves) é candidato ou não. É muito mais a questão se Eduardo é candidato ou não é. Eduardo sendo candidato é um mapa eleitoral-político. Eduardo não sendo é outro. Não sendo candidato o provável é que ele restabeleça a aliança com o PT. A política volta a ser mais lógica, no sentido de ser tradicional. Eduardo sendo candidato não tem mais lógica.
JC - Qual a variável nacional mais relevante desta próxima eleição?
GUERRA - A variável mais relevante é Eduardo. A eleição brasileira tem duas diferenças em relação à passada. A primeira é o fato de que, com a candidatura de Eduardo, com a de Marina - não mais com 3%, como ela começou em 2010 -, o mapa das campanhas é muito diferente. Uma coisa era Dilma enfrentar José Serra (ex-candidato, em 2010) no Brasil inteiro. Outra coisa é a Dilma enfrentar Eduardo no Nordeste, Aécio no Sudeste e, ainda por cima, Marina fortalecida e num patamar diferente. É uma eleição muito mais múltipla do que foi a outra. Segundo é que uma candidatura no Nordeste divide o Nordeste. E o Nordeste é que fez a hegemonia do PT nas últimas duas eleições. De repente, a gente ganhava as eleições em São Paulo, mas o Maranhão e o Piauí tiravam a diferença. Dessa vez não tem Dilma com 70%, 60% no Nordeste. É Dilma com muito menos. E o eleitor do Nordeste estará dividido. Por outro lado, é óbvio o crescimento do PT no Sudeste. E esse crescimento não sei se equilibra, mas é problema para as oposições. Não é problema para Aécio.
JC - Uma candidatura de Eduardo vai afetar mais quem no Nordeste? Dilma ou a oposição?
GUERRA - Se Eduardo for candidato a presidente, Dilma terá entre 25% a 30% de votos no Nordeste. É o que os ensaios dizem. Tem gente que (diz que) a conversa é outra, que ela é muito forte no interior, mas acho que 25% a 30% é um número aceitável. Se ela tiver isso, Eduardo vai ter entre 50% a 60%. E Marina e nós, 20%. Isso é o raciocínio de Pernambuco.
JC - Mas no Nordeste o PSB governa quatro dos nove Estados.
GUERRA - Você acha que na Paraíba Eduardo vai ter a mesma votação que tem em Pernambuco, com um mundo todo a favor dele? Na Paraíba, no máximo, ele pode empatar com Dilma. Nós temos um candidato com força mais forte, que é Cássio (Cunha Lima, senador). Em Alagoas, somos o governo do Estado e da prefeitura. Em Sergipe, o DEM é tudo e o PT não é nada. Na Bahia, a mesma coisa. No Ceará, Eduardo não tem o PSB. No Rio Grande do Norte, o forte é o PMDB e o saldo do DEM, com José Agripino. Então, não sei (a razão) dessa campanha (de Eduardo). Nada pode ser previsto se ele vira fenômeno, se cria uma onda. Aí não. Aí tudo pode ser superado. (Fernando) Collor ganhou (em 1989) sem apoio de ninguém, mas não eram eleições casadas. E a eleição é casada. Eleições casadas inibem esse negócio do fenômeno. De toda forma, a última eleição foi casada e Marina teve 20%.
JC - Se cria uma áurea em torno de Eduardo, apontando-o como um gestor moderno. Em recentes entrevistas, o governador opina sobre o funcionamento de agências reguladoras, que, na opinião dele, têm ser mais independentes, mas a Arpe aqui não tem um concurso público há anos e é aparelhada. O que acha disso?
GUERRA - Eduardo vai para o campo da mortalidade. Isso já começou a ser atirado. Quem vai ter esse voto higiênico, inatingível, é Marina, que é uma freira. Tem uma vida fora de tudo, pastora, para os pobres. Ela vai ter esses votos, que é um pedaço do eleitorado que é grande hoje, tamanho ou maior do que o voto religioso. E ela ainda alinha um pedaço do voto religioso. Acho que Eduardo tem muita energia, tem muita liderança, um grande candidato e não sei se ele é candidato... Ele está antecipando muito tempo quando o lógico é ele ser candidato em 2018, não em 2014. Acho que ele fez muito até agora, tem muita competência e muita coragem.
JC - A definição da candidatura de Eduardo é vai balizar o PSDB?
GUERRA - A candidatura de Eduardo é relevante no geral. O Brasil estará no segundo turno das eleições presidenciais se Eduardo for candidato a presidente. Isso é absolutamente claro. Uma eventual candidatura de Eduardo, associada à candidatura de Marina, que, dessa vez, tem 10% ou 20%, esse cenário de dois candidatos que vêm da base do governo, somados à candidatura da oposição criam uma marca necessária para levar a eleição para o segundo turno. Nos próximos meses dirão se a próxima eleição para presidente da República poderá ser resolvida no primeiro turno ou será apenas resolvida no segundo turno. A minha impressão é que nós estamos no segundo turno. Estamos hoje garantidos que vá para o segundo turno. O PSDB torce pela candidatura de Eduardo, o PSDB torce pela candidatura de Marina, o PSDB torce por candidaturas no plural. Para nós do PSDB é muito importante que no Brasil tenha múltiplas candidaturas, vários pontos de vista.
JC - Essa "onda Eduardo", de fato, existe?
GUERRA - Há sinais de que Eduardo tenha mexido com índices de intenção de voto nas últimas pesquisas. É evidente e há uma boa vontade com a candidatura de Eduardo. Ele criou uma expectativa favorável à candidatura dele em setores brasileiros muito importantes, como o empresariado. Falar de uma onda é exagero, mas de uma expectativa favorável é sensato.
JC - O senhor acredita governo vai tentar barrar outras candidaturas para reeleger Dilma?
GUERRA - O governo vai fazer e está fazendo, e não tem limites para fazer, para ganhar essa eleição por W.O., para tirar Eduardo da parada, para tirar os partidos da oposição, para criar dificuldades a Marina. Na verdade, eles estão disputando o primeiro turno agora.
JC - Há uma reclamação na base da presidente Dilma que diz que ela não soube lidar com questões políticas. Há espaço dentro da base de Dilma para uma terceira via?
GUERRA - Não, porque a base aliada da Dilma ou é real, estruturante, ideológica ou fisiológica. Mais da metade dela é fisiológica. Essa base fisiológica não vai para um candidato porque ele é bonito, ou porque ele é bom. Vai se ele tiver dinheiro, poder, emprego, capacidade de fazer as coisas. Então, quem vai ficar com o PR. Eduardo vai ficar com o PR? O PMDB já ficou com Dilma. PR e esses partidos ninguém tem ninguém, por enquanto.
JC - E as "dissidências"?
GUERRA - Essas dissidências são muito mais episódios parlamentares do que sociais, de conteúdo social, real. Isso não impede que Eduardo vire um fenômeno, mas não é isso o normal. O normal é que ele desça para o campo da mortalidade. E vão atirar nele. Já começaram a atirar nele. O candidato que vai ter o voto higiênico é Marina Silva.... Os que votam contra à política, votam por uma outra política, votam em Marina Silva.
JC - Como vê a figura política de Lula?
GUERRA - (Miguel) Arraes (ex-governador) em Pernambuco, lá trás, foi um dos poucos políticos a amparar sua liderança política ao conteúdo social. Havia uma aliança social com Arraes. Setores da baixa renda e da população mais pobre tendiam a votar nele. Atualmente, com Lula há uma liderança social ainda, na medida em que ele é capaz de generalizar programas de atendimento social e transferir renda às populações mais pobres. Ele tem uma ampla legitimação de amplos setores do país. E todo o movimento das últimas eleições provam que o eleitorado do PT e do Lula é mais poderoso nas áreas de baixa renda e menos significativos nas áreas mais críticas, nas quais têm as centralidades da cultura e opinião pública. Se você examina o mapa eleitoral para presidente da República vai ver que Serra teve resultados mais favoráveis, assim como Marina, nos eleitorados menos dependentes de programas sociais, de aparelhos sindicais, da máquina pública e mais da opinião pública. Enquanto que o eleitorado mais petista sofre a influência do fenômeno social Lula e é mais denso e amplo nos setores mais dependentes e mais pobres.
JC - O PT e Lula fomentaram esse eleitorado?
GUERRA - A transferência de renda nos governos do PT, que começou conosco e foi ampliada por eles, aliado a uma poderosa propaganda, criou um ambiente favorável ao PT e ao ex-presidente Lula nos setores sociais mais de periferia.
JC - A força eleitoral de Lula não é a mesma de antes?
GUERRA - A força eleitoral de Lula continua muito poderosa, mas as condições gerais do País estão sendo alteradas e todas as iniciativas tomadas são no sentido de ganhar tempo, e não de resolver os problemas. Os limites estão ao alcance da vista. Não dá mais para insistir no endividamento por quem já deve tanto. A população começa a ficar endividada, setores da sociedade estão vendo claramente que suas previsões não se confirmam.
JC - Diante desse cenário, como se explica o crescimento da popularidade da presidente Dilma?
GUERRA - Há vários fatores. Um movimento poderoso de propaganda. A propaganda do governo atual e do ex-presidente Lula foram muito fortes. Pacotes de bondades estão sendo distribuídos. O fato de que a oposição se restringe ao ambiente parlamentar político. Não existe uma oposição social organizada, oposição peitada e enraizada na sociedade. A oposição fica restrita a pronunciamentos e manifestações politicas que se dão no Congresso. E há uma situação óbvia: o governo atual e, o de antes, aparelhou de maneira brutal os movimentos sociais. Há todo um esforço de silenciamento dos movimentos sociais. Há muito tempo não se faz greves em fábricas e a CUT continua recebendo grandes dotações públicas. As greves que se têm notícias são de funcionários públicos, não são greves de operários ou trabalhadores. São greves deles insatisfeitos com eles mesmos.
JC - Comentou-se que José Serra poderia deixar o PSDB pode falta de espaço. Acredita que ele poderá vir deixar o partido?
GUERRA - O José Serra dos últimos 20 anos foi candidato a presidente da República duas vezes pelo PSDB. Foi ministro mais de uma vez pelo PSDB. Foi candidato a governador e governador pelo PSDB. Foi candidato a prefeito de São Paulo duas ou três vezes pelo PSDB. Foi senador pelo PSDB. Não há ninguém que tenha mais espaço no PSDB do que José Serra. Essa versão de que Serra não tem espaço no PSDB é uma falsa versão. Nesse instante, ele acaba de disputar uma eleição para prefeito e, seguramente, é alguém que pode disputar qualquer eleição. Serra é um político nacional, com aceitação nas pesquisas e que o partido valoriza bastante. Agora, nesse instante o candidato que une o partido para ser candidato a presidente da República é o ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves. Não vejo razão nenhuma para Serra deixar o PSDB e nem, na minha opinião, ele vai sair. Se ele sair, vai ser uma grande perda para nós.
JC - Houve uma retomada da atuação do ex-presidente Fernando Henrique pelo PSDB após tê-lo esquecido. O partido está unido?
GUERRA - Fizemos uma pesquisa nacional e nela verificamos que nossas bandeiras, de alguma forma, foram tomadas de nós pelos governos que sucederam os de Fernando Henrique. Até a própria Lei de Responsabilidade Fiscal, que é uma lei mais hermética, uma parcela da sociedade não atribuía ao governo Fernando Henrique, mas aos governos do PT. O próprio Real, em grande parte, ainda vivia a ilusão de que não é atribuída ao PSDB. Sem falar em dezenas de outras conquistas. Programas sociais, por exemplo, que começaram por nós e foram integralmente, ou quase, atribuídos ao PT.
JC - O PSDB não valorizou o seu legado?
GUERRA - O que se deu, na prática, é que o PSDB não valorizou o seu legado, especialmente nas duas últimas eleições para presidente. Eleições presidenciais são momentos em que a sociedade reflete sobre política e sobre os programas partidários. Nas duas últimas campanhas nós não valorizamos o legado de um governo que nós construímos. Essa constatação só se deu agora e até pela presidente Dilma. Ela própria nos primeiros momentos de seu governo reconheceu com toda a clareza o legado do presidente Fernando Henrique e depois recuou. O reconhecimento do nosso legado é parte da recuperação do nosso partido. Nós só temos futuro se nós tivermos passado. O que nos diferencia da maioria dos partidos é o nosso passado. E o que nós fizemos, e se não houver uma exposição muito clara, vai sempre correr o risco de sempre sermos confundidos por outros. O PSDB se diferenciará pelo que já fez. E o que nós fizemos não valorizamos.
Fonte: Jornal do Commercio (PE)
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