Em 2010, no segundo ano do primeiro mandato do prefeito Eduardo Paes, foi realizada a primeira licitação das linhas de ônibus da cidade do Rio e, após três anos, não há o que comemorar. As vencedoras da concorrência, organizadas em consórcios, são 40 das 47 empresas que já atuavam no Rio, e o padrão dos serviços dispensa comentários.
A tarifa básica, de R$ 2,40, foi substituída na mesma ocasião pelo bilhete único, e o prefeito declarou com orgulho que não haveria subsídios para as empresas. Quanto às gratuidades, a presunção foi sempre a do cumprimento da Lei Orgânica do Município, que garante o benefício para idosos, alunos da rede pública, portadores de deficiência, seus acompanhantes e crianças até cinco anos.
Mas os fatos contrariam as declarações oficiais e, diga-se de passagem - sem trocadilho - cláusulas do próprio edital da licitação deveriam ser suficientes para afastar quaisquer dúvidas em torno da fórmula que compõe o preço da passagem na cidade. A inexistência de contrapartida para as gratuidades dos estudantes, por exemplo, consta do edital. Mas mesmo assim a Prefeitura passou a agregar R$ 100 milhões por ano ao já bilionário faturamento das empresas de ônibus. Se R$ 100 milhões é muito ou pouco, não importa tanto quanto a transparência dos números e dos contratos. Afinal, todos querem saber como pagam e pelo que pagam.
Com o tempo essa conta foi sendo desvendada e, hoje, alguns poucos sabem que ela representa a soma de um inusitado contrato entre a Secretaria de Educação e o Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Município com o valor da renúncia fiscal decorrente da redução do imposto sobre serviços (ISS) das empresas, de 2% para 0,01%, a partir de 2010.
O contrato com o Sindicato dos Ônibus prevê o fornecimento de transporte para os alunos e um inacreditável controle de assiduidade nas escolas, ou seja, o Sindicato passou receber pelo que era gratuito e a fazer uma espécie de chamada eletrônica das crianças por delegação da Secretaria de Educação. Sinais de modernidade ou inversão de funções e valores? Claro que acertou quem optou pela segunda hipótese. Este serviço custa hoje aos contribuintes R$ 55 milhões por ano, e é financiado, em parte, por recursos do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).
Quanto à renúncia do ISS, demonstrativo da própria Prefeitura revela que as empresas de ônibus deixarão de pagar R$ 56,4 milhões em 2014, R$ 59,6 milhões em 2015 e R$ 62,7 milhões em 2016. Estes números, somados aos dos três exercícios anteriores e ao surpreendente contrato da Secretaria de Educação com o Sindicato das Empresas de Ônibus, representam uma transferência de meio bilhão de reais em favor das empresas de ônibus até 2016 - o equivalente a meio Maracanã, pelos rígidos padrões da Fifa.
Portanto, quando se discute o preço dos ônibus no Rio, é preciso que fique muito claro que há subsídios, sim, como, aliás, é abertamente declarado em São Paulo. Mas sabe-se lá por que o prefeito do Rio insiste em disfarçá-los, omitindo a renúncia do ISS e negando o fato de as gratuidades já serem computadas no cálculo da tarifa. Fez bem o prefeito, juntamente com o governador Cabral, ao recuar e revogar o último aumento, mas, como as regras e os números não são nada transparentes, o carioca pode perfeitamente concluir que ainda está pagando mais do que deveria e que há folga suficiente para outras reduções, sem recorrer a sofismas ou demagogia.
*Paulo Pinheiro é vereador (PSOL) no Rio de Janeiro
Fonte: O Globo
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