sábado, 29 de junho de 2013

Em outro planeta

O Brasil está indo à lona, mas a presidente da República só quer tratar de um assunto: impor ao país um plebiscito sobre reforma política. Chega a ser quase um escárnio ao desejo expresso pelos milhões de brasileiros nas manifestações das três últimas semanas. Plebiscito, nesta altura do campeonato, é coisa de lunáticos ou, mais provavelmente, de gente muito mal intencionada e que não está nem aí para os reais problemas do país. É farsa ou golpe.

O Brasil está indo à lona, mas a presidente da República só quer tratar de um assunto: impor um plebiscito que cuidará, entre outras coisas, de definir se o país terá voto distrital misto ou puro, em lista fechada ou não. Que planeta Dilma Rousseff pensa que está governando?

Chega a ser surreal que, após a bela manifestação de cidadania demonstrada por milhões de brasileiros nas três últimas semanas, a resposta que o mundo oficial tenha a oferecer seja uma discussão extemporânea e alienada dos reais problemas da nação. Soa quase como escárnio ao desejo expresso pelos cidadãos.
Fica claro que o governo e o PT insistem no plebiscito – que pode chegar a custar R$ 2 bilhões, segundo O Globo – porque querem ludibriar a opinião pública e tentar manobrar as massas. É puro diversionismo para desviar o foco dos reais problemas do país, como destacou ontem a oposição em nota oficial assinada por PSDB, PPS e DEM.

Pior ainda, o plebiscito é uma mal disfarçada tentativa dos petistas de impor mudanças que fortaleçam o partido que detém o poder e cerceiem ainda mais as chances das correntes oposicionistas. Pretendem fazer isso na lei ou na marra, como mostram movimentos recentes de seus líderes.

Anteontem, Dilma disse a sindicalistas que, com seus "pactos” vazios, quer "disputar a voz das ruas”. No mesmo dia, Lula avisou que convocará os movimentos sociais aparelhados nos últimos anos pelo petismo a sair do sofá – ontem mesmo, UNE, UJS e assemelhados começaram a cumprir a ordem, sem muito efeito, porém.

O PT também já ameaça com casuísmos como a redução de prazos para que as mudanças eleitorais tenham validade, hoje de no mínimo um ano. Para tanto, propõe uma emenda constitucional, já que para o partido dos mensaleiros a lei maior do país é apenas um mero detalhe.

De prático, após uma frenética rodada de conversas – em poucos dias nesta semana Dilma teve ter falado com mais gente do que em anos de governo – a presidente disse ontem que encaminhará uma proposta ao Congresso na terça-feira com pontos que pretende ver contemplados no plebiscito. Muito mais adequada, a alternativa do referendo foi rechaçada por ela.

A pauta oficial coincide, surpresa!, com o que prega o PT. Os famigerados financiamento público (o seu, o meu, o nosso dinheiro paga as campanhas dos políticos) e voto em lista fechada (o eleitor vota, mas é o partido que escolhe quem vai ou não se eleger), por exemplo, provavelmente estarão lá. O fim da reeleição certamente não estará.

O mais deplorável disso tudo é ver a agenda real do país paralisada por uma discussão que pode até ser importante, mas é absolutamente secundária neste momento. Imagine a dona de casa lá do rincão, em pânico com a inflação e com a escola ruim do filho, tendo que escolher entre um "sim” e um "não” a esquisitices como voto proporcional, voto distrital, voto distrital misto e entre voto em lista aberta ou lista fechada...

O país está indo ladeira abaixo, mas disso não se ouve patavina da presidente da República. Ontem mesmo, o Banco Central divulgou seus prognósticos para os próximos meses: a inflação de 2013 vai ser maior que a do ano passado e o crescimento, menor que o até agora previsto. Há quem já aposte numa taxa próxima de zero, com possibilidade até de retração do PIB no fim do ano, como mostra Claudia Safatle na edição de hoje do Valor Econômico.

A agenda real do país não inclui apenas a carestia que corrói os salários. Contempla também a melhoria da péssima saúde pública brasileira, para a qual a resposta de Dilma é a importação de médicos. Note-se que, para mostrar que dão conta da complexidade local, os estrangeiros passarão por uma avaliação de três meses – alguém aí falou nos quase dez anos que um médico brasileiro estuda antes de começar a clinicar?

A lista de problemas reais e dificuldades enfrentadas cotidianamente pelos cidadãos é extensa o suficiente para demonstrar que o governo petista está completamente fora de órbita quando impõe ao país, nesta altura do campeonato, um plebiscito sobre reforma política. Isso é coisa de lunáticos ou, mais provavelmente, de gente muito mal intencionada e que não está nem aí para os brasileiros. Ou é farsa ou é golpe.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela

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