Elevar a aposta num momento incerto seria suicida,
por isso fala da presidente é recheada de respostas banais
Dilma tenta preencher a vacuidade de poder potencializada pela natureza diáfana da origem dos protestos. Se isso será efetivo, só a temperatura da próxima manifestação responderá
Em seu pronunciamento sobre os protestos cada vez mais violentos no país, a presidente Dilma Rousseff tentou contemporizar.
O cálculo político é evidente. Ainda sem informação objetiva sobre a natureza da organização dos protestos, apesar de boataria de todo tipo circulando entre círculos à esquerda e à direita, Dilma buscou uma fala inócua que conta com o arrefecimento de ânimos para emplacar.
Talvez estivesse na memória de seus estrategistas o risco de algo mais desafiador, como o desastroso chamado para que a nação se vestisse de verde e amarelo feito por um acuado Fernando Collor em agosto 1992, respondido por uma onda de manifestantes vestidos de preto.
Elevar a aposta num momento incerto seria suicida. Assim, sobram respostas algo banais para todo mundo.
Às camadas da sociedade assustadas com o grau de violência nas ruas, foram várias assertivas sobre coerção de arruaceiros. Como? Bem, segurança é uma questão dos Estados, exceto que ela tenha esquecido de mencionar as excepcionalidades em que o Exército pode ser acionado.
Aos manifestantes, a mão estendida, somada à velha mania petista do "vamos formar um grupo de trabalho" --no caso com chefes de outros Poderes, governadores e prefeitos, ou seja, várias vitrines para democratizar eventuais pedradas.
Mas fica a pergunta que permeia toda análise do fenômeno que engolfou o país nas duas últimas semanas: oferta de conversa para quem mesmo?
Dilma citou manifestantes genericamente, mas também sindicatos e movimentos sociais, que notoriamente estão fora do jogo.
As promessas pontuais, de discutir o transporte urbano, defender a aplicação dos royalties petrolíferos na educação e importar médicos, essas são apenas isso: música velha para novos ouvintes.
Lembram as ideias de reforma política quando há uma crise institucional ou de consertar a barafunda tributária brasileira no evento de alguma disputa federativa.
A reforma política, aliás, voltou a ser citada no discurso de ontem no contexto de "oxigenar o sistema".
Por fim, Dilma enfim apareceu para discorrer sobre a mais grave crise social da história recente, o que é de se esperar de uma presidente.
Tenta assim preencher a vacuidade de poder potencializada pela natureza diáfana da origem dos protestos. Se isso será efetivo ou só enxugará o iceberg no caminho, a temperatura da próxima manifestação responderá.
Fonte: Folha de S. Paulo
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