Juntos desde 1979, a próxima eleição deverá ser o "divisor de águas" na relação político-pessoal do socialista e petista
Bruna Serra
Eufórico com o anúncio da filiação de Marina Silva ao PSB, o governador Eduardo Campos entrou no escritório da Link Propaganda, em Brasília, na noite do sábado (5), sem saber como a notícia seria recebida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Falou aos presentes - que já começavam a redesenhar o programa do PSB que foi ao ar na quinta-feira (10), já com imagens do evento - do seu respeito pelo ex-presidente. Destacou a todos os publicitários envolvidos na pré-campanha socialista que jamais, durante a eleição, entrará em confronto com Lula. Mesmo que seja provocado.
Lula e Eduardo se conheceram em 1979, no comício que marcou o retorno do ex-governador Miguel Arraes do exílio na Argélia. Eduardo tinha 14 anos. Poucas relações de carinho tiveram tantas demonstrações públicas. Mesmo assim, os dois estão diante de uma crise na relação. O líder petista e o presidenciável do PSB devem protagonizar uma guerra de forças na eleição de 2014. Lula, em defesa da reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT), e Eduardo, com o discurso de renovação, das "novas" práticas políticas, da nova República.
Desde o anúncio da chegada de Marina - que tem clara postura de oposição ao governo petista -, Campos subiu o tom. Classificou as alianças do governo como "mofadas", tratou o presidencialismo de coalizão como uma forma de "fatiar o Estado" e deu mais um passo no distanciamento do líder que um dia já lhe chamou de "achado de Deus", em cerimônia no Estado.
A boa relação entre Lula e o afilhado político - como era chamado o governador durante o primeiro governo do petista, quando firmou-se como um dos principais conselheiros do ex-presidente - começou no Ministério da Ciência e Tecnologia, que Eduardo assumiu na primeira gestão Lula (2003-2006).
Em meio a maior crise política do governo, o mensalão, Eduardo Campos licenciou-se do ministério para retornar à Câmara Federal, num gesto de desprendimento, disposto a fazer a defesa pública do então presidente, que desabava nas pesquisas. Em 2005, Eduardo chegou a pensar em desistir de disputar o governo de Pernambuco por um pedido do ex-presidente. Terminou eleito no segundo turno com apoio de Lula, que forçou o PT a passar pelo constrangimento de dividir o palanque estadual no primeiro turno. Em 2006, Humberto Costa (PT) era um dos candidatos mais bem posicionados na corrida sucessória.
Em 2010, Eduardo foi o responsável pela articulação que culminou com a retirada do nome do ex-ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, que pretendia disputar a Presidência pelo PSB. Outra vez, a pedido de Lula. Mas a relação de desgaste com a administração Dilma terminou por dar início a um afastamento. O ápice foi a decisão do governador em lançar Geraldo Julio a candidato a prefeito do Recife, ano passado, contra o palanque de um PT dividido na capital. Especulações davam conta de que Lula teria ficado chateado e a relação entrou em "banho-maria".
Ainda assim, o ex-presidente não esteve no Recife para reforçar o palanque do PT, evitando enfrentamento direto com Eduardo. De lado a lado, as concessões e pressões foram muitas, mas nunca suficientes para uma separação.
Um dos maiores entusiastas da candidatura presidencial de Eduardo Campos, o deputado federal Márcio França (PSB-SP), minimizou os tensionamentos entre os aliados e afirmou não acreditar que o ex-presidente esteja chateado ou disposto a fazer uma campanha dura contra Eduardo.
"Lula é um craque. Ele não vai deixar essa campanha abalar a relação deles. Eduardo não quer isso. Nossa candidatura é legítima e, ao final, quando Eduardo estiver eleito, Lula vai estar mais protegido com ele do que com a Dilma", pontuou o parlamentar.
França disse ainda que ambos são suficientemente maduros para entender que a política se faz com debates. "No final de tudo isso, vocês da imprensa vão achar que foi o Lula que bolou tudo", disse, gargalhando, o deputado. Procurado pelo JC, o vice-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, esquivou-se de comentar o distanciamento entre Lula e Campos. "Eles têm uma relação muito pessoal, não me sinto à vontade para opinar sobre", despistou.
Para o professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Joviniano Neto, a aliança entre PT e PSB chegou a um esgotamento esperado, uma vez que, o Partido dos Trabalhadores prefere trabalhar com a manutenção da sua hegemonia no arco de forças que sustentou suas administrações até aqui. "A aliança do Eduardo com o Lula foi boa enquanto durou. É importante destacar, neste caso, que aliança não é identidade e não implica em subordinação. Mas mesmo diante dessa postulação de Eduardo, acho que a relação dele com o Lula tentará ser preservada por ambos. Eduardo pensando na sua eleição e governabilidade. Lula querendo manter o diálogo em caso de segundo turno e até na reeleição da presidente Dilma Rousseff tentar trazer o PSB de volta à base", pondera.
Fonte: Jornal do Commercio (PE)
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