Governador de Pernambuco tenta se firmar como a terceira via na disputa presidencial sem perder as pontes com o lulismo
Vera Rosa
BRASÍLIA - Um caixote de madeira era a sua tribuna. Com um megafone nas mãos e olhos azuis arregalados, Eduardo pedia votos para "Doutor Arraes" em comício relâmpago na Praça do Diário, centro do Recife. Aluno do primeiro ano da Faculdade de Economia e fã de Alceu Valença, o jovem discorria sobre educação, saúde, segurança, mas nada empolgava mais a plateia do que suas imitações de políticos, entremeadas pelo bordão "PMDB neles!".
Trinta e um anos depois daquela primavera de 1982, quando Miguel Arraes foi eleito deputado federal pelo PMDB com a maior votação do Nordeste, o jovem do megafone, hoje governador de Pernambuco e presidente do PSB, começou a construir pontes para disputar o Palácio do Planalto.
Nessa empreitada, Eduardo Henrique Accioly Campos rompeu com o PT e aliou-se à ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva. Nem mesmo sob a promessa de apoio a um voo solo do PSB, em 2018, Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu convencer Campos, ministro de Ciência e Tecnologia de seu governo (2004 a 2005), a concorrer ao Senado e desistir do plano de enfrentar a presidente Dilma Rousseff.
"O gato que mira vários ratos não pega nenhum", diz Eduardo Campos, desafiante de Dilma. "Eu não estou procurando briga com ninguém, mas tenho natureza. Nessa história não existe só um sabido."
No mesmo ano em que Arraes conquistou uma cadeira na Câmara dos Deputados, após retornar do exílio na Argélia, seu adversário Roberto Magalhães, então no PDS, foi eleito governador de Pernambuco. Magalhães sempre pedia a correligionários que ficassem de olho no "menino de Arraes", um garoto que, na avaliação dele, iria muito longe.
"Existem três coisas perigosas na vida: parágrafo de lei, entrelinha de texto e fato novo na política", previa o então governador.
Neto e herdeiro de Miguel Arraes, um ícone da esquerda, Campos agora luta para ser esse fato novo, mas é desconhecido fora de Pernambuco – Estado que governa desde 2007. Na tentativa de ampliar as alianças, ele capricha no sorriso e veste o figurino da terceira via com a esperança de quebrar, em 2014, a polarização entre o PT de Lula e Dilma e o PSDB do senador mineiro Aécio Neves.
Somente neste ano Campos participou de mais de 50 encontros com empresários para apresentar suas ideias. Em São Paulo, ouviu queixas da nata do PIB sobre Dilma. Ancorado pelo slogan "é possível fazer mais e bem feito", seu discurso prega a melhoria da gestão pública, tema "vendido" na propaganda do PSB como marca de governo.
A portas fechadas, Campos diz que Dilma é de um "voluntarismo arretado", age de forma "pendular" e emite sinais contraditórios na economia. "Na área social, nós não podemos deixar as filhas do programa Bolsa Família serem mães do Bolsa Família", insiste. Nos últimos tempos, o governador tem aproveitado essas conversas para neutralizar o temor do agronegócio à provável chapa liderada por ele, tendo a ex-petista Marina como vice.
"É como se a gente estivesse numa guerra e o nosso batalhão começasse a se separar", compara Lula. "Mas Eduardo arrumou uma encrenca porque a Marina tem muito mais votos e vai ficar sempre no cangote dele."
As últimas pesquisas mostram que, se as eleições fossem hoje, Campos alcançaria 11% dos votos e ficaria atrás do tucano Aécio Neves. No cenário atual, Dilma só não venceria no primeiro turno se Marina fosse candidata.
Dote. Divergências entre os dois ministros de Lula também já começaram a aparecer. Em São Paulo, por exemplo, integrantes da Rede Sustentabilidade – o partido de Marina que foi barrado pelo Tribunal Superior Eleitoral – querem candidatura própria ao Palácio dos Bandeirantes, mas o PSB negocia apoio à reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB).
"Nós temos de conviver com isso. Levamos o dote da Marina, mas a família dela veio junto", brinca o deputado Márcio França (PSB-SP). "Não tem crise nenhuma. Por acaso o PMDB segue o PT nos palanques de todos os Estados?", ameniza o secretário-geral do PSB, Carlos Siqueira.
Depois de percorrer as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, Campos passará agora a se concentrar no Nordeste. Nessa nova etapa, ele promete reeditar a "tribuna" de debates ao ar livre, tática usada na época em que era do PMDB e também na campanha de 2006, quando já presidia o PSB e ganhou pela primeira vez a eleição para o governo pernambucano.
A estratégia do Planalto e da cúpula do PT para desconstruir a dupla Campos-Marina prevê o reforço da ofensiva no território "inimigo", com Lula no palanque. A ideia é mostrar como o governo federal contribuiu para turbinar os indicadores de Pernambuco, hoje a 10.ª economia do País.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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