A brusca proibição das doações eleitorais de empresas não extirparia o mal. Acabaria adubando sua raiz mais venenosa, o caixa dois
Com sua peculiar cautela, o ministro Teori Zavascki impediu, ao pedir vistas do processo, que o Supremo aplicasse um cavalo-de-pau ao sistema político eleitoral. Faltavam apenas dois votos. Pois tão brusca quanto a manobra radical automobilística, que costuma causar acidentes, seria a proibição das doações de empresas às campanhas eleitorais já em 2014. Este sistema tem todos os vícios apontados pela OAB, que patrocina a ação, e pelos quatro ministros que votaram por sua abolição. Mas, para um saneamento eficaz, ele precisa ser substituído por um outro modelo, coerente com o sistema partidário e a cultura política do país.
Terá também o Congresso mais tempo para reagir a esta invasão de sua competência que, mais uma vez, ocorre porque ele mesmo deixou o flanco aberto para o Judiciário legislar em seu lugar, como já fez tantas vezes, nem sempre com bons resultados. A pior resposta seria esta já anunciada pelo líder peemedebista Eduardo Cunha: a aprovação de uma emenda, inscrevendo na própria Constituição a legalidade de tais doações. Aí, sim, o monstro ficaria intocável.
A mera proibição não extirpará o mal. Acabará adubando sua raiz mais venenosa, o caixa dois. Proibidas as doações de empresas já no ano que vem, por decisão do STF, quem acredita que os grandes partidos, e especialmente os candidatos a presidente, fariam campanha só com doações de pessoas físicas? Hoje elas podem doar até 10% da renda bruta, mas quantos fazem isso? Não temos, ainda, tal cultura no Brasil. Ela pode mudar, mas não repentinamente. A lei, em alguns casos, é que molda a cultura. Com a proibição brusca, ocorreria o que você, leitor, já deduziu: as empresas continuariam doando, mas tudo pelo caixa dois. Hoje, elas fazem um mix. Uma parte declarada, outra não. O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), na campanha passada, abriu uma lista de doações para pessoas físicas pela internet. Divulgou massivamente a conta, mas o resultado, diz ele, foi decepcionante.
Depois de condenar como corruptos petistas e aliados no julgamento do mensalão, deduzindo que os recursos do valerioduto serviram à compra de votos e não para saldar dívidas eleitorais, como sustentam eles, o STF e seu presidente Joaquim Barbosa dariam, com a decisão, mais uma tacada moralizadora. Correriam porém o risco de tornar o sistema ainda pior. Pode haver melhor saída, se todos se empenharem, e o debate prosperar. O grupo interpartidário criado pelo presidente da Câmara, Henrique Alves, para formular uma proposta de reforma política, apresentou, há poucos dias, a minuta de emenda negociada pelo coordenador Cândido Vacarezza (PT-SP). Já falamos dela aqui. No que toca ao financiamento de campanhas, a proposta seria um avanço, sem chegar ao cavalo-de-pau. Pestana, um de seus formuladores da proposta pactuada, explica: primeiro, o candidato (a qualquer cargo) teria que optar entre receber o financiamento público ou a autorização para captar doações privadas.
Assim é nos EUA. Obama, por exemplo, abdicou da verba pública e recolheu milhões de pequenos doadores. Pela proposta, empresas doariam apenas aos partidos, que fariam a divisão interna dos recursos. Só pessoas físicas doariam diretamente aos candidatos. Isso reduziria, em muito, a desigualdade de oportunidades apontada pelo ministro Luís Roberto Barroso. Ela favorece os ricos ou amigos dos empresários ricos. Candidatos sem recursos se valeriam do fundo público. E com isso já haveria uma saudável renovação da elite política. Henrique promete colocar a emenda em votação até abril, mas para vigorar em 2018. Para já, dificilmente haverá acordo sobre mudanças.
Entre eles
Quase tudo já foi contado, neste Correio, sobre o jantar de Aécio Neves com jornalistas na quarta-feira, em que o destaque foi seu apetite para a disputa com Dilma. Acrescente-se, a tantos indicadores de que a aliança com Eduardo Campos vai de vento em popa, a fórmula para o acordo em São Paulo. O PSB não daria o vice de Geraldo Alckmin, mas a candidata ao senado: a deputada Luiza Erundina.
Energia na campanha
Com a viagem para os funerais de Mandela, Dilma cancelou a viagem a Rondônia para inaugurar a distribuição da energia gerada pelas usinas de Jirau e Santo Antônio. A maior linha contínua do mundo, operada pela Eletronorte, vai de Porto Velho (RO) a Araraquara (SP), onde a energia é distribuída a todo o Brasil. A questão energética será um tema quente na campanha. Ela dirá que expandiu a geração e garantiu aos brasileiros a quarta tarifa mais barata do mundo. Aécio Neves vem dizendo que, com seu “populismo energético”, ela sacrificou as estatais do setor, e por isso teria havido tantos apagões localizados. Na volta, Dilma mandou reagendar a viagem a Rondônia. Vai tocar bumbo por lá.
Feliz 2014
O ano está se acabando e eu também já vou indo. Saio de férias agradecendo aos leitores o prestígio da leitura, desejando a todos um Feliz Natal e um venturoso 2014. Será um ano movimentado, talvez até fugaz. Teremos a Copa no Brasil e grandes escolhas na política. Como cidadãos, vivamos intensamente o momento de escolher representantes e governantes, sem perder a leveza e a devoção democrática.
Fonte: Correio Braziliense
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