• A política hereditária é mais arraigada na Região Nordeste, mas não só lá
- O Estado de S. Paulo
Domínio de clãs, política de parentesco, oligarquia - mas pode chamar de Congresso Nacional. A Transparência Brasil contabilizou 228 deputados federais e 52 senadores cujos parentes foram ou são, como eles, políticos profissionais. Praticamente a metade dos parlamentares (48%) tem pais ou filhos, irmãos ou primos, avós ou netos, maridos ou esposas na política. O poder herdado é uma grande herança do Brasil.
Dos três principais candidatos a presidente, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) são filhos e netos de políticos. A presidente Dilma Rousseff (PT) não tem parentesco, mas era referida por eleitores na campanha de 2010 como a "mulher de Lula". Não foi por consanguinidade, mas herdou seus votos do ex-presidente. Aécio e Eduardo desenvolveram carreiras próprias, mas se iniciaram na política com a bênção dos avôs.
Não há como negar que um empurrão inicial é uma vantagem considerável para quem está tentando se eleger para qualquer cargo. É comum, principalmente no Nordeste, ouvir algum poderoso dizer que vai "pôr o filho de vereador". No caso, conjuga-se o verbo "pôr" como "eleger". Na Paraíba, todos os senadores e 92% dos deputados federais têm parentes políticos.
Não é exceção. A eleição para a Câmara federal em Estados do Nordeste é uma questão de família. No Rio Grande do Norte, 88% dos deputados - a começar pelo presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB) - têm outros eleitos na parentela. Em Alagoas, 78% dos deputados e os três senadores - inclusive o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB) - também são parentes de políticos. No Piauí, 70%. Em Pernambuco, 64%.
Seria injusto dizer que se trata de uma tradição só nordestina. A política hereditária é mais arraigada lá, mas não só lá. Segundo a Transparência Brasil, em nenhuma região brasileira há menos de um terço de deputados parentes de outros políticos. A proporção vai de 34% no Sul a 60% no Nordeste. É de 46% no Centro-Oeste, 43% no Norte e 36% no Sudeste.
Mesmo em Estados onde essa taxa não parece tão alta, como Rio de Janeiro (30%) e Distrito Federal (25%), já houve governadores que conseguiram, ou ao menos tentaram, legar a suas garotinhas - esposas e filhas - seu patrimônio eleitoral.
Proporcionalmente, nenhuma sigla bate o DEM em familiaridade com a política - ou política familiar, tanto faz: 67% de seus deputados são aparentados de outros políticos. O PMDB está chegando lá, com 64%. Em números absolutos, os peemedebistas já são campeões: 63 parlamentares-parentes. Com 43% e 47%, respectivamente, PSDB e PSB estão na média da hereditariedade.
Os 17% de deputados herdeiros ou herdados do PT configuram a menor taxa entre os grande partidos. Mas a lanterna talvez seja apenas uma questão de tempo, a julgar por Zeca Dirceu (filho de José Dirceu), José Guimarães (irmão de José Genoino) e pela prolífica e poderosa família Tatto em São Paulo.
Aécio e Eduardo pregam a renovação da política. Comungam a proposta de estender os mandatos dos eleitos para cinco anos e juntar todas as votações - de vereador a presidente - num pleito só. Em contrapartida, oferecem o fim da reeleição. Parece que, para eles, o problema é o excesso de eleições. A reforma seria, fundamentalmente, gregoriana: do calendário.
Difícil crer que seja tão simples assim renovar a política. São justamente os neófitos os principais beneficiários da política familiar: 2 de cada 3 deputados federais com menos de 40 anos pertencem a clãs de políticos. A taxa chega a 70% entre os de primeiro mandato. Mudam os prenomes, ficam os sobrenomes.
Com uma porta de entrada tão estreita, não é estranho que o Congresso seja mal visto pela sociedade. Sem reformas, a chance de chegar ao poder continuará a depender de laços sanguíneos. Sem renovação, mais e mais conselhos ditos populares tentarão se travestir de democracia direta.
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