“Nem na ditadura confundimos Copa com política” – Dilma Rousseff
- O Globo
A modéstia, convenhamos, nunca foi o ponto forte de Lula. Mas em relação a Dilma, sua invenção para presidir o país, ele guardava um certo recato. De público, cuidava para não reforçar a impressão de que a tutelava.
Na semana passada, em Porto Alegre, Lula mandou às favas todos os escrúpulos e fez o impensável – criticou a política econômica do governo. E na frente de um dos seus responsáveis.
Pobre Arno Augustin, Secretário do Tesouro. Ouviu poucas e boas diante de um auditório inclinado a concordar com tudo o que Lula dissesse.
Por uma questão de estilo e temperamento, Lula e Dilma são famosos por tratarem com grosseria seus subordinados. Mas isso sempre ocorre em particular. E, no caso de Lula, quando ele reconhece que foi cruel, costuma pedir desculpas sem pedi-las diretamente.
Pois foi constrangedor. Depois de, na véspera, reunido com empresários, ter chamado a atenção do governo para o risco de perder o controle da inflação, Lula valeu-se do seu próprio exemplo para ensinar a Arno – e, por tabela, a Dilma – como esquentar a economia.
Defendeu a expansão do crédito, um meio de aumentar o consumo. E lamentou: “Se depender do pensamento de Arno você não faz nada”.
Voltou à carga: “Uma medida que tomamos foi aumentar a oferta de crédito. O Arno nem sempre gosta disso”, alfinetou. Arno sorriu meio sem graça.
“Eu acho, Arno, que um dia você vai ter que me explicar porque, se a gente não tem inflação de demanda, por que a gente está barrando o crédito? O crédito precisa chegar”, cobrou Lula. “Com crédito todo mundo vai à luta”. Depende.
No meio do segundo mandato de Lula, a receita soprada por Delfim Neto, ex-ministro da Fazenda da ditadura de 64, funcionou de fato.
O governo tinha dinheiro para ampliar o crédito via bancos oficiais. A taxa de juros havia baixado, tornando os empréstimos mais atraentes. Disparava a boa avaliação do governo. E a indústria tinha capacidade ociosa e podia aumentar a produção para atender o consumo.
Hoje é tudo o contrário. Agravado pelo fato de que o pessimismo do brasileiro está em alta - e a culpa não é da oposição, como sugere Dilma.
A culpa é de um governo medíocre, centralizado em excesso na figura da presidente, e que realizou pouco.
A herança maldita que deixará é a frustração dos que acreditaram na palavra de Lula de que Dilma como gestora era superior a ele. Isso se chama estelionato eleitoral.
O troco está vindo a galope.
Desmancha-se a confiança no governo e nas suas políticas. Pela primeira vez desde 2007, a maior parte dos eleitores (36%) acha que a situação econômica só tende a piorar, segundo a mais recente pesquisa de opinião do instituto Datafolha. Para 64% a inflação vai crescer – eram 58% há um mês. O desemprego, também, acreditam 48% - eram 42% há um mês.
João Santana, marqueteiro das campanhas de Lula e de Dilma em 2006 e 2010, terá pela frente três tarefas de grande porte: reverter a expectativa negativa dos brasileiros quanto à economia; tornar positiva a avaliação do governo, e convencer a maioria dos que pedem um presidente diferente do atual que a continuidade com Dilma é melhor. Ou de que a mudança pode ser feita com ela.
O ano começou com Dilma como favorita para se reeleger no Primeiro turno. Depois, as pesquisas indicaram que ela disputaria o segundo turno ainda na condição de favorita.
Agora, o favoritismo de Dilma está ameaçado. Chamem Lula... Para tentar salvá-la – e ao PT.
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