• Antônio Lavareda diz que, com capital político aguçado pela comoção da tragédia, ex-senadora é a sucessora óbvia de Campos
Alexandre Rodrigues – O Globo (15/8/2014)
RIO — Um dos mais experientes consultores eleitorais do país, o sociólogo e cientista político Antônio Lavareda foi procurado por Eduardo Campos no início de 2013 para testar a viabilidade de sua candidatura à Presidência. O Ipespe, instituto de pesquisa de Lavareda sediado no Recife, fez uma série de sondagens que deram ao ex-governador parte dos subsídios para formular seu projeto de terceira via. Em entrevista ao GLOBO, Lavareda diz que Campos tinha potencial para chegar ao dia da eleição com, no mínimo, votação igual à de Marina Silva em 2010. Para ele, a lógica indica a vice à frente da chapa, repetindo o triângulo do pleito de 2010. No entanto, alerta, os vértices, hoje, são diferentes.
No que suas pesquisas estimularam Campos a decidir se candidatar?
No início de 2013, já ficava claro que o espaço se ampliaria quanto mais complicada ficasse a situação econômica. Testamos hipóteses de estagnação em meados de 2014, embora não houvesse ainda essa expectativa. Obviamente, a deterioração econômica abre espaço para a oposição e alimenta a expectativa por algo diferente, que seria a terceira via. Era o perfil do Campos. Ele não era o anti-Lula, mirava o contraditório em Dilma Rousseff. Podia buscar votos na oposição representada pelo PSDB e no eleitorado da terceira via de 2010, de Marina. No início de 2013, ninguém poderia imaginar Marina ao lado de Campos. Nem ele. Nem o mais visionário dos sonhadores ou o mais sonhador dos visionários poderia antecipar o curso extraordinariamente trágico dessa campanha.
O caminho natural do PSB é substituir Campos por Marina?
É lógico. A despeito das diferenças entre Marina e parte do PSB — uma relação que ganha um grau de tensão potencial sem a mediação de Campos —, é óbvio que Marina é o maior patrimônio eleitoral que o acaso colocou dentro do PSB.
Qual a diferença entre a terceira via de Campos e a de Marina?
Campos tinha um projeto dentro de um partido bem estruturado. O PSB teve o melhor desempenho nas eleições municipais e já havia crescido no Congresso em 2010. O partido vinha se estruturando para construir uma terceira via mais consistente do que tentativas anteriores, como Ciro Gomes, Garotinho, Heloísa Helena. O projeto de Marina em 2010 era assentado no carisma dela e nos vínculos com segmentos específicos: jovens, mulheres, evangélicos, ambientalistas. Campos buscava uma ossatura político-partidária. Por isso, mais consistente. Até porque transmitia maior ideia de governabilidade.
Por que Campos ainda tinha desempenho fraco nas pesquisas?
O projeto dele dependia do trânsito entre formadores de opinião e empresariado, mas sobretudo da montagem de palanques fortes nos estados. Acabou não conseguindo fazer isso nos três maiores (São Paulo, Rio e Minas). Daí boa parte da explicação para ter patinado na casa de um dígito nas pesquisas. Mas era muito provável que chegasse aos 15 pontos logo na primeira fase, após o início do programa na TV. Ele era pouquíssimo conhecido. Nas pesquisas, os que o conheciam não ultrapassavam 30%.
Era vantagem ou desvantagem?
É desvantagem na pré-campanha, mas, quando se tem bom posicionamento, bom discurso, abre espaço para crescer. Era o caso de Campos. No mínimo, ele teria na eleição o mesmo patamar de Marina em 2010, entre 19% e 20%.
Mas pesquisas indicavam baixa transferência de votos de Marina.
Ainda por desconhecimento, falta de argumentação da própria Marina, o que só ocorreria com a propaganda na TV. É preciso lembrar que o crescimento vertiginoso de Marina se deu nos últimos dez dias antes da eleição de 2010.
Se Marina assumir candidatura, teremos a mesma configuração da eleição de 2010?
O formato da disputa será mais uma vez triangular, mas os três vértices são muito diferentes hoje, o que dificulta qualquer previsão. O PSDB tem Aécio Neves, político jovem, com rejeição menor do que a de José Serra em 2010. No PT, Dilma é o oposto. Em 2010, tinha sob seus pés o crescimento econômico de Lula e a imagem imaculada de mãe do PAC. Hoje, é a mais rejeitada numa situação econômica difícil. Mas tem ainda a força de Lula e o cargo, além de um tempo de TV ainda maior. Marina é maior do que em 2010, acrescida do sentimento das manifestações de 2013, do apoio de uma aliança e de uma máquina várias vezes maior do que que a que tinha em 2010 e mais que o dobro de tempo de TV. E ainda tem a carga emocional do trágico desaparecimento de Campos, que é algo difícil de mensurar. É bastante plausível que influencie em alguma medida o processo eleitoral.
Mesmo com ele pouco conhecido?
Campos se tornou conhecido agora. Nesse sentido, hoje ele é algumas vezes maior do que quando estava vivo.
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