- O Globo
Se a ideia é enfraquecer um ministro antes de ele assumir uma missão difícil, o governo Dilma acertou. Joaquim Levy foi exposto antes de ser anunciado e, assim, o partido da presidente já pegou a frigideira e ligou o fogo. O trabalho que Joaquim tem pela frente é imenso: comandar um ajuste, vencer resistências, reduzir a inflação, reativar a economia, afastar o risco do rebaixamento.
Ele está sendo rotulado como "ortodoxo", o que dentro do ideário econômico do PT o torna um estranho no ninho. O fato de ter tido uma experiência diversificada, trabalhando nos governos de Fernando Henrique, Lula, além de ter feito o saneamento financeiro do estado do Rio não ajuda em nada. Ele é visto como estrangeiro.
O governo precisa de um ajuste fiscal e isso não tem a ver com ser ortodoxo ou não. É uma questão de bom senso. O resultado das contas do governo em 2014 está R$ 100 bilhões abaixo do que deveria. A escolha de uma pessoa que no desempenho de suas funções de controle de caixa conseguiu entregar resultados que fortaleceram a estabilidade não tem, em si, o poder de melhorar o desempenho. Expectativa não faz o fato. É preciso que o deixem trabalhar. Mas, antes, ele precisa ser confirmado.
Além disso, ele terá que retomar a agenda micro-econômica, adotar medidas para que o país melhore a competitividade, abrir espaço para a iniciativa privada.
Os indicadores estão todos muito ruins. O déficit externo se aprofunda. Pelo divulgado ontem, foi de US$ 70 bilhões de rombo em conta-corrente até outubro e de US$ 4 bilhões o déficit comercial até a terceira semana de novembro. A alta do dólar, que pode ajudar os exportadores, tem sempre impacto inflacionário. A ameaça de um rebaixamento, se ele se confirmar, terá o efeito de tornar mais difícil o financiamento externo.
O déficit em conta-corrente estava alto em 2002, havia dificuldades para se vender títulos públicos, a inflação tinha voltado a dois dígitos e a dívida cresceu, mas era mais fácil resolver porque parte do problema era criado pela disparada do dólar, com as dúvidas sobre a transição política. Com a queda do dólar, muitos problemas foram resolvidos. A inflação diminuiu, a dívida, que estava em parte dolarizada, foi reduzida, a mudança da expectativa melhorou o seu perfil. O país vinha de um ajuste fiscal forte. O primeiro governo Lula recebeu de herança um país com superávit primário.
Ainda assim, a equipe de Antonio Palocci elevou o superávit, fez um ajuste em 2003, comprovou o caminho da austeridade, iniciou reformas microeconômicas. O país teve um ano fraco em crescimento, mas o PIB se acelerou nos anos seguintes. Para completar, a elevação forte dos preços das commodities ajudou a acumulação de reservas. Agora é muito mais difícil.
A deterioração fiscal é o pior indicador. Mesmo com os R$ 18 bilhões esperados pelo governo por meio do Refis, a previsão da Receita Federal é que a arrecadação tenha crescimento zero este ano. Isso mostra a dificuldade que terá a nova equipe econômica de realizar qualquer tipo de ajuste na área. Em outubro, houve queda real de 1,3% sobre o mesmo período do ano passado. Acumulado no ano, alta de apenas 0,45%.
Parte do problema é explicado pelas desonerações, que chegam a R$ 84 bilhões no ano. O que espanta é que o dinheiro foi gasto sem que o PIB tenha reagido.
Com um quadro desses, o que o governo deveria fazer é escolher uma equipe forte, anunciá-la, ter um plano de ação para implementar e virar o jogo. Mas prefere perder tempo e esperar não se sabe o quê.
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