• Não há consenso entre economistas sobre o impacto do corte de gastos no crescimento do país
Cássia Almeida - O Globo
A economia brasileira está estagnada e o déficit público, incluindo o pagamento de juros, já alcançou 5% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), o dobro do registrado quatro anos atrás. Nesta conjuntura, dá para cortar gastos públicos sem sacrificar o crescimento da economia? A resposta para essa pergunta está longe da unanimidade.
Para o professor de Economia Internacional da UFRJ, Luiz Carlos Prado, "não é um cenário confortável". Em tese, reduzir o consumo de uma das fontes de crescimento que é o governo afeta diretamente o desempenho da economia, mas ele acredita que mesmo com um ajuste, que seja brando, é possível crescer:
- Depois de um ano recessivo, as pessoas tendem a comprar mais. Por isso, creio em expansão entre 1% e 1,5%. Mesmo com ajuste, um pequeno crescimento não seria de se espantar.
Armando Castelar, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), não vê um horizonte tão claro. O ajuste demorou a ser feito, na sua opinião, o que diminuiu a margem para o governo fazer um corte sem muitos traumas. Nem o mercado de trabalho, ainda preservado, deve ficar imune ao aperto. E pode sofrer mais do que em 2003, quando a taxa de desemprego era de 12%:
- Naquela época, o desemprego estava alto, não precisou aumentar. O mercado já estava mal, não foi o ajuste que causou isso. Desta vez, o ajuste fiscal prometido (economia correspondente a 1,2% do PIB, para pagamento de juros) é maior do que o que foi feito em 2003. Agora, será preciso aumentar o desemprego para os salários caírem.
O economista-chefe do banco Santander, Maurício Molan, pensa diferente. O ajuste não trará tanto custo social, já que a taxa de desocupação está no menor patamar histórico:
- Algum ajuste tem que ocorrer. É preciso adequar o ganho do salário real à produtividade. Mas, partindo de um desemprego baixo, se minimiza o custo social. Ainda que desemprego suba um pouco, não haverá uma conjuntura crítica para as famílias.
O banco prevê taxa média de desemprego este ano de 5% e de 5,6% em 2015:
- Temos que fazer ajustes pontuais. Não estamos em crise. Há possibilidade de fazer ajuste cauteloso ao longo de tempo, sem contração acentuada do PIB. Estamos prevendo 0,3% para este ano e para 2015.
Belluzzo: "Nunca vi austeridade expansionista"
Há um quase consenso de que o anúncio de metas de economia para os próximos três anos fará aumentar a confiança na economia e, a médio prazo, o país voltaria a crescer. Castelar crê nesse efeito, mas diz que há só intenções até agora.
- Temos que ver se o ajuste realmente vai ser feito. Os sinais da Bolsa, que continua em queda , do dólar e dos juros não mostraram ainda essa retomada da confiança.
A confiança é fundamental para as empresas investirem e as famílias consumirem. Felipe Salles, economista do Itaú, vê esse efeito bem claro. Tanto que está prevendo crescimento acima de 1% em 2015, taxa baixa, mas bem superior aos 0,2% que muitos analistas estão esperando.
- A confiança volta e os investimentos, que puxaram o PIB para baixo este ano, voltam a subir.
Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Unicamp e um dos conselheiros econômicos do ex-presidente Lula, não vê uma relação tão direta assim e diz que a pergunta está errada. Ao invés de tentar saber se é possível fazer ajuste fiscal com a economia crescendo, a pergunta deveria ser:
- Sem crescimento, seria possível fazer ajuste fiscal? Muitos falam como se macroeconomia fosse um jogo de Lego, só encaixando as peças. O governo faz ajuste fiscal, os empresários ficam confiantes, investem, e o país volta a crescer. Eu nunca vi isso acontecer: a chamada austeridade expansionista. É só olhar a Europa.
Para ele, o ajuste pode ser um tiro no pé:
-Governo não é igual família, 40% da economia voltam para o governo. Ao tentar ajustar, a renda (do país) cai, a receita (tributária) cai, o déficit público não diminui, aumentando a dívida.
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