- O Globo
O ministro Joaquim Levy tem o duro trabalho de infundir confiança em investidores estrangeiros e brasileiros que olham para o Brasil e só veem problemas. Sua apresentação em Nova York seguiu esta ordem: não negar os problemas, mas mostrar os ângulos bons. Se ele contasse uma história cor-de-rosa, conseguiria o efeito contrário: reduzir ainda mais a confiança.
O déficit primário de 2014 foi apresentado como um "escorregão", depois de 10 anos de superávit e projeções de 1,2% para este ano e 2% nos anos seguintes. Um ajuste gradual. Detalhe: sair de um déficit de 0,6% para o superávit que o ministro projetou significa seguir por um caminho de 1,8 ponto percentual do PIB de redução de despesas ou aumento de receitas. Até agora, as poucas medidas de ajuste foram bombardeadas pela base parlamentar do governo, principalmente o partido da presidente. Aumento de receita em ano recessivo é difícil. Naturalmente os impostos recolhidos ao governo encolhem porque há menos atividade.
Levy admitiu que a dívida aumentou nos últimos anos, mas mostrou que isso não foi incomum em outras economias. Não estamos sozinhos, portanto, na turma da piora dos indicadores ficais. Importante: ele prometeu que o governo parou completamente com a política de transferir recursos de endividamento do Tesouro para o BNDES. Essas transferências saíram de R$ 43 bilhões, em 2008, para o total acumulado de R$ 473 bilhões no ano passado. Segundo o ministro, o governo tem "a vontade e os meios" de fazer o ajuste necessário.
O déficit em transações correntes está enorme, mas Levy os apresentou assim: o rombo menos o Investimento Estrangeiro Direto, em comparação com outros países. O déficit caiu para 0,5% do PIB, situação bem melhor do que Argentina, México, China e Rússia.
Por mais que tentasse, no entanto, mostrar os problemas como escorregões ou buscasse encontrar o lado bom da má notícia, o fato é que alguns dos temas tiveram que ser edulcorados. Ele preferiu mostrar o aumento da capacidade de produção de energia, um dado contestado, em vez de falar do problema concreto que o Brasil enfrenta este ano: o risco de as empresas não terem energia suficiente por falta de capacidade de atender à demanda, apesar de a economia nem estar crescendo.
As expectativas de inflação que o ministro mostrou são as de mercado. Isso facilita a sua vida. Ele não tem que falar dos números com os quais o Ministério da Fazenda trabalha. E, pelo mercado, consultado pelo Banco Central semanalmente no Boletim Focus, este ano a inflação vai ficar acima do teto da meta, em 7,27%, e vai descer lentamente até o fim do mandato, sem chegar ao centro de 4,5%. Se ocorrer o que o mercado prevê, estará havendo uma "convergência" para a meta, mas a presidente Dilma terá passado oito anos sem levar a inflação à 4,5%.
Depois de ter falado em recessão em 2015, em Davos, Levy preferiu olhar para o passado e admitir que 2014 pode ter sido um ano de queda no crescimento. O dado oficial do IBGE só sairá em março. Se ficar em torno de zero, como mediu o Banco Central (-0,12%), pode-se usar a palavra "estagnação" para o que nos aconteceu. Mas o problema é quando se olha para frente. O Brasil não está crescendo, a confiança na economia está baixa em todos os setores, a crise da Petrobras reduz o investimento não apenas da empresa, mas de inúmeras outras que fornecem ou são afetadas pela estatal.
Depois da apresentação, que termina afirmando que o país está se preparando para um novo ciclo de crescimento a partir de 2016, Levy foi falar com agências de classificação de risco. Aí mora um grande perigo. Se o rating do Brasil for rebaixado e ele perder o selo do bom pagador - que levou anos para conseguir - será um golpe duro. O investimento vai cair, assim como a capacidade de financiamento da economia brasileira, e o déficit em transações correntes ficará mais difícil de ser financiado por Investimento Estrangeiro Direto.
Por isso é que nas conversas no exterior o principal desafio do ministro Joaquim Levy é injetar confiança de que há um processo de correção de rumos que levará à gradual melhora dos indicadores. O problema todo é que ele terá que, antes de tudo, convencer o governo e o PT de que é este o caminho.
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