• Não é possível que um Estado que custa 40% do PIB — um dos mais caros do mundo — só consiga ajustar as contas por meio de aumento de impostos
A devolução ao Planalto, pelo presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (AL), da Medida Provisória que altera a desoneração da folha de salários das empresas, está sustentada por fortes argumentos.
Renan desconsiderou a necessidade de urgência de uma alteração no sistema de recolhimento da contribuição previdenciária que só pode entrar em vigor 90 dias após aprovada. E, com pertinência, tachou de inconstitucional a elevação de tributos por meio de MP, o objetivo concreto da mudança das alíquotas do gravame.
— Não é bom sinal para o ajuste, para a democracia e a estabilidade econômica aumentar imposto por MP (...). É preciso em qualquer ajuste primeiro ouvir o Congresso — justificou Renan, com razão.
Haverá especulações sobre a motivação de Renan Calheiros para rejeitar a MP no momento em que cresce o noticiário sobre a inclusão dele e de outro prócer peemedebista, Eduardo Cunha (RJ), presidente da Câmara, na lista dos políticos implicados no petrolão, em trânsito entre o procurador-geral Rodrigo Janot e o Supremo. Enquanto o senador anunciava sua decisão, por sinal, o site do GLOBO trazia a notícia da presença dos dois na lista.
Esta coincidência, no entanto, não abala a argumentação do senador ao devolver a MP. É mesmo necessário defender os espaços institucionais do Congresso, diante de um governo useiro e vezeiro em invadi-lo.
Lembremo-nos da adulteração do próprio regime de democracia representativa tentada no primeiro governo Dilma, com a instituição de um sistema de “conselhos populares", e por meio de um simples decreto presidencial. Ele já foi abatido na Câmara e terá o mesmo destino no Senado.
Se, antes da rejeição da MP, Dilma e seu governo já eram convocados a sair da postura anêmica diante da necessidade de fazer política para viabilizar o imprescindível ajuste fiscal, agora esse pressuposto tornou-se questão de sobrevivência.
Fato sintomático foi que, após o anúncio feito por Renan Calheiros, quase apenas senadores da oposição se pronunciaram no plenário, e sempre para apoiar e elogiar a atitude do presidente da Casa. A ocasião serviu até mesmo para Renan e Aécio Neves fazerem as pazes, com um pedido público de desculpas do primeiro, devido a um bate-boca ocorrido pouco tempo atrás.
O governo tem agora a chance de, com o devido uso de projetos de lei acompanhados de pedido de tramitação com urgência, melhorar a qualidade do ajuste fiscal. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o Planalto devem entender o revés no Senado como estímulo a darem prioridade no ajuste ao corte de gastos. Um Estado que custa 40% do PIB — um dos mais caros do mundo — não tem apenas a opção do aumento de impostos para reequilibrar as contas.
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