- Folha de S. Paulo
O bonito da política é que ela revela sem disfarces os percalços da alma humana. Teremos um belo exemplo disso nos próximos dias, quando o PT fará seu 5º Congresso em Salvador. Ao que tudo indica, setores do partido dispararão fogo amigo contra o ministro Joaquim Levy, incumbido pela presidente de proceder ao ajuste fiscal.
É difícil varrer o paradoxo para baixo do tapete. A principal legenda da base de apoio ao governo deverá fazer críticas severas à principal política adotada pelo governo. Como explicar esse PT contra PT?
Das muitas dicotomias que rasgam a psicologia, destaca-se a querela entre autores que privilegiam causas disposicionais, como genes e personalidade, para explicar comportamentos, e os que dão mais ênfase a elementos situacionais, isto é, ao contexto em que ocorreram. Obviamente, no mundo real, as duas modalidades importam, mas a tendência de nove entre dez pessoas é valorizar os fatores disposicionais, sempre que se trata de analisar condutas de terceiros e não as próprias. Se minha mulher tropeça numa bola, vou dizer que isso ocorreu porque ela é desatenta. Se o mesmo acontece comigo, a culpa é das crianças que largaram o maldito brinquedo no meio da sala. O nome desse viés é Erro Fundamental de Atribuição, ou EFA.
Para petistas não envolvidos diretamente na administração, o EFA atua a pleno vapor. Para eles, Levy personifica o quisto direitista (leia-se o mal) que se apossou do governo. Cabe à esquerda autêntica extirpá-lo. Já para quem precisa pagar contas e assegurar que as finanças públicas não ruirão, o EFA quase desaparece, permitindo que os fatores situacionais adquiram uma dimensão mais realista. Levy deixa de ser Judas para converter-se no próprio Cristo.
Como que numa comprovação laboratorial do EFA, são justamente as tendências do PT mais distantes da cozinha do Planalto as que mais esbravejam contra o ministro e o ajuste.
Nenhum comentário:
Postar um comentário