• Pode ter sido apressada a comemoração da defesa pelo fatiamento dos processos, porque, entre outros motivos, nenhum juiz desejará ser o anti-Moro
Foi uma derrota indiscutível do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara da Justiça Federal, em Curitiba, dos procuradores do MP e dos policiais federais que compõem o grupo da Operação Lava-Jato a decisão, por maioria de votos do Supremo Tribunal Federal, de transferir para um juiz em São Paulo processo sobre uma remessa supostamente ilegal de dinheiro para a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR).
A história tem um aspecto de conflito de interesses, porque a remetente dos recursos, Consist, era contratada pelo Ministério do Planejamento para administrar créditos consignados quando ocupava o cargo de ministro Paulo Bernardo, também petista, e marido de Gleisi. Mais importante que isso é o vínculo detectado pela Lava-Jato dessa operação financeira subterrânea com a “organização criminosa” onipresente no petrolão — o esquema montado para drenar dinheiro da Petrobras a fim de abastecer campanhas eleitorais no PT, PP e PMDB — e em operações semelhantes no setor elétrico.
Não surpreenderá se forem descobertas ramificações em outras atividades nas quais operam empresas estatais também com bilionários investimentos. Mas, para sete dos dez juízes que votaram na questão do fatiamento da Lava-Jato, pesou mais o fato de o dinheiro ter sido lavado em São Paulo do que transitado pelos propinodutos do operador financeiro e tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, preso em Curitiba e peça-chave no esquema .
Os argumentos dos ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Luís Barroso não foram convincentes o bastante. No final da votação, advogados de réus da Lava-Jato comemoraram no próprio STF de maneira efusiva. Abrira-se um rombo no casco da operação e — muito importante para a defesa — há chance concreta de réus livrarem-se da força-tarefa que trabalha com Sérgio Moro, e do próprio juiz.
Não se sabe é se a manobra jurídica surtirá efeito. No julgamento, o ministro Dias Toffoli, defensor do fatiamento, perguntou com ironia se existia apenas um juiz no Brasil. Moro, ficou subentendido. É certo que não, e talvez para demonstrar isso o magistrado que venha a ser escolhido para conduzir o processo de Gleisi procure seguir Moro como modelo. Bem como outros magistrados que recebam processos de Curitiba.
É certo que a opinião pública acompanhará atenta a tramitação desse processo e de outros que venham a ser retirados do Paraná. É difícil algum juiz admitir ter a imagem do anti-Moro. Com acerto, o grupo de procuradores e a PF se preparam para compartilhar métodos de trabalho e informações colhidas e analisadas pela Lava-Jato, para que os que venham a receber esses processos não partam do zero.
Foi um revés a decisão do STF, mas pode permitir que surjam no país outros polos de investigação tão ativos e competentes quanto Curitiba. Seria uma ajuda decisiva para o Estado desmantelar o amplo esquema criado para abastecer de dinheiro público projetos de poder.
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