• Autoridades dizem ser plausível hipótese de que poeta foi morto por ditadura militar
- O Globo
-SANTIAGO- O governo chileno reconheceu que Pablo Neruda pode ter sido assassinado depois do golpe de Estado que levou o general Augusto Pinochet ao poder, em 1973. Em comunicado divulgado na última quinta-feira, o ministério do Interior e da Segurança Pública do país admite que considera “claramente possível e altamente provável” a atuação de terceiros na morte do vencedor do prêmio Nobel de Literatura de 1971.
Em carta enviada ao juiz que investiga a morte do poeta, emitida pelo Programa de Direitos Humanos do ministério, é indicado ainda que, apesar de Neruda sofrer de câncer de próstata, não foram tomados os procedimentos médicos e forenses para estabelecer a causa da morte na época.
O ministério destacou que as investigações ainda estão em curso e não há uma conclusão para o caso. “Dadas as persistentes dúvidas sobre a causa da morte de Neruda, o governo chileno, por meio do seu Programa de Direitos Humanos, estabeleceu dois painéis internacionais e interdisciplinares de especialistas (o último deles, em outubro de 2015), para continuar realizando perícias que permitirão chegar a uma conclusão científica”, diz o documento.
Pablo Neruda era mais conhecido por seus poemas de amor, mas também era um político de esquerda, diplomata e amigo próximo do presidente Salvador Allende, que cometeu suicídio para não se render aos militares durante o golpe de Estado de 11 de setembro de 1973 liderado por Pinochet.
Apesar de ter sido diagnosticado com câncer pouco antes de morrer, o poeta, de 69 anos, pretendia ir para o exílio. Impressionado com a perseguição e o assassinato de seus amigos, ele planejava continuar como uma voz forte de oposição à ditadura, fora do Chile.
Um dia antes de embarcar rumo ao México, contudo, o escritor foi levado de ambulância para a clínica Santa Maria, em Santiago, onde recebeu tratamento médico para o câncer e outras doenças. Neruda, então membro do Comitê Central do Partido Comunista e personalidade mais importante da intelectualidade chilena, morreu na noite de 23 de setembro de 1973, supostamente de causas naturais. Mas as suspeitas de que a ditadura tem algo a ver com sua morte persistem.
O corpo foi exumado para uma primeira análise em 2013. Na ocasião, a investigação, a cargo de uma equipe de especialistas, não encontrou veneno nos restos mortais.
— Não achamos traços de veneno, mas isso não significa, necessariamente, que Neruda não foi assassinado. Outra equipe, com outras técnicas, pode encontrar substâncias — diz o legista espanhol Francisco Etxeberria, que participou dos trabalhos em 2013.
O motorista de Neruda, Manuel Araya, garantiu em várias ocasiões que o Nobel recebeu uma injeção aplicada por agentes da ditadura que se infiltraram na clínica e morreu seis horas e meia depois.
Carroza Espinosa, juiz atualmente encarregado do caso, solicitou novos exames para detectar substâncias não procuradas na primeira exumação.
Espinosa afirma que há muitas “coincidências”, além de provas testemunhais e documentais no caso, mas diz que somente provas científicas darão 100% de certeza de que Neruda foi assassinado.
— Ele tinha câncer, mas não estava em estado terminal. Até que, em 23 de setembro, seu estado de saúde se deteriorou a ponto de matá-lo em seis horas — relata Espinosa.
O juiz agora aguarda os resultados de um exame sobre a bactéria Staphylococcus aureus, encontrada em maio nos restos mortais de Neruda. Segundo especialistas, o microorganismo pode acelerar uma morte.
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