Tornou-se quase um lugar-comum afirmar que a educação pública brasileira está vencendo o desafio da inclusão, mas não o da qualidade do ensino. Dá-se pouca atenção, contudo, a um terceiro desafio que o país mal começa a enfrentar: a desigualdade.
Alunos pobres encontram dificuldade muito maior para aprender e escapar do círculo vicioso que leva do mau desempenho ao atraso e ao abandono da escola. Não há de fato igualdade de oportunidades, porque eles já largam em desvantagem no longo percurso que deveria culminar numa formação e num nível de renda dignos.
Crescem em bairros mais violentos e ambientes insalubres, sem local próprio para estudar e com parentes de vocabulário limitado. Despendem mais tempo no trajeto até colégios de infraestrutura precária. Têm de se contentar com professores menos preparados, pois os melhores docentes se transferem para estabelecimentos menos periféricos e problemáticos.
Não admira, assim, que o nível socioeconômico apareça como o fator que mais explica o desempenho dos alunos em avaliações como o Enem, segundo disse ao jornal "Valor Econômico" Priscila Cruz, diretora do movimento Todos pela Educação.
O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) nos anos finais do ensino fundamental (6º ao 9º ano) é bem diverso entre escolas mais e menos vulneráveis.
Naquelas com maior proporção de estudantes beneficiários do Bolsa Família, por exemplo, o Ideb fica em 3,5, numa escala de 0 a 10; nas mais afluentes, sobe para 4,1 -bem mais perto da meta de 5,5 fixada pelo Plano Nacional de Educação (PNE) para 2024.
Não é o caso de deixar de reconhecer que já se avançou muito no atendimento às crianças mais desfavorecidas. Em 2011, na quinta parte mais pobre da população, apenas 21,6% concluíam o ensino fundamental até os 16 anos; em 2014, esse contingente mais que duplicara, para 58,4%.
A desigualdade fica patente, porém, quando se volta a atenção para o quinto mais rico: os diplomados já eram 80,2% há 15 anos e chegaram a 92% em 2014. A enorme disparidade remanescente ficaria oculta se considerada apenas a média da população, em que 73% dos jovens termina o ensino fundamental aos 16 anos (ainda distante da meta PNE para 2024, de 95%).
A escola pública é a instituição que encarna o ideal republicano da igualdade de oportunidades.
Por ora, ela parece empacada no degrau inicial -garantir a presença de crianças pobres nos seus bancos. Precisa fazer muito mais: dedicar-lhes atenção especial, na sala de aula, para compensar as desvantagens que enfrentam só por nascer onde nasceram.
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