- Folha de S. Paulo
A queda do ministro José Eduardo Cardozo permite alguns interessantes exercícios lógicos. Sendo correta a informação, que apareceu em virtualmente todas as reportagens que li a respeito do assunto, de que o titular da Justiça foi removido a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, descortina-se um quadro pouco enaltecedor para Lula, Dilma e o próprio país. Analisemos essas situações, partindo das hipóteses mais republicanas para as menos.
Uma possibilidade é que o ex-mandatário julgue estar sendo vítima de perseguições. Neste caso, o remédio passa por advogados, não pelo ministro da Justiça. Também é possível que Lula esteja insatisfeito com os vazamentos seletivos de informações contidas nos inquéritos. Cardozo, na condição de chefe do chefe da Polícia Federal, não teria cobrado como deveria a punição dos servidores faltosos. É um direito de Lula reclamar dos vazamentos, mas parece um pouco demais pedir a demissão de um ministro porque ele não foi capaz de evitar a divulgação antecipada de informações que necessariamente se tornariam públicas em algum ponto do processo.
Outro cenário, talvez mais verossímil, é o de que Lula esteja bravo porque as investigações chegaram muito perto de si e de seus familiares. Se as instituições funcionarem como deveriam, a troca de ministro é inútil, já que ele não pode em tese influir no conteúdo das apurações. Delegados e promotores têm plena autonomia nessa matéria. Uma tentativa de interferir no processo, aliás, além de depor contra a autoproclamada máxima honestidade de Lula, seria até um argumento adicional em favor do impeachment de Dilma Rousseff.
A perspectiva mais sombria, porém, é a de que a substituição de fato resulte numa freada nas investigações. Neste caso, o único aspecto positivo dessa crise, que é verificar que as instituições têm funcionado a contento, terá se revelado uma miragem.
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