Em um intervalo de algumas horas, a Operação Lava-Jato fechou o cerco em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, sob condução coercitiva, foi levado para depor na Polícia Federal na sexta-feira, e o ex-líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral, em vazamento não reconhecido de sua delação premiada, jogou suspeitas sobre Lula e a presidente Dilma Rousseff. Como resultado, o pêndulo político deslocou-se de novo para o lado do impeachment, do qual havia se afastado há um tempo.
Delcídio, que teve estreito relacionamento com Lula e o Planalto teria dito, na versão preliminar da delação, que Dilma, quando presidente do Conselho da Petrobras, sabia de todas as implicações da compra da refinaria de Pasadena. A presidente teria também interferido diretamente para obter a libertação dos executivos de empreiteiras envolvidas na Lava-Jato, ao escolher Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Navarro, de fato, votou pela soltura dos executivos, mas ficou em minoria. Sobre Lula, Delcídio teria afirmado que ele tinha total conhecimento do roubo na Petrobras e que interveio pessoalmente para barrar investigações e até comprar o silêncio de testemunhas.
Já os investigadores da Lava-Jato reuniram uma lista de suspeitas que sugerem que obras no sítio de Atibaia, reformas no triplex do Guarujá e muitos favores prestados ao ex-presidente Lula por empreiteiras envolvidas no petrolão seriam pagamentos disfarçados a Lula, advindos de desvio de dinheiro na Petrobras, por contratos de obras obtidos em sua administração.
As suspeitas têm poder suficiente para derrubar a presidente e impedir Lula de concorrer à Presidência em 2018 - se forem comprovadas. Dilma pode sofrer impeachment se provado que manipulou a Justiça em benefício de empresários envolvidos na Lava-Jato. Lula, se tudo for de fato provado de forma cabal, sofreria a desconstrução radical de sua imagem e sua substituição pela de chefe do mensalão, do petrolão e de uma quadrilha que assaltou por vários anos os cofres públicos para sustentar um esquema de permanência no poder e de enriquecimento.
As ações da Polícia Federal se precipitaram, possivelmente como reação ao jogo de poder que terminou por desalojar José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça. O uso da coerção, exagerado para fins políticos, mas não imprevisível, pode ter servido ao desígnio de mostrar que não há cidadãos acima de qualquer suspeita e de evitar eventuais tentativas procrastinadoras do novo ministro.
O vazamento da delação de Delcídio e a condução de Lula à PF mudaram provisoriamente o alinhamento de forças políticas que tem mantido em estado vegetativo o governo de Dilma Rousseff. A oposição reanimou-se, parece ter sepultado o ensaio pragmático inicial de votar projetos com os quais concorda, mesmo que venham do Planalto, e agora se propõe a obstruir tudo no Congresso. O vice-presidente Michel Temer, cujo destino se cola ao de Dilma no processo do TSE, mas não no das "pedaladas fiscais", voltou ao discurso da "reunificação do país" com o qual, no fim de 2015, foi execrado no Planalto.
Ganharam ímpeto novo as forças pró-impeachment, dentro e fora do Congresso. O calendário deu às manifestações de rua importância para definir o rumo imediato das ações políticas. Lula voltou a mobilizar seu partido e o PT quer os militantes nas ruas, se não para defender o governo Dilma, pelo menos para apoiar Lula e barrar o "golpe". A operação da PF de sexta voltar a aproximar a presidente Dilma e Lula, interrompendo, não se sabe por quanto tempo, um cisma que estava a caminho. A oposição aposta nos protestos do dia 13 e na convenção do PMDB, onde um acordo para reeleger Temer pode ser feito em detrimento do governo.
É muito provável que o veredito das ruas seja de novo inconclusivo. Não só porque, com Lula irado, o PT pode reanimar seus militantes e fazer manifestações de maior densidade - o fracasso nessa intenção seria sinal forte de desprestígio do partido e de perda de apoio popular. Já os protestos da oposição precisariam ser muito maiores do que já foram para ter um peso decisivo. Mas algo pior pode acontecer e a exaltação de ânimos levar a confrontos com vítimas, o que levaria a uma escalada política imprevisível.
Quando parecia perto de esboçar uma linha de ação, ainda que tímida, para tentar enfrentar a recessão, o governo voltou a perder qualquer poder de ação. Predomina angustiante paralisia - um beco sem saída para o país.
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