Thiago Amâncio – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - "Fruto de golpe", "sem legitimidade", "não venceria nas urnas". A Folha ouviu lideranças de cinco movimentos sociais que levaram multidões a protestos contra o impeachment sobre as perspectivas de atuação durante o governo Temer, que garantem: não reconhecem o mando do presidente interino e não vão sair das ruas.
"Seremos oposição e não há diálogo", afirma Raimundo Bonfim, coordenador-geral da CMP (Central de Movimentos Populares) e membro da coordenação nacional da Frente Brasil Popular, congregação de 65 movimentos sociais que organizou grandes atos no Vale do Anhangabaú e na avenida Paulista, em São Paulo.
"Nós entramos a partir de agora em um período de instabilidade social", afirma o líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), Guilherme Boulos.
"É de se esperar em qualquer governo, ainda mais em um governo ilegitimo que corte os recursos da moradia, uma onda de ocupações. Não há outra alternativa aos milhões de trabalhadores sem teto que não ocupar", diz.
Posição similar tem o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). "Continuaremos fazendo as nossas lutas em defesa da reforma agrária, ocupando latifúndios e reivindicando crédito e políticas públicas para os assentamentos", diz João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do grupo.
"Nossa relação é estritamente de pressão e luta, de negação e contrariedade", diz Thiago Ferreira, da coordenação do Levante Popular da Juventude, que ganhou notoriedade após promover uma série de "escrachos" de políticos e entidades a favoráveis ao impeachment.
O Levante promete "continuar perseguindo e escrachando o Temer por onde ele for, denunciando seu papel como grande promotor do golpe" até derrubar o presidente interino.
"Não dá para ter um presidente representando o povo brasileiro sem intenção de voto nas pesquisas, com um programa que o povo não escolheu", diz Carina Vitral, presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes).
Ela lembra que o novo ministro da Educação, Mendonça Filho, é do DEM, partido que entrou com ação de inconstitucionalidade no STF contra as cotas e o Prouni. "Com esse tipo de governo não há diálogo", completa.
Financiamento
A promessa de protestos constantes exige recursos para isso. Os movimentos, no entanto, contam principalmente com o próprio bolso.
O Levante diz haver "participação muito grande da sociedade", com doações de dinheiro por parte da militância e de alimentos e serviços no caso de ocupações em escolas, por exemplo.
"Temos uma militância que faz política sem convênio com o Estado e sem patrocínio de empresas", diz Bonfim.
Para pagar os ônibus como os que levaram manifestantes a Brasília, por exemplo, os militantes fazem rifas, contam com doações de associações de moradores e fazem vaquinha para dividir os gastos, afirma ele.
Sem recursos para grandes mobilizações, a atuação da UNE no decorrer do processo de impeachment foi "bem mais local, nas universidades, com baíxissimo custo", diz Vitral. Na votação da Câmara, contaram com financiamento coletivo de militantes e simpatizantes. "Mas esse não é o cotidiano", afirma.
É o mesmo discurso do MST. "Sempre fizemos nossas lutas com dinheiro e infra-estrutura própria da base ou solidariedade de outros setores, nunca precisamos de dinheiro público para nossa atividades", diz Rodrigues.
"Autoavaliação"
Se ficaram "adormecidos" durante os anos de governo PT, ao qual eram mais alinhados ideologicamente? Nem todos, garante Boulos. "O MTST foi o movimento que mais fez enfrentamentos ao governo petista. Ocupamos órgãos públicos, nos opomos à Copa do Mundo. Sempre fizemos oposição rigorosa à administração petista", afirma.
Bonfim destaca que é momento para "autoavaliação". "Os movimentos populares poderiam ter pressionado por mudanças estruturais quando o presidente Lula tinha alta popularidade e a questão econômica favorável. Muitos setores ficaram embreagados, acharam que a classe trabalhadora tinha chegado ao paraíso. Também temos que fazer uma autoavaliação."
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