- Valor Econômico
• A inflação em janeiro deste ano deve ficar quase 1% abaixo da verificada em janeiro de 2016
Como sempre acontece na chegada do ano novo, as demandas sobre o analista das coisas da economia concentram-se na avaliação sobre o que nos espera nos próximos 365 dias. Inicio as reflexões sobre este tema com uma observação conceitual que faz parte de meu arcabouço analítico. Na economia de uma sociedade como a brasileira, o conceito de ano civil, seja ele ano novo ou ano velho, não existe para efeito de previsões e análises. As economias de mercado se movimentam em ciclos mais longos de tempo que variam em função do metabolismo econômico de um país ou de um grupo de países.
Neste conceito, o que deve acontecer em um ano como 2017 está ligado ao ciclo de curto prazo que domina a economia brasileira e o mundo emergente que nos cerca.
No Brasil viveremos ainda o período dominado pela ruptura da bolha de consumo criada nos dois primeiros anos do governo Dilma Rousseff. Foi uma atitude irresponsável, e fadada ao fracasso, na tentativa de alongar o período de "boom" que dominou os dois mandatos de seu antecessor e criador, Luiz Inácio Lula da Silva. Portanto, para olhar para 2017 é preciso localizá-lo no ciclo da ruptura da bolha e na recuperação que naturalmente se segue. Não só a teoria econômica disponibiliza instrumentos para tal entendimento como também o conhecimento da dinâmica de situações semelhantes que ocorreram em outros países no passado nos permite fazê-lo.
Como já tratei várias vezes nesta coluna, felizmente para o analista cuidadoso, temos um exemplo recente deste ciclo de crescimento de uma bolha de consumo e sua ruptura por causas naturais. Ocorreu na maior economia do mundo, entre 2006 e 2016, e nos revela ensinamentos preciosos para acompanhar a economia brasileira em 2017. Evidente que, para ter êxito nesta comparação, o analista deve compreender as diferenças pontuais que existem entre o que aconteceu nos Estados Unidos e o que deve ocorrer agora no Brasil. Mas este não é um exercício muito complexo para quem conhece, com certa profundidade, o funcionamento das economias de mercado.
Inicio este processo de identificação com indicadores simples de serem medidos e disponíveis para todos. O mais importante deles é que nos dois casos a origem da bolha está na expansão, bem acima do normal, do crédito bancário para consumo e investimento por um período longo. Nos Estados Unidos a causa primária foi o desenvolvimento de novas formas de crédito para compra da casa própria e o processo especulativo que se seguiu. No caso brasileiro a causa primária do "boom" de crédito foi o crescimento da renda média do brasileiro em função do aumento vigoroso dos preços de commodities da primeira década do século XXI, em um ambiente financeiro de nível de crédito bancário muito reduzido.
Outra diferença importante é que no Brasil esta fase de aumento do crédito do consumo foi bem mais longa do que a ocorrida nos Estados Unidos, principalmente em função da diferença do grau de sofisticação do sistema bancário aqui e lá. Por esta razão, a parte final da bolha de consumo no Brasil foi mais acentuada, fazendo com que o tombo no vazio tenha sido muito maior. E esta sensação de queda no vazio é importante porque quanto maior o tombo maior a sensação de que estamos caindo no precipício, fazendo com que o pânico se instale nas expectativas dos agentes econômicos.
Finalmente, outra característica que tornou a bolha brasileira mais difícil de ser enfrentada é que nos Estados Unidos, quando a bolha estourou, o governo não tentou reconstruí-la com medidas artificiais, mas tomou decisões corajosas de simplesmente administrar a queda no vazio. Aqui no Brasil, quando a bolha estourou em 2012, o governo Dilma tentou restaurá-la com medidas artificiais, o que tornou os efeitos deflacionistas que sempre ocorrem no estágio posterior ainda mais graves. Quando no começo do segundo mandato um novo ministro da Fazenda iniciou a política de ajuste a casa caiu e a bolha explodiu. Coube ao novo presidente Michel Temer, e sua equipe econômica de qualidade, administrar o caos e tentar criar as condições para a normalização da economia.
É neste momento de recuperação que entramos no chamado ano novo. Finalmente os primeiros frutos desta postura correta de gestão da economia estão sendo colhidos e a desinflação que estamos vivendo está funcionando como gatilho nas expectativas dos agentes econômicos. E quando a história de 2017 for contada, deverá ficar clara a importância quase heroica da decisão do Copom de acelerar a queda dos juros Selic em sua última reunião. Quero aproveitar este encontro mensal para externar minha posição de respeito ao Ilan Goldfajn, presidente do Banco Central, a quem critiquei com vigor nas últimas semanas.
Basta a leitura dos jornais da última sexta feira para sentir a mudança de humor, em relação ao futuro, de analistas de mercado e da imprensa. A queda de 75 pontos definida, de forma inesperada para alguns, pelo Copom funcionou como um tapa na cara de muitos e os tirou da posição quase histérica em relação à catástrofe que aguardava os brasileiros.
E para mostrar a importância do que ocorreu na reunião do Copom trago ao leitor do Valor a informação de que a inflação em janeiro deste ano deve ficar quase 1% abaixo da verificada em janeiro de 2016, fazendo com que a taxa anual do IPCA se reduza para pouco mais de 5% ao ano. Outra questão que me anima para 2017 é a forma como o ministro Meirelles está tratando o desequilíbrio provocado pela crise financeira dos Estados. Participei em 1998 de um grupo que conduziu à época a renegociação das dívidas dos estados para com a União e posso dizer que a forma como este assunto está sendo conduzido hoje é correta e deve estabilizar a situação dos estados mais endividados nos próximos anos.
Por isto posso agora, com confiança, desejar Feliz Ano Novo a todos.
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Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.
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